quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Coreografia aérea e festivais levam dança contemporânea a SP, Rio e Minas

Chuva de bailarino
Uma coreografia aérea e três festivais colocam a dança contemporânea em palcos paulistas, mineiros e cariocas
folha de são paulo
IARA BIDERMAN
DE SÃO PAULO
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Nesta e nas próximas semanas, tanto os fãs de carteirinha quanto os que não têm a menor ideia do que seja dança contemporânea vão poder mergulhar nas suas várias vertentes, das mais pop às mais "cabeça".
A linha acrobática, com bailarinos suspensos no ar e movimentos atléticos, é uma das mais populares. Está representada na produção "Ilusões - O Amor na Mesa Vertical de Tarô", do Grupo Ares, que estreia amanhã no Memorial da América Latina, em São Paulo.
Os bailarinos dançam presos a uma parede de 13 metros de altura montada na praça de eventos do memorial. Apesar das peripécias aéreas, o protagonista (o ator e acrobata Guto Vasconcelos) afirma que o espetáculo é despretensioso:"É para ser um alento de 30 minutos na noite de São Paulo".

Dança nas alturas

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Bruno Poletti/Folhapress
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Ensaio da dança aérea "Ilusões - O Amor na Mesa Vertical do Tarô", que estreia no Memorial da América Latina, em São Paulo
A concepção do espetáculo, da coreógrafa goiana Monica Ala, junta circo e ideias do psicoterapeuta Carl Jung (1875-1961) para contar a "jornada do herói", no caso um executivo que pensa em se matar representado por Vasconcelos.
"Tem a parte conceitual, mas o foco é mais lúdico. Realizamos uma fantasia impossível: dançar no ar", afirma Monica Ala.
Para quem quer conhecer o que a vertente mais "conceitual" está fazendo, o Festival Contemporâneo de Dança, que começa hoje em São Paulo, é a oportunidade.
A sexta edição do evento terá menos grupos e artistas do que as anteriores, mas cada coreografia ficará mais tempo em cartaz.
Até o dia 24, serão apresentados seis espetáculos de artistas que estão despontando no cenário nacional e internacional, segundo Adriana Grechi, diretora artística do festival. "São trabalhos solo, de duplas e de trios que usam o corpo para estimular a reflexão", diz Grechi.
Na abertura, hoje à noite, os portugueses Sofia Dias e Vítor Roriz apresentam "Um Gesto que Não Passa de uma Ameaça", experimentação que parte da repetição de palavras faladas e da transformação de seus sentidos.
MITOS FUNDADORES
No Rio, o Festival Panorama rola com oito horas diárias de programação. Um dos maiores da área no país, abarca várias linhas da dança contemporânea. Uma é a volta às raízes de sua própria (e recente) história.
Espetáculos retomam mitos fundadores da dança feita hoje, como releituras da "Sagração da Primavera", que fez cem anos.
Em uma delas, o catalão Roger Bernart faz do público o intérprete da coreografia. Aí entra também outra característica da produção atual, a interação com a plateia.
Neste fim de semana, a francesa Olivia Grandville leva ao Rio "Cabaré Discrepante", manifesto dançado sobre arte, e a americana Lois Weaver chama o público a debater na instalação "The Long Table", no Parque Lage.
ILUSÕES - GRUPO ARES
QUANDO de amanhã a domingo, às 20h
ONDE Memorial da América Latina (av. Auro Soares de Moura Andrade, 664, Barra Funda, São Paulo)
QUANTO grátis
FESTIVAL CONTEMPORÂNEO DE DANÇA (SP)
QUANDO de hoje até 24/11
festivalcontemporaneodedanca.com
QUANTO grátis
FESTIVAL PANORAMA (Rio)
QUANDO até 10/11
panoramafestival.com
QUANTO de R$ 4 a R$ 20
Espetáculos com apelo crítico dão o tom de festival em Minas
LUCIANA PAREJA NORBIATOCOLABORAÇÃO PARA A FOLHAQuem acha que dança é a arte do movimento harmônico pode se espantar ao assistir o coletivo português Bomba Suicida e o coreógrafo Benoît Lachambre, do grupo canadense Par B.L.Eux. Ambos produzem em seus espetáculos um estranhamento que joga para os ares o virtuosismo, colocando em xeque a ideia vigente de normalidade.
Não à toa, o Bomba Suicida foi o escolhido para abrir o FID (Fórum Internacional da Dança) nesta sexta, em Belo Horizonte. "De 1996 para cá, acabamos fazendo concessões, o que diminuiu o apelo político do evento. Neste ano, resolvemos voltar às origens e usar toda a potência crítica da dança", diz Adriana Banana, organizadora do evento com Carla Lobo.
Na estreia, o Bomba Suicida apresenta "Paraíso - Colecção Privada", uma visão ácida do céu e do inferno. O coleti vo traz ainda ao FID "A Primeira Dança de Urizen" e "Guintche".
Outra atração do festival mineiro, o grupo candense Lachambre vai também apresentar seu último trabalho, "Snakeskins", em São Paulo, nos dias 14 e 15.

    Alguma coisa está fora da moda nesta temporada

    folha de são paulo
    ANÁLISE
    DARIO CALDASESPECIAL PARA A FOLHAFutebol, cultura celta, romantismo retrô, silhueta "new look" ou releitura do moletom: mais uma vez, é hora da moda reativar o seu carrossel de tendências na fashion week. No entanto, o clima de festa permanente nos corredores e backstages parece ter ficado para trás.
    Um certo incômodo paira no ar, na semana de moda paulistana, a despeito dos desfiles concorridos e das celebridades: no meio da passarela, sentou-se um enorme elefante cinzento que responde pelo nome genérico de crise.
    É claro que negá-la com veemência faz parte do marketing positivo do evento. Bem mais difícil é negar que há uma crise de gestão das marcas, abaladas pelos inviáveis custos de produção brasileiros.
    Na ponta da indústria, faz anos que o tema crise de competitividade frequenta reuniões do setor e páginas da mídia. É difícil manter o sistema da moda funcionando sem um aparelho produtivo vigoroso.
    Os países que conseguiram já tinham uma posição forte em ativos imateriais --marcas, marketing, etc.--, quando inventaram a terceirização na Ásia (e o caminho de volta para casa, aliás, já começou).
    É incontornável, enfim, a sensação de que a semana de moda anda algo deslocada por fatores que vão das mudanças de local e de calendário à diminuição do número de desfiles, além da percepção de que os preços praticados por algumas marcas, eles sim, estão completamente fora do lugar.
    Não deixa de ser paradoxal, de certo modo frustrante, que isso aconteça no momento em que o Brasil seja efetivamente percebido como país de moda e design, no cenário internacional.
    Se serve de consolo, o momento de fraqueza da moda é global. O consumidor parece ter-se cansado de ver roupas que não vai usar.
    "Eles não entendem", lamentam-se estilistas e fashionistas. "Não é isso que queremos", reafirmam os consumidores, em franca desconexão com as passarelas --e cada vez mais sintonizados com o estilo acessível e democrático do grande varejo, que é onde a festa, por enquanto, continua.

