quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Mônica Bergamo

folha de são paulo

Grupo desconhece lei sobre biografias, afirmam juristas

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CASO CONTRÁRIO
Ao erguer o caso de Glória Perez como bandeira para justificar a defesa que fazem da restrição à publicação de biografias, artistas como Chico Buarque e Caetano Veloso demonstram desconhecimento do assunto, segundo juristas e advogados ouvidos pela coluna.
CASO CONTRÁRIO 2
Quando a novelista conseguiu impedir a circulação do livro que o assassino de sua filha tentou publicar, na década de 90, o artigo 20 do Código Civil, que restringe as biografias, nem sequer existia. Ele entrou em vigor em 2003.
CALENDÁRIO
Outro caso citado por Chico Buarque ontem, em artigo no jornal "O Globo" --o de que já foi publicada uma biografia de Cabo Anselmo-- esbarra na mesma questão. O livro sobre o delator foi lançado em 1999, antes da existência do artigo 20. Hoje, o autor teria dificuldade de publicar a obra sem autorização do personagem.
CALENDÁRIO 2
Também a biografia sobre Garrincha escrita pelo jornalista Ruy Castro foi recolhida em 1995, oito anos antes de o artigo 20 entrar em vigor. "A Constituição sempre garantiu o direito à privacidade e permitiu a discussão em tribunais", diz o advogado Fernando Lottenberg, que atuou em parte do caso Garrincha pela Companhia das Letras.
LENTE
Lottenberg, que é consultor da Companhia das Letras, mas já patrocinou causas contra em nome de personagens atingidos pela publicação de livros, diz que a discussão está desfocada. "A remoção do artigo 20 não é suficiente. É necessária uma regra que resguarde expressamente a livre expressão. A Constituição e outras normas continuariam garantindo o direito à reparação por danos causados e à retificação de informações falsas."
EM DIA
A Associação Procure Saber, da qual Chico e Caetano fazem parte, deve reunir em breve advogados para discutir as questões jurídicas relativas ao tema.
FUNDO DO JUDICIÁRIO
O Fundo de Previdência dos funcionários do Judiciário foi formalizado nesta semana. Com R$ 26 milhões antecipados pelo Tesouro Nacional, ele já pode começar a funcionar. Um headhunter (caça-talentos) roda o país em busca de um executivo que possa tocar a empreitada.
O fundo deve ser um dos maiores do país, com a adesão de funcionários de todos os tribunais superiores --entre eles, STF (Supremo Tribunal Federal), STJ (Superior Tribunal de Justiça), TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e TST (Tribunal Superior do Trabalho).
DAS ARÁBIAS
São Paulo vai abrigar o Museu da Língua e da Cultura Árabe, a primeira instituição do gênero no mundo. O diretor será o professor Paulo Daniel Farah, da USP, que foi curador da exposição "Islã", em 2010. "A Secretaria Municipal de Cultura ofereceu alguns espaços no centro e no Ipiranga para a futura sede do museu a ser inaugurado em 2014", diz Farah, que está visitando os locais para definir a sede.
DAS ARÁBIAS 2
A ideia é abrir um espaço para interessados na cultura árabe, entre eles os 16 milhões de descendentes que vivem hoje no Brasil.
MAIS RENDA
O aumento médio de renda dos alunos formados pelo programa ViraVida, que capacita jovens que passaram por exploração sexual, foi de R$ 183,55. Uma elevação de cerca de 45%, tão logo eles são inseridos no mercado de trabalho. De cada R$ 1 a mais de renda, R$ 0,40 vão compor o orçamento familiar.
MAIS RENDA 2
Os dados sobre o programa do Sesi (Serviço Social da Indústria), que já atendeu 3.700 estudantes em 23 cidades, serão apresentados hoje, em Washington, na 27ª Conferência Mundial de Avaliação de Programas, Tecnologias e Profissionais.
CASAL
Paschoal Rodriguez
Cláudia Raia e seu namorado, Jarbas Homem de Mello, estreiam "Crazy for You", em 21 de novembro, no teatro do Complexo Ohtake Cultural, em SP; será o primeiro musical de sapateado da Broadway montado no país.
NOVELÃO
As fundações Roquete Pinto, Azeredo, Padre Anchieta e Fundac foram desqualificadas do processo de licitação para gerenciamento da TV Alerj, canal da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, sob a justificativa de que não possuem registro no Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia). A única concorrente que atendia a tal requisito é a Digilab, atual administradora do canal.
NOVELÃO 2
Vencedora da nova licitação do canal da assembleia paulista após recorrer à Justiça para ser reabilitada no processo, a Fundac entrou com recurso administrativo contra a decisão no Rio. "Produtoras de TV precisam de engenheiros de telecomunicações, mas não de registro no Crea", afirma o advogado Danilo Mayriques, da fundação paulista. Em nota, a Alerj diz que a procuradoria-geral irá analisar a legalidade dos recursos.
NOITE DE ARRECADAÇÃO
Maria Bernadete Marques da Silva, da AACD, recebeu convidados no jantar beneficente promovido pela instituição anteontem, no restaurante Figueira Rubaiyat. A apresentadora Isabella Fiorentino, a relações-públicas Maysa Marques, o consultor da TV Globo Octávio Florisbal e o executivo Clovis Ermirio Scripilliti com a mulher, Marcia, estiveram no evento.

