quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Cotas raciais podem ser insuficientes no Brasil, diz diretor da Casa Branca

folha de são paulo

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SABINE RIGHETTI
DE SÃO PAULO

O Brasil não pode copiar o modelo de inclusão racial no ensino superior dos Estados Unidos porque os contextos desses países são muito diferentes. A opinião é de Meldon Hollis, diretor da Iniciativa da Casa Branca para Universidades e Faculdades Historicamente Negras.
Nos EUA, os negros criaram suas próprias instituições de ensino porque não podiam frequentar as escolas dos brancos. Hoje há 110 escolas para negros. Depois, vieram as cotas para incluir aqueles que eram uma minoria (10% da população).
No Brasil, não faz sentido incentivar a criação, agora, de escolas negras. E as cotas podem ser insuficientes, diz ele, porque os negros são, aqui, metade da população.
Hollis esteve no Brasil para participar do festival Flink Sampa Afroétnica, da Faculdade Zumbi dos Palmares. Enquanto passou por aqui, ele conversou com a Folha.
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Folha - O governo dos EUA tem a intenção de receber mais jovens negros do ensino superior do Brasil?
Meldon Hollis - Sim. A ideia é estreitar relações e estimular o intercâmbio de jovens afrodescendentes do Brasil às cerca de 110 universidades negras americanas.
A maioria dos estudantes negros brasileiros estudou em escolas públicas, que são mais fracas e tem inglês muito ruim. Então, esses alunos precisam de um suporte adicional. A ideia é enviar esses estudantes no verão [em maio] para que eles passem de dois a três meses estudando inglês e, depois, comecem as aulas regularmente [em setembro, início do ano letivo].
Zé Carlos Barretta/Folhapress
Meldon Hollis, diretor da Iniciativa da Casa Branca para Universidades e Faculdades Historicamente Negras
Meldon Hollis, diretor da Iniciativa da Casa Branca para Universidades e Faculdades Historicamente Negras
O que o senhor acha do modelo de cotas do Brasil?
Não saberemos se as cotas vão funcionar até que passe um tempo mínimo para que seja feita uma avaliação. Sabemos que esse modelo trará algum progresso. Mas não sabemos se trará a solução para o problema de divisão racial.
O Brasil não é os EUA. Nos Estados Unidos, apenas 10% da população é negra, enquanto no Brasil 50% são afrodescendentes.
Não é possível que metade da população fique fora da economia do país. Precisamos ter um progresso imediato no sentido de reduzir a desigualdade racial por aqui.
Uma coisa diferente nos EUA é que as pessoas negras têm suas próprias instituições desenvolvidas por eles próprios porque a educação era totalmente segregada. Essas instituições existem há cerca de 150 anos. Muitos líderes negros saíram dessas escolas, como Martin Luther King. No Brasil, é diferente.
No Brasil, há só uma instituição de ensino superior negra, a Faculdade Zumbi dos Palmares. Por que o modelo não pegou?
A história dos EUA é diferente. As escolas para negros foram criadas para educar os negros que não podiam frequentar as escolas após a abolição. No Brasil, há boas instituições de ensino superior e a sociedade nunca foi segregada. Não foi preciso criar novas instituições.
Como um aluno negro nos EUA escolhe entre uma escola para negros ou uma "regular"?
Hoje, somente 10% da população negra escolhe escolas de negros, assim como há quem escolha escolas católicas ou para judeus.
Minha filha escolheu uma faculdade para negros e meu filho escolheu uma escola regular. Ele não gosta da escola para negros, mas ela se sente muito confortável na instituição. Eu gosto da experiência que os dois estão tendo.
Evento em SP reuniu líderes da cultura negra
DE SÃO PAULO
O festival Flink Sampa Afroétnica, promovido pela Faculdade Zumbi dos Palmares e pelo Memorial da América Latina, ocorreu de 14 a 17 de novembro.
O evento trouxe debates sobre a questão do negro no Brasil e contou com líderes internacionais como Meldon Hollis. Também promoveu um encontro internacional de alunos cotistas.

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