      'Superanticorpo' contra HIV controla infecção em macacos

      folha de são paulo

      Tratamento desenvolvido nos EUA com participação de pesquisador brasileiro será testado em humanos em 2014
      Anticorpos neutralizam capacidade do HIV de se ligar às células, reduzindo a carga viral a níveis indetectáveis
      DÉBORA MISMETTIEDITORA DE "CIÊNCIA+SAÚDE"Nem todo mundo se defende contra o HIV da mesma forma: algumas pessoas produzem tipos raros de "superanticorpos" contra o vírus. A eficácia de uma terapia que usa esses anticorpos para controlar um vírus similar ao HIV em macacos é relatada em dois estudos publicados hoje na "Nature".
      Infusões dos "superanticorpos" clonados a partir do material colhido de humanos conseguiram reduzir, em uma semana, a carga de HIV a níveis indetectáveis em um grupo de macacos resos.
      Esse controle da carga viral, no entanto, não foi duradouro na maioria deles: dois meses após a aplicação da terapia, em média, o número de vírus em circulação voltou a crescer na maioria dos macacos. O controle só permaneceu nos que já tinham uma carga viral mais baixa desde o início do estudo, o que sugere uma ação conjunta do sistema imune dos animais e dos "superanticorpos".
      EM HUMANOS
      Segundo Michel Nussenzweig, pesquisador brasileiro que é um dos líderes do grupo responsável por esses trabalhos, o tratamento será testado em humanos no início de 2014, nos EUA. Serão 75 voluntários, e os primeiros resultados devem ser obtidos em julho ou agosto.
      A existência desses anticorpos poderosos já é conhecida há anos pelos pesquisadores. Eles se tornaram o objeto de estudo do brasileiro especialista em imunologia.
      "Eu sabia que algumas pessoas conseguiam fazer anticorpos poderosos, mas não havia como cloná-los. Desenvolvi um método para isso que é muito eficaz."
      Nussenzweig, 58, é pesquisador da Universidade Rockefeller, nos EUA. Filho de cientistas que se dedicam a estudos sobre malária, Victor e Ruth Nussenzweig, Michel mora nos EUA desde 1964, quando seus pais foram para a Universidade de Nova York.
      Em 2012, ele publicou, também na "Nature", um estudo demonstrando a eficácia do uso desses "superanticorpos" em roedores geneticamente modificados.
      Agora, após levantar US$ 10 milhões (a maior parte com a Fundação Bill e Melinda Gates), Nussenzweig aguarda o início dos testes em humanos.
      COMO FUNCIONA
      Segundo o pesquisador, os anticorpos atacam o vírus exatamente na região da sua superfície que permite sua ligação com as células CD4. Essa ligação é que permite que o vírus invada a célula e se multiplique.
      "O anticorpo bloqueia a capacidade do vírus de entrar na célula", disse Nussenzweig àFolha, por telefone, do Rio. Ele participou, nesta semana, de uma conferência da fundação Gates no Brasil.
      A ação dos "superanticorpos" é, portanto, diferente do mecanismo das drogas antirretrovirais usadas hoje. Elas agem quando o vírus já está dentro da célula, impedindo sua replicação.
      Mas uma coisa os "superanticorpos" e os antirretrovirais têm em comum: é mais vantajoso usar mais de um tipo de cada um deles para evitar que o vírus, que tem grande capacidade de mutação, se torne resistente e drible os ataques.
      Hoje, o coquetel anti-HIV usa três drogas. Os testes com macacos usaram um ou dois tipos de "superanticorpos".
      De acordo com Esper Kallás, professor de imunologia clínica e alergia da Faculdade de Medicina da USP (não envolvido com o estudo), esse tratamento pode vir a ser usado em associação com os antirretrovirais atuais em pacientes com resistência aos remédios, por exemplo.
      Outra opção seria usar os anticorpos em momentos-chave, como na hora do parto ou logo após um contato acidental com o vírus, como um estupro. A grande desvantagem é o custo: o anticorpo é muito mais caro do que os antirretrovirais.
      "Se desse para induzir o organismo a produzir esses anticorpos continuamente, você teria uma vacina."
      Segundo Nussenzweig, descobrir como algumas pessoas produzem esses "superanticorpos" poderá dar um mapa aos cientistas para produzir uma imunização.
      "Todas as vacinas que temos até hoje foram feitas copiando a natureza. No caso do HIV, ainda não conseguimos fazer isso, porque não sabemos como esses anticorpos são feitos."
        Ainda não há opção a macaco, dizem cientistas
        DA EDITORA DE "CIÊNCIA+SAÚDE"Até agora, não há alternativa aos uso dos macacos para checar se novos tratamentos contra o HIV são seguros o suficiente para serem testados em humanos, segundo Esper Kallás, da Faculdade de Medicina da USP.
        Em breve, uma vacina contra o HIV desenvolvida no Brasil começará a ser aplicada em macacos resos no Instituto Butantan.
        Michel Nussenzweig, da Universidade Rockefeller, que usa macacos resos em seus estudos, afirma que animais não devem ser usados em pesquisas quando há alternativas.
        "Não acho que animais devam ser usados para testar cosméticos. Só quando não houver escolha e quando a pesquisa tem a chance de beneficiar as pessoas."
        O roubo de 178 beagles do Instituto Royal, em São Roque, há quase duas semanas, trouxe o tema da pesquisa em animais à tona. O laboratório usava as cobaias para estudos com medicamentos contra câncer, entre outros.
        "Infelizmente, não teria outra forma de fazer esse estudo [sobre HIV] sem os macacos. Levo isso muito a sério. Não podemos abusar dos animais. Tentamos criar as condições mais humanas possíveis durante os testes."
        Segundo Kallás, pesquisador nenhum gosta de sacrificar animais, mas é preciso pesar custo e benefício.
        "São 35 milhões de pessoas com HIV no mundo. Até hoje, quantos macacos foram usados em pesquisas? Um número infinitamente menor. Ninguém gosta de testar macaco. Mas quais são as prioridades da saúde pública brasileira e mundial?"
        O professor de imunologia da USP, que realiza pesquisas com seres humanos, afirma que a regulamentação brasileira já é bem rigorosa para os testes com animais e com pessoas.
        Para ele, a demora na aprovação dos testes clínicos chega a ser excessiva. "O rigor aqui é maior do que lá fora. Acabamos sofrendo com isso, demoro um ano e meio para aprovar um teste clínico."
        Kallás afirma que quem faz pesquisa no Brasil hoje está "esmagado" entre o debate da sociedade sobre o uso de cobaias e a burocracia necessária para aprovar os testes.
        "Esses movimentos [contra pesquisa em animais] já aconteceram na Europa e nos EUA há 20 anos. Sempre tem alguém que acha que salvar um coelho é mais importante do que salvar uma pessoa."