Jantar beneficente da AACD

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Zanone Fraissat/Folhapress
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A apresentadora Isabella Fiorentino foi ao jantar beneficente organizado pela AACD, na terça (15), no restaurante Figueira Rubaiyat
CASO CONTRÁRIO
Ao erguer o caso de Glória Perez como bandeira para justificar a defesa que fazem da restrição à publicação de biografias, artistas como Chico Buarque e Caetano Veloso demonstram desconhecimento do assunto, segundo juristas e advogados ouvidos pela coluna.
CASO CONTRÁRIO 2
Quando a novelista conseguiu impedir a circulação do livro que o assassino de sua filha tentou publicar, na década de 90, o artigo 20 do Código Civil, que restringe as biografias, nem sequer existia. Ele entrou em vigor em 2003.
CALENDÁRIO
Outro caso citado por Chico Buarque ontem, em artigo no jornal "O Globo" --o de que já foi publicada uma biografia de Cabo Anselmo-- esbarra na mesma questão. O livro sobre o delator foi lançado em 1999, antes da existência do artigo 20. Hoje, o autor teria dificuldade de publicar a obra sem autorização do personagem.
CALENDÁRIO 2
Também a biografia sobre Garrincha escrita pelo jornalista Ruy Castro foi recolhida em 1995, oito anos antes de o artigo 20 entrar em vigor. "A Constituição sempre garantiu o direito à privacidade e permitiu a discussão em tribunais", diz o advogado Fernando Lottenberg, que atuou em parte do caso Garrincha pela Companhia das Letras.
LENTE
Lottenberg, que é consultor da Companhia das Letras, mas já patrocinou causas contra em nome de personagens atingidos pela publicação de livros, diz que a discussão está desfocada. "A remoção do artigo 20 não é suficiente. É necessária uma regra que resguarde expressamente a livre expressão. A Constituição e outras normas continuariam garantindo o direito à reparação por danos causados e à retificação de informações falsas."
EM DIA
A Associação Procure Saber, da qual Chico e Caetano fazem parte, deve reunir em breve advogados para discutir as questões jurídicas relativas ao tema.
CURTO-CIRCUITO
Claudia Matarazzo autografa hoje o livro "Amor sem Frescura", às 19h, na Livraria Cultura do shopping Iguatemi.
As agências de marketing George P. Jonhson e Mill Publicitá fazem festa hoje para comemorar nova parceria, no hotel Hyatt.
Renata de Almeida abre hoje a 37ª Mostra Internacional de Cinema, às 20h30, no Auditório Ibirapuera.
com ELIANE TRINDADE, JOELMIR TAVARES, ANA KREPP e MARCELA PAES
Mônica Bergamo
Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.

