segunda-feira, 7 de outubro de 2013

"Relatório do painel do clima não é alarmista, é estúpido", diz climatologista do MIT

RAFAEL GARCIA
DE SÃO PAULO
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O climatologista Richard Lindzen não acredita que as emissões de combustíveis fósseis sejam a principal causa do aquecimento global. Conseguiu, porém, algo raro para alguém de sua opinião: teve seus estudos analisados pelo IPCC, o painel da ONU que avalia as evidências da mudança climática.
As menções a Lindzen no quinto relatório de avaliação do IPCC, porém, não são elogiosas. Seus estudos sobre mecanismos de feedback --que cancelam ou amplificam o efeito estufa-- foram citados e, logo em seguida, contestados. Falharam tentativas de reproduzir seu trabalho sobre "sensibilidade" do clima (medir quanto a Terra aquece se o nível de CO2 dobrar).
A teoria mais conhecida de Lindzen, o efeito íris, afirma que a mudança climática faria as nuvens aprisionarem menos radiação infravermelha, um feedback que cancelaria o aquecimento global.
Mas a análise de outros estudos fez o IPCC concluir que o efeito-íris não tem esse poder. Um trabalho de Lindzen sobre o assunto foi considerado "não confiável", por ter "amostragem limitada".
Divulgação
Climatologista do MIT, Richard Lindzen, questiona conclusão de cientistas do IPCC
Climatologista do MIT, Richard Lindzen, questiona conclusão de cientistas do IPCC
Em entrevista à Folha, Lindzen admite o erro, mas explica por que ainda contraria o IPCC. Alegando ser vítima de perseguição acadêmica, reconhece já ter recebido verba da indústria do petróleo, mas nega ter vínculo fixo com o setor. "Isso é tática diversionista", diz.
*
O sr. acredita que o último relatório do IPCC seja particularmente alarmista?
Na verdade, não. Ele é apenas estúpido. Qual o significado de um cientista esperar para ouvir o que os políticos acham que ele deve dizer?
Agora há uma demanda dos políticos para que, em cada relatório que é feito, os cientistas soem como se tivessem cada vez mais certeza. Isso foi predeterminado.
O que nós temos é uma situação na qual os modelos climáticos [ferramentas matemáticas para projetar o clima futuro] discordam das observações cada vez mais, mas o IPCC tem de concluir que eles são confiáveis, o que é simplesmente insano.
Isso tem relação com a desaceleração do aquecimento global nos últimos 15 anos. Mas o relatório afirma que essa escala de tempo não é relevante para os modelos, e que a tendência no longo prazo continua mostrando subida.
Não existe uma escala de tempo mais relevante. O que existe é que, a cada ano, a previsão se sai mal. Quando os ouvimos dizer que essa é a escala de tempo errada, estão errando o alvo, porque o fenômeno é contínuo.
Não é preocupante que as três últimas décadas tenham sido as mais quentes de todo o registro histórico?
Não. Estamos falando sobre números, certo? E eles estão tentando fazer você pensar que o planeta está esquentando. Dizem a você para não pensar em números porque números indicam que estamos falando de uma mudança pequena. Se pergunto qual tem de ser a sensibilidade do sistema para ser consistente com isso, a resposta seria, mais ou menos 1°C, para o dobro do nível de CO2.
Mas obviamente ninguém acredita que todo o aquecimento dos últimos 150 anos se deva só ao homem, então o número seria um pouco menor. Quase todo economista estudando isso chega à conclusão de que um aquecimento de 1°C ou 2°C, que significaria quadruplicar o CO2, provavelmente traria benefícios líquidos.
Se o novo relatório diz que a estimativa mínima para sensibilidade climática é menor do que costumava ser no anterior, de 2°C, ele não estaria sendo menos alarmista.
Não importa se você começa com o modelo de 1,5°C ou um modelo de 5°C, todos estão exagerando.
Por que o sr. acha que no IPCC, um painel com tantos cientistas independentes uns dos outros, todos estão errando?