          Marcelo Miterhof

          folha de são paulo
          IPTU sem preconceito
          Facilmente percebido por quem paga, o IPTU deixa o cidadão mais atento para cobrar bom uso dos recursos
          Volto ao IPTU. Evidentemente, esperava uma forte reação contrária à coluna "Aumentem meu IPTU!", de 17/10/2013, na qual, entre outras coisas, defendi uma maior tributação sobre o patrimônio e a renda como maneira de criar espaço para reduzir a taxação sobre a produção e o consumo.
          Não à toa, segundo o Datafolha, 89% dos paulistanos são contrários à elevação do IPTU. A princípio, ninguém quer pagar mais imposto. Mas é preciso ir além da oposição apriorística. Nesse sentido, os colunistas Vinicius Mota (24/10/2013) e Hélio Schwartsman (25/10/2013) levantaram bons argumentos contra a medida.
          O principal é que a valorização dos imóveis nos últimos anos tende em parte a ser irrelevante, pois ela só se converte em ganhos efetivos aos proprietários quando os imóveis são vendidos.
          Um problema derivado, em exemplo clássico dado por Schwartsman, é o de aposentados, que compraram suas residências quando trabalhavam e, hoje, ganhando menos, são punidos pela alta do tributo, que comprime suas rendas.
          Generalizando o argumento, Mota advoga que o IPTU é um falso imposto sobre imóveis, que de fato incide sobre a renda e deveria ter sua elevação limitada à dos salários.
          A alternativa talvez fosse acabar com a tributação sobre a riqueza. O problema é que raciocínio semelhante vale ainda mais para outros impostos, como o ICMS. A taxação de bens e serviços não leva em conta a renda, o que a torna regressiva: como distintos consumidores pagam uma mesma quantia de imposto, ele representa uma fração maior da renda de quem ganha menos.
          A tributação poderia ser feita exclusivamente pelo IR. No entanto, há alto risco nessa opção: a liquidez da renda a torna mais fácil de ser sonegada. Por isso, deve-se ter um balanço entre as taxações sobre consumo, riqueza e renda. Nesse sentido, a tributação do patrimônio é boa porque em geral é proporcional à renda e difícil de se escapar.
          Além disso, tome o exemplo de duas pessoas de igual renda, mas uma proveniente do trabalho e a outra de aluguéis. Ambas pagarão o mesmo de IR, porém é preciso também taxar a riqueza para desestimular o rentismo.
          Por certo, é preciso ter cuidados, como fazer aumentos graduais. A renda limita em algum grau a exploração do IPTU. Não é simples fazer a cobrança de um fluxo (o imposto anual) incidente sobre o valor de um estoque pouco líquido (o imóvel).
          Porém é inegável que o valor de mercado do imóvel é o melhor parâmetro para cobrar o IPTU. Nos últimos anos, a alta dos preços imobiliários refletiu os ganhos reais de renda e a expansão do crédito no país.
          A localização também determina a valorização relativa: custam mais imóveis em regiões mais bem atendidas por infraestrutura e serviços públicos. Por isso, os mais valorizados devem pagar mais IPTU, contribuindo para que as demais áreas também sejam mais bem servidas.
          É difícil se opor racionalmente à revisão periódica da planta genérica de valores, que estima o preço dos imóveis. Sem atualizar sua base arrecadatória, o IPTU se torna crescentemente arbitrário: imóveis de mesmo valor de mercado podem ser taxados em montantes bem diferentes.
          Claro, é possível reduzir compensatoriamente as alíquotas, de forma a alterar só a distribuição da arrecadação. Todavia, essa é uma decisão de outra natureza, a de equacionar os recursos às demandas por serviços públicos. Elevar a arrecadação para ampliar e melhorar tais serviços é uma opção política respeitável.
          Para as situações atípicas, há formas de corrigir os problemas, como descontos e isenções. Cláudia De Cesare --assessora em tributação da Prefeitura de Porto Alegre e professora do Lincoln Institute of Land Policy, com quem conversei sobre esta coluna-- destaca que nos EUA o imposto é diferido em alguns casos. Viúvas e aposentados podem optar por não pagar o IPTU local, que se acumula até ser cobrado na transmissão do imóvel, por venda ou herança. Assim, os contribuintes não são excessivamente onerados e a sociedade não é prejudicada.
          Por fim, a forte reação contra ao aumento do IPTU em São Paulo sugere que faz sentido um argumento tipicamente liberal a favor de dar mais peso a tal imposto. Por ser mais facilmente percebido por quem os paga, o IPTU (e demais impostos diretos) faz com que o cidadão fique mais atento para cobrar o bom uso dos recursos pelo poder público.