Kenneth Maxwell

folha de são paulo
Populismo revivido
Na França e na Inglaterra, nacionalistas, populistas e militantes céticos quanto à União Europeia estão causando abalos nas elites políticas. Enquanto isso, os nacionalistas catalães, na Espanha, e os nacionalistas escoceses, no Reino Unido, contestam a estrutura que define seu status nacional.
Na França e na Inglaterra, os desafiantes apelam a um público desencantado com os políticos nacionais. Exploram a raiva quanto ao desemprego e a imigração, bem como a preocupação sobre a lei e a ordem.
Na França, a Frente Nacional (FN), de Marine Le Pen, conquistou espantosa vitória na pequena cidade de Brignoles, no domingo, onde o candidato do partido, Laurent Lopez, ex-boxeador, mas elegantemente trajado em terno e gravata, conquistou 54% dos votos num distrito há muito dominado pelo Partido Comunista Francês.
Ainda que a FN tenha só duas cadeiras na Assembleia Nacional, Marine Le Pen reformulou a agremiação, deixou de lado o antissemitismo e desintoxicou o partido raivoso criado por seu pai, Jean-Marie Le Pen. Ela parece destinada a obter bom desempenho nas eleições municipais de março e nas eleições europeias de maio, para as quais as pesquisas mostram a FN na liderança com 24% dos votos potenciais. O sucesso dela vem causando pânico aos políticos centristas de Paris.
Na Inglaterra, o Partido da Independência do Reino Unido (Ukip), de Nigel Farage, representa igual desafio para as forças estabelecidas. Os líderes do Partido Conservador contemplam com ansiedade o sucesso do Ukip nas eleições locais e se preocupam com a eleição para o Parlamento Europeu, na qual o Ukip pode se sair muito bem, de acordo com pesquisas de opinião pública.
O partido de Farage também atrai as pessoas desencantadas com os partidos políticos convencionais. O Ukip não tem representação no Parlamento nacional, mas conta com forte apoio de base.
Na Catalunha e na Escócia, os desafiantes têm base mais ampla. Os nacionalistas catalães têm forte base histórica e cultural para seu separatismo.
Os nacionalistas escoceses já controlam o governo da Escócia. Estão se preparando para o referendo de 2014, sobre o futuro do relacionamento entre a Escócia e o restante do Reino Unido, em uma votação sobre a independência escocesa, que pode pôr fim ao Reino Unido na forma pela qual é conhecido há mais de 400 anos.
Marine Le Pen define o problema como um conflito entre "nacionalismo e globalização". Mas, em um momento no qual a Europa busca maior integração fiscal e econômica, muitos de seus principais países enfrentam crescente ameaça de fragmentação interna.
O Brasil, com sua geografia continental e a despeito de seus problemas, ao menos não enfrenta esse tipo de desafio.

    José Simão

    folha de são paulo
    Ueba! Biografia da Lassie pode?
    Daqui a pouco, vai ter manifestação de biógrafos! Na Cinelândia! Black biógrafos! Rarará!
    Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Polêmica! Vou lançar a biografia não autorizada do Maluf: "Minha Vida é uma Esfirra Aberta". Vai ser um romance policial. Rarará!
    Mas como disse um cara no Twitter: "Biografa, mas não mata". Subtítulos sugeridos: "Não tenho conta no exterior" ou "Minha vida foi uma roubada". Rarará!
    O Maluf escreveu mesmo uma biografia chamada "Ele". E os advogados de defesa sugeriram mudar o nome pra "Não Foi Ele!". Rarará! E vou lançar a biografia autorizada do Sarney: "Moribundo de Fogo!". Rarará! E vou vender pro cinema: "Duro de Matar 5".
    Aliás, aquele livro do Sarney "Dono do Mar" devia se chamar "Dono do Mar...anhão". Rarará! E eu vou escrever a biografia do Bial chamada: "OI, BIAL". Porque brasileiro já nasce falando "Oi, Bial". O Bial inventou um novo tipo de biografia: a BIALGRAFIA do doutor Marinho!
    E vou lançar a biografia do Edir Macedo intitulada: "EDÍRZIMO". Edírzimo Macedo! E vou lançar a biografia do Kid Bengala: "O Gigante Acordou". E entrar pra ABL com o apoio da Ana Maria Braga e Louro José! E eu já disse que duas coisas nunca deram certo: humor a favor e biografia autorizada.
    E a manchete do Piauí Herald: "PM carioca reprime biógrafos com truculência". Daqui a pouco, vai ter manifestação de biógrafos! Na Cinelândia! Black biógrafos! Rarará! E acaba de sair uma nova versão do hit do Roberto Carlos: "O cara que censura toda hora/ qualquer livro da Jovem Guarda/ esse cara sou eu". Rarará!
    E eu não gosto de biografia chapa-branca. Gosto de biografia chapa quente: com sexo, sangue e Doritos com Coca-Cola. Daquelas bem podres! E a Saraiva botou a biografia de Freud na seção de autoajuda! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
    E eu não gosto de polêmica. Quem gosta de polêmica é o Nelson Rubens! Polêmica virou pauta do "TV Fama"! Já reparou nas manchetes do "TV Fama"? Todas começam com "POLÊMICA". Tipo: "Polêmica! Cantor sertanejo do Camaro Amarelo' diz que Miss Bumbum tem celulite". "Polêmica: Doutor Hollywood quer passar dois anos trabalhando no SUS de Rodeo Drive". Rarará!
    E biografia da Lassie pode? Pode! Contanto que não chame ela de cachorra! Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza!
    Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