Quantas pessoas estão errando? O IPCC diz a você que abriga milhares dos melhores cientistas do mundo. De onde vêm esses milhares? Só existe um punhado de pessoas estudando sensibilidade. O trabalho de tentar convencer o público de que "milhares de cientistas estão de acordo, como diabos alguém pode discordar?" é uma pista de que algo está errado.
Algumas das menções no relatório a seus estudos não são particularmente favoráveis a seu ponto de vista, sobretudo em relação a seu estudo de 2009.
O estudo de 2009 tinha um erro. É verdade. Mas há um estudo de 2011 no qual ele foi corrigido. E a resposta não se alterou. O erro não era um grande problema. O problema é que se você comete um erro que o põe contra o fluxo, eles fazem parecer que foi algo gravíssimo. Ninguém se importa em verificar se aquilo resulta em alguma diferença.
O IPCC diz que o saldo final causado por nuvens é provavelmente positivo [aquece mais o mundo, em vez de resfriar]. Isso derruba sua teoria sobre o efeito-íris?
Bem, até agora o efeito-íris já foi confirmado por quatro estudos independentes, então não estou propenso a me render e dizer que é uma idéia ruim. Há um estudo de Brian Soden e Ákos Horváth no qual eles confirmam nossa principal conclusão.
Para conseguirem publicá-lo, porém, tiveram de incluir um parágrafo dizendo o estudo parece confirmar o que eu, Ming-Da Chou e Arthur Hou [coautores] encontramos, mas é algo geralmente considerado errado. Além deles há Kevin Trenberth e John Fasullo dizendo que o que descobriram é consistente com nosso estudo, mas é claro que eles dão as referências para aquele que estava errado.
O IPCC menciona o estudo de Trenberth e colegas como não favorável aos seus resultados.
Eles tiveram um estudo que foi uma crítica, mas publicaram outro ao mesmo tempo, confirmando nosso resultado sobre o infravermelho.
Uma reclamação de cientistas como o sr. é de que as publicações científicas estão boicotando-os, mas o sr. tem publicado vários estudos...
Você está brincando? É claro que eles estão dizendo a verdade. O prática padrão com qualquer com críticas é fazer a revisão levar um ano e meio. Quando eu publiquei dois estudos no boletim da Sociedade Meteorológica Americana, ambos foram aceitos após longas revisões, mas o editor foi imediatamente demitido depois.
Isso não é apenas reflexo do consenso? Pesquisas recentes mostram que o papel humano no aquecimento global é reconhecido por algo em torno de 95% dos cientistas da área.
Sim, eu sei. E hahaha: eu estou entre os 95%, porque eles não estão fazendo a pergunta certa nessas pesquisas.
Um estudo perguntou se eles acreditavam que a atividade humana era uma causa significativa do aquecimento global, e só 5% discordaram.
Temos algum impacto, mas não significativo.
Então, nessa pesquisa o sr. estaria no lado dos 5%.
Não! A maioria das pessoas entrevistadas nessas pesquisas dizem apenas que há "alguma" [influência humana].
O sr. se aborreceu quando a Harper's publicou uma reportagem acusando-o de receber dinheiro do petróleo?
Sim, eu cobrei um cachê de palestra de US$ 5.000 uma vez, e escreveram que eu estava recebendo isso todo dia. Eu havia dito ao autor desse texto, Ross Gelbspan, que eu havia comparecido a um encontro patrocinado por uma associação energética no Canadá, e que o cachê era de US$ 5.000. O ambientalista Stephen Schneider também recebeu a mesma coisa. Havia gente de todos os lados lá.
O petróleo também bancou o Centro de Annapolis para Políticas Públicas Baseadas em Ciência, onde o sr. é membro de um conselho?
Calma lá! Já faz mais de 15 anos que isso não existe. E foi muito pouco. Até onde eu sei, não teve influência nenhuma. Não conheço nenhum cientista em atividade que se oponha ao alarmismo e seja apoiado pela indústria do petróleo ou carvão. Então, isso é uma tática diversionista. O petróleo hoje está financiando mais os alarmistas.

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