          Marina teve lições erradas na economia, afirma Lula

          folha de são paulo
          Petista ataca líder da Rede depois de ela reconhecer avanços do governo tucano
          Segundo ex-senadora, o próprio Lula a ensinou sobre manutenção da estabilidade econômica em declaração de 2002
          DE BRASÍLIADE CURITIBADias depois de a ex-senadora Marina Silva indicar que reconhece a contribuição do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) para a estabilidade econômica do país, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou a ex-aliada dizendo que ela precisa parar de aceitar "lições" erradas sobre o tema.
          Marina, que foi ministra do Meio Ambiente no primeiro mandato de Lula e tem criticado a política econômica da presidente Dilma Rousseff, afirmou no início da semana que era preciso dar crédito a FHC e aos tucanos pelas conquistas econômicas do país, "para não fazer injustiça".
          "A Marina entrou no governo junto comigo, em 2003, e ela sabe que o Brasil tem hoje mais estabilidade, em todos os níveis, do que a gente tinha [antes]", disse Lula. "Nós herdamos do FHC um país muito inseguro, não tinha nenhuma estabilidade."
          O ex-presidente, que falou sobre o assunto a jornalistas após participar de evento comemorativo dos dez anos do Bolsa Família, disse que Marina "deve ter esquecido" das dificuldades econômicas que o país enfrentava quando os petistas chegaram ao poder.
          "Tínhamos uma inflação de 12% quando cheguei e tem uma inflação hoje de 5,8%. Então, penso que a Marina precisa não aceitar com facilidade algumas lições que estão lhe dando. Ela precisa acompanhar, com mais gente, o que era o Brasil antes de a gente chegar", acrescentou.
          Pelo mesmo critério de comparação utilizado pelo petista, a inflação era de 916% ao ano antes de FHC assumir a Presidência, em 1995.
          Marina se aliou no início de outubro ao governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), que deseja se candidatar a presidente contra Dilma nas eleições de 2014.
          Segundo Lula, Marina "deve ter se esquecido" que "em 1998 a política cambial fez esse país quebrar três vezes".
          À noite, antes de palestrar em Curitiba, Marina respondeu dizendo que o próprio Lula havia reconhecido as conquistas econômicas do país antes de assumir.
          "Quanto à ideia da manutenção da estabilidade econômica, quem me deu a lição foi o próprio presidente Lula, quando ele assinou a Carta ao Povo Brasileiro'", disse ela, em referência ao documento que o petista lançou ainda como candidato à Presidência, em 2002.
          A carta foi uma sinalização de Lula ao mercado de que, caso vencesse, manteria os fundamentos da política econômica vigente à época, como combate à inflação, responsabilidade fiscal e câmbio flutuante.
          Durante a palestra, a ex-senadora também disse que a estabilidade, apesar de ter começado com FHC, "não é mais do PSDB nem dele".
          "Independente de partido ou governo, essas conquistas têm que ser mantidas e aprofundadas, porque são da sociedade brasileira", afirmou.
          CONTINUIDADE
          Ao criticar a atribuição da "estabilidade econômica" a FHC, Lula disse também que a principal marca de Dilma é a da "continuidade" do "programa de inclusão social e desenvolvimento" que ele começou. Lula afirmou ainda que seu governo e o de Dilma foram os que mais investiram em infraestrutura desde Ernesto Geisel (1974-79).
          Os investimentos federais tiveram uma melhora no segundo mandato de Lula, quando se aproximaram de 3,5% do Produto Interno Bruto, mas ficaram longe dos mais de 10% atingidos sob Geisel e abaixo de patamares atingidos nos governos Figueiredo (1979-85) e Sarney (1985-90).
            LULA
            "[Marina Silva] entrou no governo junto comigo em 2003 e ela sabe que o Brasil tem hoje mais estabilidade em todos os níveis. [...] Penso que Marina precisa não aceitar com facilidade algumas lições que estão lhe dando"
            ontem, ao comentar as declarações da ex-senadora sobre política econômica
            "O Brasil é país pleno e complexo demais para ser governado por forças políticas isoladas"
            terça-feira, durante evento comemorativo dos 25 anos da Constituição, em discurso que foi interpretado como uma referência velada a Marina
            "Economista sabe tudo quando está na oposição. Agora estou ouvindo até uma candidata falar em tripé: temos que consertar o tripé'"
            em 18.out., sobre a defesa de Marina pela volta do tripé macroeconômico
              MARINA SILVA
              "Quanto à ideia da manutenção da estabilidade econômica, quem me deu a lição foi o próprio presidente Lula, quando ele assinou a Carta ao Povo Brasileiro'. [...] Foi um gesto grandioso"
              ontem, referindo-se ao documento lançado por Lula nas eleições de 2002, quando ele sinalizou ao mercado que manteria os fundamentos da política econômica vigente à época
              "Não precisamos tratar as boas conquistas como se fossem apenas de um partido. São conquistas de toda a sociedade brasileira"
              ontem, sobre conquistas recentes do país, como a democracia, a estabilidade econômica e a inclusão social
              "Eu não posso reescrever a história. Não posso dizer que não foi no governo [FHC] que começou [a estabilidade econômica]"
              ontem, ao atribuir méritos à gestão tucana no âmbito econômico
                'Se encherem o saco, volto em 2018', afirma petista
                DE BRASÍLIAEm almoço que participou na tarde de ontem no Senado, o ex-presidente Lula disse aos participantes, em tom de brincadeira, que está fazendo duas horas de exercícios físicos todos os dias para entrar em forma e que, se "encherem o saco", estará de volta como candidato à Presidência da República em 2018.
                Segundo políticos que estiveram no almoço, realizado no gabinete da liderança do PTB na Casa, o petista fez o comentário logo após avaliar que os presidenciáveis Eduardo Campos (PSB), governador de Pernambuco, e Aécio Neves (PSDB), senador pelo PSDB, terão problemas para administrar suas "sombras", a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva e o ex-governador de São Paulo José Serra, respectivamente.
                O ex-presidente teria dito, nesse momento, que Campos "se enrolou de vez" ao aceitar o apoio de Marina, que aparece à sua frente em todas as pesquisas de intenção de voto ao Palácio do Planalto.
                Ao declarar isso, um dos convidados perguntou a Lula se ele não se considerava uma "sombra" da presidente Dilma Rousseff.
                Ele negou, segundo participantes, reafirmando que seu objetivo principal agora é reeleger Dilma. Contudo, emendou a declaração, em tom de brincadeira, afirmando que tem se preparado diariamente para, se lhe "encherem o saco", voltar a se candidatar na eleição de 2018.
                Na solenidade em comemoração aos 10 anos do Bolsa Família, ontem, Lula deu uma rápida e tumultuada declaração à imprensa.
                Após o ato, o ex-presidente disse apenas que está "voltando a ter uma atividade política um pouco mais intensa" nos últimos tempos.
                Um dos objetivos que o petista destacou é o de militar contra a negação da política e dos políticos observada em alguns dos participantes das manifestações que tomaram as ruas do país em junho deste ano.