    Advogados também apontam falhas na argumentação usada por Caetano e Chico para defender proibição

    folha de são paulo
    BIOGRAFIAS
    Para juristas, lobby de músicos ameaça produção acadêmica
    Advogados também apontam falhas na argumentação usada por Caetano e Chico para defender proibição
    'Espero que os artistas não queiram censurar a academia, é um efeito colateral danoso', diz professor de direito
    JULIANA GRAGNANIDE SÃO PAULOA publicação acadêmica pode ser afetada caso o lobby dos músicos consiga manter a exigência de autorização prévia para a publicação de biografias na lei brasileira. O alerta foi feito por juristas e historiadores.
    O artigo do Código Civil que é centro do embate entre autores e músicos se refere à "divulgação de escritos", hoje mais aplicado à publicação de biografias. Mas também pode se estender a outras áreas, na visão de especialistas. "Espero que os artistas não queiram censurar a academia, mas a interpretação que defendem pode levar a isso. É um efeito colateral danoso", diz o professor de direito constitucional Joaquim Falcão, da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro.
    A instituição representa o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro no Supremo Tribunal Federal. A entidade entrou como "amicus curiae" (interessado na causa) no Supremo, integrando uma ação proposta por editores que questiona a constitucionalidade da norma vigente.
    Caetano, Chico e Gil, além de Roberto Carlos, Milton Nascimento, Djavan e Erasmo Carlos, integram o grupo Procure Saber, que defende a exigência de autorização prévia para a publicação de biografias, além de pagamento ao biografado.
    "A ciência precisa da publicação dos seus resultados para serem contestados", afirma Falcão.
    O documento que explica o posicionamento dos historiadores e que foi submetido ao Supremo usa a história de Tiradentes (1746-1792) como exemplo. O historiador Joaquim Norberto de Souza Silva (1820-1891) publicou obra questionando o papel desempenhado pelo "herói" da Inconfidência Mineira. Em seu trabalho, diz que Tiradentes não teria morrido como um patriota, mas como um frade.
    "Imagine-se que os descendentes de Tiradentes, invocando o artigo 20 do Código Civil, possam requerer a proibição de todas as obras que não retratem Tiradentes como o protomártir da independência do Brasil'? Tal cenário seria absurdo, e uma afronta à liberdade acadêmica, de ensino e de informação, pois os professores só poderiam retratar o Tiradentes que a família dele escolhesse", diz o memorial.
    "Isso pode criar dificuldades grandes para os historiadores e prejudicar imensamente a historiografia nacional", diz o diplomata e historiador Alberto da Costa e Silva, imortal da Academia Brasileira de Letras. "A formação de documentos contemporâneos fica prejudicada".
    DISSERTAÇÃO
    Em abril, os advogados de Roberto Carlos enviaram uma notificação extrajudicial pedindo a interrupção das vendas de "Jovem Guarda: Moda, Música e Juventude" (Estação Letras e Cores), de Maíra Zimmermann.
    O livro, resultado do mestrado da autora, trata da relação do movimento com consolidação da cultura juvenil no Brasil nos anos 1960.
    A notificação alegava que a obra trazia "situações que envolvem o notificante e detalhes sobre a trajetória de sua vida e intimidade".
    Zimmermann enviou uma contranotificação ao escritório de Roberto, informando que a obra não tratava da intimidade do cantor e que se baseava principalmente em arquivos dos anos 1960.
    Na ocasião, a repercussão negativa fez os advogados de Roberto desistirem de impedir a circulação da dissertação de mestrado, que saiu com tiragem de mil exemplares.
    O professor Ivar Hartmann, também da FGV-Rio, aponta danos que a lei pode causar para a academia no futuro.
    "O problema não é só quando as normas proíbem a publicação de uma pesquisa acadêmica, é quando inviabilizam aos pesquisadores terem acesso a fontes, como artigos e biografias que deixaram de ser publicados. Quantos anos nós já perdemos de pesquisa?", questiona.
    ARGUMENTOS
    Em artigos publicados no jornal "O Globo", Chico Buarque e Caetano Veloso fazem menção à história da novelista Glória Perez, que, em 1995, tirou de circulação um livro sobre o assassinato de sua filha escrito pelo autor do crime. Chico diz que o procedimento foi possível "graças à lei que a associação de editores quer modificar".
    Mas o fato se deu antes da existência do Código Civil, lei sancionada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em 2002.
    "O que o Código Civil fez foi piorar uma situação que já não era boa. A norma potencializa a tradição da Justiça brasileira de minar a liberdade de expressão", afirma Hartmann.

      Resposta de Caetano é só uma 'desconversa', diz Benjamin Moser

      folha de são paulo
      PAULO WERNECKCOLABORAÇÃO PARA A FOLHA"Uma desconversa": assim o escritor Benjamin Moser, definiu a resposta de Caetano Veloso a sua carta aberta, que a Folha publicou em 9/10. Na carta, Moser pediu ao músico que reconsiderasse seu apoio à legislação que restringe a publicação de biografias não autorizadas.
      Caetano respondeu em sua coluna no jornal "O Globo", no último domingo, sem se dirigir diretamente a Moser.
      "Há um intraduzível verbo brasileiro, 'desconversar'. Foi uma desconversa", disse Moser à Folha, por e-mail.
      Questionado sobre a frase com que Caetano recusa a pecha de censor ("Censor, eu? Nem morta!"), Moser afirma que os atos contradizem as aparências: "Ninguém sai por aí dizendo que quer restabelecer a Santa Inquisição. Na Feira de Frankfurt, o escritor Bernardo Carvalho falou que todo mundo [no Brasil] está contra a corrupção'. É tão fácil. Não significa nada. Com a censura é a mesma coisa."
      Segundo ele, a divulgação da campanha do grupo Procure Saber na época da Feira de Frankfurt, "um dos mais importantes símbolos do livre intercâmbio de ideias, justamente no ano em que todos os olhos estavam no Brasil, deu uma impressão de, no mínimo, mau gosto".
      Na Alemanha, onde participou de lançamentos de livros de Clarice Lispector e de sua biografia da escritora brasileira, Moser diz ter recebido amplo apoio.
      "Todos os escritores, jornalistas, editores, professores, artistas e diplomatas ficaram chocados [com a legislação restritiva]. Eu diria a Caetano, Chico e Gil que nem a biografia mais brega é uma ameaça tão séria a seu legado quanto a decepção --o desprezo, até --da intelectualidade."
      Moser ainda criticou o artigo de Chico Buarque, publicado ontem no jornal "O Globo": "E o Chico Buarque apoiando a censura pelo bem do país? Ah, é porque uma vez uma citação dele foi inventada ou tirada do contexto [segundo Chico, no livro "Eu Não sou Cachorro Não", de Paulo Cesar de Araujo]".
      "E Chico confessa que nem sabe por que a própria editora [Companhia das Letras] teve que pagar uma indenização à família de Garrincha [pela biografia escrita por Ruy Castro], mas diz que acha uma boa."