                  O assunto é o Plano Diretor de São Paulo - Philip Yang e João Whitaker

                  folha de são paulo
                  PHILIP YANG
                  O ASSUNTO É O PLANO DIRETOR DE SÃO PAULO
                  Três poderes e uma cidade
                  Empreendimentos "exclusivos", cercados por muros, tendência do mercado imobiliário, precisam dar lugar a projetos "inclusivos"
                  Em qualquer sociedade democrática moderna, o processo de urbanização resulta da interação de três poderes: o político, o econômico e o social. Uma intervenção urbana, quando realizada unilateralmente por apenas um dos poderes, terá menos condições de viabilidade, resiliência e legitimidade do que os projetos devidamente costurados pelos três.
                  É o equilíbrio dessas forças que determina o sucesso e a sustentabilidade do "fazer cidade". Não será diferente em São Paulo: o tripé de forças será vital para a transformação urbana de que precisamos.
                  O poder econômico, representado pelas grandes construtoras e incorporadoras e pelo mercado de capitais, dará contribuição fundamental se fomentar empreendimentos que promovam tecidos urbanos de uso misto com vastos espaços públicos, que combinem moradia digna, trabalho, comércio e serviços --espaços mais densos e menos dependentes do uso de carros.
                  Empreendimentos "exclusivos", cercados por muros, tendência do mercado imobiliário, precisam dar lugar a projetos "inclusivos", pois a geração de bens coletivos --parques, bulevares, calçadas-- exponenciará a geração do valor econômico de suas construções.
                  O poder social, fortemente empoderado pelas mídias sociais e movimentos de rua, será tanto mais legítimo e construtivo quanto mais for capaz de consolidar agendas positivas e transformar sua voz em vetor de aprofundamento da democracia.
                  Plataformas deverão ser constituídas de forma que as decisões sobre temas em diferentes escalas --de comunidades e bairros, passando por grupos de interesse, até o plano municipal e metropolitano-- possam contar com a participação popular.
                  O poder político, por meio do novo Plano Diretor Estratégico (PDE), tem hoje a prerrogativa de instituir um marco regulatório que poderá corrigir as grandes assimetrias que marcam a (des)organização espacial da cidade: a falta de moradia em zonas em que é grande a oferta de emprego, o subaproveitamento do solo nos entornos dos grandes eixos viários e infraestruturais, a escassez de espaços públicos de qualidade, a carência de zonas de uso misto e de renda mista, a baixa permeabilidade e arborização.
                  A minuta do PDE e o seu debate na Câmara Municipal poderão ensejar a grande convergência entre os três poderes de que São Paulo precisa. Há méritos e inconsistências na proposta, e o texto ainda requer ajustes. Esse processo poderá constituir um pacto em torno dos objetivos que nos levará à reinvenção da cidade, ou a uma "colcha de retalhos" produzida por interesses particularistas que agravará os problemas urbanos.
                  Entre as cidades globais, São Paulo é a que detém o maior estoque de terrenos ociosos ou subutilizados, situados em áreas centrais. Essa condição fundiário-urbana única representa uma chance histórica de promovermos um novo ordenamento espacial para a cidade.
                  O grande pacto de que necessitamos é o que permitirá que avanços concretos como o Casa Paulista, o Arco Tietê, o Parque Tecnológico do Jaguaré e outros projetos de grande escala sejam possíveis: um pacto entre forças sociais, econômicas e políticas e um alinhamento entre União, Estado e município que impulsionem a economia criativa, a atração dos melhores cérebros e a implantação aqui dos empreendimentos mais inovadores, para que a cidade se posicione estrategicamente na terceira revolução industrial em curso no mundo.
                  As cidades projetam no território aquilo que somos como sociedade. Resta-nos encontrar nossa melhor forma de expressão coletiva para a construção da cidade que queremos.

                  JOÃO WHITAKER
                  O ASSUNTO É O PLANO DIRETOR DE SÃO PAULO
                  A utilidade do Plano Diretor
                  Seria necessário priorizar a questão da segregação, prevendo nos corredores adensados estoques de terras públicas para fins sociais
                  Na proposta de Plano Diretor que se discute em São Paulo, focou-se o desequilíbrio entre os lugares de trabalho e de residência e a exagerada centralização econômica no eixo sudoeste. Concentrando ali a infraestrutura e as atividades econômicas, a cidade perpetrou um desequilíbrio estrutural, fazendo com que os que lá trabalham tenham que enfrentar demorados deslocamentos.
                  Quanto mais pobre a pessoa, mais longa e penosa a viagem. Como as políticas públicas sempre priorizaram o automóvel, que corresponde a apenas 30% das viagens diárias, a pendularidade dos deslocamentos associada à falta de uma rede de transporte de massa acabaram por colapsar a cidade.
                  Além disso, um planejamento urbano pouco efetivo e a ausência de regulação da atividade construtiva fizeram com que a cidade crescesse aleatoriamente, no ritmo das oportunidades imobiliárias. Chegou-se ao ponto em que o licenciamento de novos prédios foi simplesmente entregue à corrupção. Com isso, pululam shoppings centers inúteis, desfigura-se o pouco que resta dos bairros assobradados, destroem-se as áreas ambientalmente frágeis e inflama-se uma bolha de valorização.
                  A proposta do plano é concentrar os lançamentos construtivos apenas ao longo dos corredores expressos de ônibus, que devem multiplicar-se e passar a estruturar os deslocamentos na cidade. A oferta de prédios nesses eixos permitiria ter mais gente próxima ao transporte público, aumentando a mobilidade.
                  Se a lógica faz sentido, há obstáculos a superar. O principal é que o problema identificado não é o mais grave. O que realmente perverte a cidade é a própria lógica da urbanização, que no ato mesmo em que se produz, segrega os mais pobres para o mais longe possível, em um apartheid urbano. A implosão da cidade, pelo tensionamento econômico e social decorrente, já começou.
                  Adensar ao longo dos corredores permitindo um alto coeficiente construtivo, sem estoques limitadores, vai gerar forte verticalização nesses eixos, porém sem nenhuma garantia de que, com o aumento de prédios, seja dado lugar também aos mais pobres. Limitar o tamanho dos apartamentos, em um contexto de hipervalorização imobiliária, apenas aumentará o preço do metro quadrado. O que teremos será uma cidade um pouco mais racional e fluida, porém ainda uma cidade só para as classes média e alta.
                  O Plano Diretor proposto é tímido ao enfrentar a lógica do apartheid. Os instrumentos do Estatuto da Cidade continuam sendo empurrados para regulamentação posterior. Ele não rompe paradigmas, pois para isso seria necessário colocar a questão da segregação como prioridade absoluta, prevendo nos corredores adensados estoques de terras públicas para fins sociais.
                  Estamos no equilíbrio tênue entre romper o modelo da exclusão e construir cidades mais humanas ou deslizar de vez para a barbárie urbana, se é que já não o fizemos. Planos Diretores servem muito pouco, pois no Brasil podem ficar engavetados por anos sem maiores consequências, como ocorreu em São Paulo. Está nas mãos dos nossos vereadores a oportunidade de tornar o de São Paulo algo verdadeiramente útil, capaz de acabar com a cidade do apartheid, e mostrando ao Brasil o caminho para evitar a tragédia urbana que aflora.