        Contardo Calligaris

        folha de são paulo
        Qual romance você está lendo?
        Se eu for chamado a sabatinar um candidato, perguntarei sem falta: qual romance você está lendo?
        Sempre pensei que fosse sábio desconfiar de quem não lê literatura. Ler ou não ler romances é para mim um critério. Quer saber se tal político merece seu voto? Verifique se ele lê literatura. Quer escolher um psicanalista ou um psicoterapeuta? Mesma sugestão.
        E, cuidado, o hábito de ler, em geral, pode ser melhor do que o de não ler, mas não me basta: o critério que vale para mim é ler especificamente literatura --ficção literária.
        Você dirá que estou apenas exigindo dos outros que eles sejam parecidos comigo. E eu teria que concordar, salvo que acabo de aprender que minha confiança nos leitores de ficção literária é justificada.
        Algo que eu acreditava intuitivamente foi confirmado em pesquisa que acaba de ser publicada pela revista "Science" (migre.me/gkK9J), "Reading Literary Fiction Improves Theory of Mind" (ler ficção literária melhora a teoria da mente), de David C. Kidd e Emanuele Castano.
        Uma explicação. Na expressão "teoria da mente", "teoria" significa "visão" (esse é o sentido originário da palavra). Em psicologia, a "teoria da mente" é nossa capacidade de enxergar os outros e de lhes atribuir de maneira correta crenças, ideias, intenções, afetos e sentimentos.
        A teoria da mente emocional é a capacidade de reconhecer o que os outros sentem e, portanto, de experimentar empatia e compaixão por eles; a teoria da mente cognitiva é a capacidade de reconhecer o que os outros pensam e sabem e, portanto, de dialogar e de negociar soluções racionais. Obviamente, enxergar o que os outros sentem e pensam é uma condição para ter uma vida social ativa e interessante.
        Existem vários testes para medir nossa "teoria da mente" --os mais conhecidos são o RMET ou o DANVA, testes de interpretação da mente do outro pelo seu olhar ou pela sua expressão facial. Em geral, esses testes são usados no diagnóstico de transtornos que vão desde o isolamento autista até a inquietante indiferença ao destino dos outros da qual dão prova psicopatas e sociopatas.
        Kidd e Castano aplicaram esses testes em diferentes grupos, criados a partir de uma amostra homogênea: 1) um grupo que acabava de ler trechos de ficção literária, 2) um grupo que acabava de ler trechos de não ficção, 3) um grupo que acabava de ler trechos de ficção popular, 4) um grupo que não lera nada.
        Conclusão: os leitores de ficção literária enxergam melhor a complexidade do outro e, com isso, podem aumentar sua empatia e seu respeito pela diferença de seus semelhantes. Com um pouco de otimismo, seria possível apostar que ler literatura seja um jeito de se precaver contra sociopatia e psicopatia. Mais duas observações.
        1) A pesquisa mede o efeito imediato da leitura de trechos literários. Não sabemos se existem efeitos cumulativos da leitura passada (hoje não tenho tempo, mas "já li muito na adolescência"): o que importa não é se você leu, mas se está lendo.
        2) A pesquisa constata que a ficção popular não tem o mesmo efeito da literária. A diferença é explicada assim: a leitura de ficção literária nos mobiliza para entender a experiência das personagens.
        "Como na vida real, os mundos da ficção literária são povoados por indivíduos complexos cujas vidas interiores devem ser investigadas, pois são raramente de fácil acesso." "Contrariamente à ficção literária, a ficção popular (...) tende a retratar o mundo e as personagens como internamente consistentes e previsíveis. Ela pode confirmar as expectativas do leitor em vez de promover o trabalho de sua teoria da mente."
        Em suma, o texto literário é aquele que pede esforços de interpretação por aquelas caraterísticas que foram notadas pelos melhores leitores do século 20: por ser ambíguo (William Empson), aberto (Umberto Eco) e repleto de significações secundárias (Roland Barthes).
        Na hora de fechar esta coluna, na terça-feira, encontro a mesma pesquisa comentada na seleção do "New York Times" oferecida semanalmente pela Folha. A jornalista do "Times" pensou que a leitura literária, ajudando-nos a enxergar e entender os outros, facilitaria nossas entrevistas de emprego ou nossos encontros românticos.
        Quanto a mim, imaginei que, na próxima vez em que eu for chamado a sabatinar um candidato, não esquecerei de perguntar: qual é o romance que você está lendo? E espero que o candidato mencione um livro que conheço, para verificar se está falando a verdade.