                  Kenneth Maxwell

                  folha de são paulo
                  Lou Reed
                  Lou Reed morreu de uma doença do fígado, no domingo, em sua casa em Amagansett, Long Island (EUA), aos 71 anos.
                  Ele foi um grande ícone para minha geração. O Velvet Underground foi patrocinado inicialmente por Andy Warhol, e os integrantes da banda costumavam frequentar o Max's Kansas City, uma casa noturna e restaurante na Park Avenue South, 213, em Nova York, ponto de encontro de artistas, poetas, trapaceiros, homossexuais e músicos.
                  Andy Warhol e seu séquito dominavam a sala dos fundos do Max's Kansas City, e David Bowie, Alice Cooper, Iggy Pop e também Lou Reed eram todos parte da cena. Em 1975, a casa foi reaberta e se tornou um dos lugares de nascimento do punk rock. Eu mal conseguia bancar a passagem de ônibus de Princeton a Nova York, quanto mais ir ao Max's Kansas City, mas muitas vezes fiquei assistindo ao movimento, do lado de fora da porta.
                  Lou Reed influenciou profundamente o rock alternativo e underground em todo o mundo. Seus álbuns solo tratavam de temas como amor, experimentação sexual, alienação, vício, contradições agressivas, de "Transformer" (1972), "Berlin" (1973) e "Metal Machine Music" (1975) a "New York" (1989). Rejeitando o pop da Califórnia e o estilo hippie, Reed cantava fora da melodia, em seu ramerrão nova-iorquino.
                  Para mim, seu single mais memorável é "Walk on the Wild Side", que David Bowie ajudou a produzir em Londres e fala dos trapaceiros e dos travestis que cercavam Warhol na Factory. Lou Reed teve um envolvimento romântico com um travesti, Rachel, que inspirou a canção "Coney Island Baby" e cuja foto está na capa de "Walk on the Wild Side".
                  Reed sempre objetou à autoridade. Sofreu tratamento de eletrochoques em um hospital psiquiátrico por duas vezes, quando jovem. Era um rebelde urbano de classe média e amava a literatura de Allen Ginsberg. O que não surpreende, porque Ginsberg também visitou Princeton na época. Lembro-me de ouvi-lo gritar "fuck" a plenos pulmões, cercado de sulistas altos, loiros (e completamente incapazes de compreender). Princeton era então conhecida como "plantation", devido ao grande número de estudantes sulistas na universidade.
                  O último show de Lou Reed em São Paulo aconteceu no Sesc Pinheiros, em novembro de 2010. Ele tocou "Metal Machine Music", que o público não compreendeu; algumas pessoas foram embora. Ficaram confusas. Reed perdeu a palheta da guitarra. Lucas Bertolo, um jovem bonito e brilhante, correu para o palco para encontrá-la. Mas Reed "àquela altura era uma sombra do poeta das ruas que um dia havia sido", escreve Lucas. "Já estava morto."

                    Paula Cesarino Costa

                    folha de são paulo
                    O X roeu a roupa do rei do Rio
                    RIO DE JANEIRO - Eike Batista chegou a ser o brasileiro mais rico, mas era pouco para quem queria ser o homem mais rico do mundo. Mineiro de Governador Valadares, criado na Europa, planejou mudar o Rio e espalhar o X de sua marca pelo Estado.
                    A eterna promessa de despoluição da lagoa Rodrigo de Freitas começou a virar realidade com sua colaboração financeira. O projeto que reelegeu Sérgio Cabral e transformou a segurança pública do Estado, o das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), recebeu cerca de R$ 100 milhões da OGX desde seu início.
                    Colaborou com vários projetos de sucesso, mas enfileirou uma série de outros que podem ser enquadrados como fiascos ou até crimes contra o patrimônio público. Ajudou a bancar a campanha que deu ao Rio o direito de sediar a Olimpíada de 2016, quando emprestou o jatinho que levou governador e prefeito para a Dinamarca, onde foi anunciada a cidade vencedora. Construiu a biografia misturando o público e o privado, seja dando um colar com seu nome à então mulher Luma de Oliveira, seja oferecendo doações de campanha e viagens gratuitas a aliados políticos.
                    Não fez nada à toa nem sem autoridades influentes que o bajulavam. Ganhou isenções fiscais, financiamentos e facilidades dos diferentes níveis de governo.
                    O processo de recuperação judicial de sua petroleira, a OGX, é o maior de uma empresa latino-americana até hoje. Eike deixou escombros. Caminhar pela rua que ladeia o hotel Glória, um dos mais charmosos da cidade, é desolador. Inaugurado em 1922, está deformado pela reforma que prometia torná-lo um hotel maravilhoso. Tomou R$ 190 milhões do BNDES de uma linha criada para hotéis para a Copa de 2014.
                    À Folha, em 2009, disse: "Adoro o conceito americano de você devolver para a sociedade". Chegou a hora.
                    O rei do Rio ruiu. E o rato que roeu a roupa do rei do Rio chama-se... X.