        Janio de Freitas

        folha de são paulo
        No andar das passeatas
        Por que a Polícia Militar do Rio não se empenha em prender os ativos da violência, não se sabe
        A sucessão de passeatas de professores seguidas de violência caótica no Rio tem muito de estranho.
        A frequência das manifestações desses professores já as tornou sem efeito e sem sentido. Continuam, no entanto. Essa movimentação e sua liderança nem enfraquecem o governo municipal nem levam a negociações com perspectiva de acordo.
        A liderança desse segmento de professores municipais é exercida pelo Sepe, que já teve posta em dúvida, além da sua dimensão representativa, a condição de plena validade como Sindicato Estadual de Professores de Ensino. Há outro sindicato, não comprometido com a sucessão de passeatas. Por mais de uma vez, o comando dessa movimentação declarou apoio à ação "black bloc". Nas vésperas da passeata de anteontem, o Sepe conferiu à turma do "black bloc" a condição de vanguarda do professorado municipal em greve há dois meses.
        Mais do que o aproveitamento circunstancial de tais passeatas pela violência "black bloc", portanto, há uma identificação que permite a suspeita de ser, de fato, coordenação. E, sendo assim, a possibilidade de ser um motivo a mais para a exacerbação da resistência a negociações promissoras para o fim da greve.
        O capítulo das reivindicações e ofertas não é menos sugestivo. O pedido inicial do Sepe levaria os professores a um vencimento mensal, no fim da carreira, que hoje seria superior a R$ 124 mil. A leviandade da proposta ficou reconhecida pelo próprio Sepe, ao admitir o erro de suas contas. Mas a irresponsabilidade só encolheu, não desapareceu, porque a nova tabela leva a R$ 62 mil.
        O plano de carreira e vencimentos proposto pelo município, aprovado pelos vereadores e posto em suspenso pelo Judiciário, está longe de empolgante. Mas não é ruim. Só o fato de reconhecer uma carreira aos professores, com a escalada por tempo de serviço e atrações para o regime de 40 horas semanais, já é um avanço importante. Mas o Sepe exige que, em vez de chegar a R$ 9 mil e tanto, entre vencimento e benefícios no último grau da escala, chegue a R$ 24 mil e tanto, irrealidade útil só como obstáculo atual.
        No outro extremo do observável está a conduta da polícia. Quando a baderna arrefeceu, a PM enfim dispôs-se a usar soldados em número suficiente para fazer um cerco e prisões, dadas como seis dezenas. Mas de pessoas que há dias estavam acampadas diante da Câmara Municipal, em cujas escadas sentavam-se ao serem detidas. Não era gente da ação "black bloc". Dessa, se houve prisão, foi em número insignificante.
        Por que a PM não se empenha em prender os ativos da violência, não se sabe. A eles é que interessaria prender para saber de quem se trata, de onde veem, a quem seguem e por que a sanha de destruir sinalizações urbanas, monumentos, partes de prédios públicos, portanto, bens da cidade. Presos foram os acampados que emporcalham, eles mesmos emporcalhados, mas lá estavam por dias e dias de tolerável passividade.
        Não para completar, que faltam muitas, mas, para apimentar as estranhezas, apareceu agora a primeira referência a tiros na agitação, anteontem no Rio. Os disparos vistos na imagem são dirigidos, não contra o nível de pessoas na rua, nem para o alto propriamente, mas para o que poderia ser a altura da copa de árvore urbana. Dois atiradores agitados, na imagem fugaz, em lugar não reconhecível. E, depois, um jovem com braços quebrados, dizendo-se vítima de tiro às 8 da noite na manifestação, mas só se apresentando a um hospital às 11 da noite.