                      Pasquale Cipro Neto

                      folha de são paulo
                      'Amigos em comum'
                      E de onde vem o hábito de dizer "Estava um tanto quanto nervoso" ou "um tanto quanto alterado"?
                      Há algum tempo, escrevi uma coluna para atender a um pedido de ninguém menos do que Mestre Ziraldo, que me sugeriu que abordasse um caso de concordância verbal que causou um certo "impasse" entre ele e alguém de uma editora.
                      Na semana passada, mais uma vez tive a subida honra de receber um telefonema do grande Ziraldo. Depois de trocarmos duas palavras sobre o que ocorreu na Feira de Frankfurt e sobre a internação dele na Alemanha, chegamos ao busílis: Ziraldo me falou da expressão "Somos amigos em comum", que em algum canto da internet aparece como correta. "Isso está errado, não?", perguntou-me ele, já sugerindo o caso como tema de uma coluna.
                      A mestres como Ziraldo obedece-se sem pestanejar. Vamos lá, pois. Como atestam os nossos bons dicionários, a expressão "em comum" significa "conjuntamente por dois ou mais, sem ser de nenhum deles apenas" ("Houaiss"); "de maneira conjunta ou coletiva" ("Aulete").
                      Como se vê, é perfeitamente possível dizer que Ziraldo e eu temos amigos em comum, isto é, Ziraldo tem um ou mais amigos que são meus amigos também, mas não se diz que Ziraldo e eu somos amigos em comum. A frase deve parar em "amigos": "Ziraldo e eu somos amigos".
                      A esta altura, talvez alguém queira saber de onde vem o uso da forma inadequada ("Somos amigos em comum"). Poder-se-ia pensar no processo de contaminação. Explico: em língua, é muito comum o falante se guiar por um processo mais comum do que outro e acabar usando o minoritário como usa o majoritário. Um exemplo concreto: a segunda pessoa do singular ("tu") de oito nos nove tempos verbais simples termina em "s". Tomemos como exemplo as formas do verbo "beijar": "tu beijas, tu beijavas, tu beijaras, tu beijarás, tu beijarias, que tu beijes, se tu beijasses, quando/se tu beijares". A única que não termina em "s" é a do pretérito perfeito ("tu beijaste").
                      Pois bem. O que fazem os falantes quando, por alguma razão, querem empregar uma dessas formas, pouco usuais hoje em dia? Guiam-se pela terminação mais comum, ou seja, lascam um "s", inexistente, e aí surgem formas como "tu te fostes de mim" (como diz Fafá de Belém em uma canção), "abismo que cavastes com teus pés" (como diz Cazuza em "O Mundo é Um Moinho", de Cartola), "tu me abandonastes" etc.
                      Nada de "s" nessas formas, que se referem à segunda pessoa do singular ("tu"). Essas formas existem, mas são da segunda do plural ("vós"): "vós fostes", "vós cavastes", "vós me abandonastes" etc.
                      Voltando à forma "Somos amigos em comum" (inadequada), é provável que o falante se deixe levar pela construção "em comum", que, quando adequada, tem uso mais frequente, em formas como "Temos amigos em comum", "Possuímos negócios em comum", "A decisão foi tomada em comum" etc.
                      Caso semelhante ocorre com a expressão "um tanto", que, quando significa "um pouco", quase sempre recebe a companhia (indevida) da palavra "quanto". É comum ouvirmos ou lermos formas como "Ele estava um tanto quanto nervoso naquele dia" ou "Ela ficou um tanto quanto alterada com a má notícia". Jogue fora o "quanto": "Ele estava um tanto nervoso naquele dia" ou "Ela ficou um tanto alterada com a má notícia".
                      E de onde vem o hábito de dizer "um tanto quanto nervoso" ou "um tanto quanto alterada"? Provavelmente do uso (muito comum) da expressão comparativa "tanto quanto": "Gosto de música tanto quanto de literatura"; "Dorme tanto quanto um urso"; "Sei disso tanto quanto você". É isso.

                      Mônica Bergamo

                      folha de são paulo

                      CGM aciona autoridades em Brasília por causa de esquema de fraude na Prefeitura

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                      ESQUEMA FEDERAL
                      A CGM (Controladoria-Geral do Município), que iniciou as investigações sobre esquema de fraude que pode ter causado um rombo de até R$ 500 milhões na Prefeitura de SP, acionou autoridades de Brasília para compartilhar informações. O órgão detectou que lotéricas podem ter sido usadas pelos acusados para supostamente esconder dinheiro de corrupção.
                      CARTILHA
                      Ao contrário de outros escândalos, em que bilhetes "premiados" justificaram a entrada de alta quantia de dinheiro em declarações de patrimônio, desta vez a utilidade das lotéricas não está clara. Uma das hipóteses é que elas funcionavam como bancos para descontar cheques de propinas. A CGM acionou o Coaf, órgão de inteligência financeira do governo federal, para estudar o que pode ser um novo "modus operandi" de corrupção.
                      FITA ISOLANTE
                      Era visível o esforço do prefeito Fernando Haddad, ontem, para evitar que a operação transbordasse para uma crise ainda maior com Gilberto Kassab. "Não há interface política", afirmava a interlocutores.
                      AUTORIZADA
                      Roberto Carlos ganhará uma biografia fotográfica (e devidamente autorizada) no ano que vem. O livro, que sai em abril pela editora Toriba, terá edição única e com número limitado de exemplares. Será uma coletânea de imagens selecionadas pelo artista com frases retiradas de suas canções.
                      QUEM NÃO CHORA...
                      A top Carol Trentini, que deu à luz o primeiro filho em agosto, armazena o próprio leite para quando se ausenta de casa. Ela tira um litro por dia, em média. "Meu banco está com 7,5 litros", diz. Carol mantém o estoque organizado com data e quantidade. E afirma que se sentiria ofendida se fosse alvo de comentários como o do apresentador Danilo Gentili. Ele fez piada sobre a técnica de enfermagem que produzia até dois litros de leite por dia. "Graças a Deus ela produz tudo isso e pode ajudar outras mães."
                      GRÁFICO
                      A mortalidade por Aids alcançou o menor índice da história no Estado de São Paulo. Foram 2.760 óbitos no ano passado (taxa de 6,6 por 100 mil habitantes), segundo a secretaria estadual de Saúde. Em 1995, primeiro ano da medição, houve 7.739 casos (proporção de 22,9). A pasta também afirma que a sobrevida dos pacientes está maior e com mais qualidade.
                      COTA
                      Dez bancos que criaram programas de inclusão de negros no mercado de trabalho assinam convênio com a Faculdade Zumbi dos Palmares hoje para abrir cem vagas de estágio a alunos da instituição. Bancos como Bradesco, Citibank, HSBC, Itaú Unibanco e Santander vão aderir à iniciativa.
                      SEM UMA, MAS COM TODAS DE UNIFORME PARA VER LAGERFELD
                      Enquanto os primeiros convidados chegavam à Oca, no parque Ibirapuera, para a abertura de "The Little Black Jacket", exposição de fotos com a clássica jaqueta preta da Chanel, a segunda estrela mais esperada da noite, a atriz Uma Thurman, embarcava para os Estados Unidos.

                      Chanel abre exposição com festa

                       Ver em tamanho maior »
                      Zanone Fraissat/Folhapress
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                      A atriz Laura Neiva, embaixadora da grife Chanel no Brasil, compareceu à abertura da exposição "The Little Black Jacket", na Oca, no parque Ibirapuera, na noite de terça (29)
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                      A protagonista de "Kill Bill" encabeçava a lista de VIPs que vieram no entourage de Karl Lagerfeld, o todo-poderoso da grife, autor das fotos e curador da exposição (assinada também por Carine Roitfeld, da "Harper's Bazaar"). Mas não deu as caras.
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                      Hospedada no hotel Fasano, bloqueado pela grife para o evento, Uma se irritou por ter sido acomodada pela Chanel em uma suíte junto com a filha, de 1 ano e meio, e a babá. "Foi um mal-entendido entre a organização e o 'manager' da atriz", disse um membro da equipe. Oficialmente, a estrela alegou torcicolo para se mandar.
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                      "Ele vem?", era a questão na entrada da exposição, por volta das 20h de anteontem. Lagerfeld só apareceu às 22h30. Uma procissão o seguiu até o andar de baixo, onde ficou em um cercadinho. De lá, viu impávido o show dançante da cantora M.I.A..
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                      Antes de se apresentar, a inglesa, que faz sucesso com um pancadão eletrônico, posou no backdrop, mural com o logotipo da marca que era parada quase obrigatória para os famosos. "Quem é essa?", perguntava a dona de casa Sílvia Bonfiglioli.
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                      A atriz Diane Kruger (de "Bastardos Inglórios") passou rapidamente por ali com o namorado, Joshua Jackson, o Pacey de "Dawson's Creek". Uma legião de tops fez o dever de casa -todas com seus looks Chanel, fornecidos pela grife. Fizeram carão para os fotógrafos Isabeli Fontana, Caroline Ribeiro e Carol Trentini, entre outras.
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                      A maioria das convidadas também desfilava modelitos da grife. "All of Chanel", explicava Sílvia. Ela chamava atenção por ser a própria reencarnação de Coco Chanel, em seu look inteiramente da marca: vestido branco, estola preta.
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                      "Quero fazer uma foto lá", apontava a cliente fiel para o mural com o logo da marca. "Tem tanta gente brega lá, eu quero", insistia. "A produção é minha. Fui eu que paguei", brincava o marido, o empresário Márcio Bonfiglioli.
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                      Já a atriz Suzana Pires passou como um relâmpago pelo backdrop. Seu vestido vermelho não era Chanel. "É Azzaro, mas é meu." Laura Neiva seguiu o "dress code". Embaixadora da grife no Brasil e única brasileira nas fotos da exposição, vestia Chanel da cabeça aos pés. "A bolsa é igual à da Cinderela [com hora para devolver]", disse, sobre a peça transparente emprestada pela marca.
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                      Muitas tiraram um Chanel "vintage" do baú. Valeu até "homenagear" a grife com modelito de brechó de Nova York, como fez Thássia Naves, de Uberlândia, "a maior blogueira do Brasil". "Tenho 700 mil seguidores."
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                      Karl, o dono da festa, torceu o nariz para o tal backdrop. Em protesto, os fotógrafos foram embora mais cedo sem um clique do "Kaiser".
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                      Poucas tiveram a sorte de entrar no cercadinho VIP. A apresentadora Ticiana Villas Boas chegou lá. "Recebi hoje o croqui do meu vestido de noiva desenhado pelo Karl", contou. Em seu casamento com o empresário Joesley Batista, do grupo JBS Friboi, o noivo arremessou uma bolsa Chanel aos convidados.
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                      Ticiana e Iara Jereissati, mulher de Carlos Jereissati, dono do shopping Iguatemi, ficaram 20 minutos de papo com as recepcionistas da área VIP até serem aceitas. Havia seis seguranças na entrada. A atriz Bárbara Paz foi barrada, mesmo na companhia de Lilian Pacce, apresentadora do "GNT Fashion", que foi levada sozinha até Lagerfeld.
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                      Sílvia Bonfiglioli não chegou perto de Lagerfeld. E, ao final, deu uma de Uma Thurman: "Ainda bem que quebrei a monotonia do preto e branco da Chanel e coloquei meu brinco de lagartixa", mostrava ela. Karl teria gostado do acessório, ela garante. "E o meu Chanel não tem cheiro de naftalina, viu?"
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                      Lagerfeld visitou a Chanel do JK Iguatemi, mas não apareceu em um jantar, para poucos, no Fasano, na segunda. Foi visto no restaurante japonês de Jun Sakamoto.
                      CURTO-CIRCUITO
                      O bar eStônia, dentro do restaurante Ramona, é inaugurado hoje, às 19h.
                      O desembargador José Renato Nalini lança hoje o livro "Magistratura e Ética: Perspectivas", às 18h30, na Livraria Cultura da Paulista.
                      A Oi abre hoje inscrições para o edital do Programa de Projetos Culturais Incentivado. Até 2/12.
                      com ELIANE TRINDADEJOELMIR TAVARESANA KREPP e MARCELA PAES
                      Mônica Bergamo
                      Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.