segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Miniteatro do absurdo - Marcelo Ninio

DIÁRIO DE PEQUIM
O MAPA DA CULTURA
Miniteatro do absurdo
Os censores chineses e sua obsessão por sexo
MARCELO NINIO
HÁ TRÊS ANOS, quando esperavam a permissão para abrir as portas, os diretores do teatro experimental Troia decidiram testar os limites do público e da amordaçada cultura chinesa.
Ainda fora do radar da censura, montaram uma produção quase clandestina de "Os Monólogos da Vagina".
O megasucesso da autora norte-americana Eve Ensler, que aborda sem pudores a sexualidade feminina, deveria ter só três apresentações. A reação do público foi tão efusiva que ele foi encenado dez vezes, até chamar a atenção da censura e ser retirado de cartaz.
Situado num novo distrito artístico de Pequim, o Troia é um "miniteatro", como são conhecidos os espaços de vanguarda à margem da cena dominada por peças subsidiadas pelo Estado.
Os miniteatros tem atraído cada vez mais público, principalmente o jovem, sedento por narrativas que rompam com o tradicional.
O interesse atiçou a censura, que nos últimos meses começou a enviar agentes à paisana aos miniteatros.
Responsável por submeter os textos do Troia à censura, Chen Mo Xian, 24, se irrita com o tom paternalista dos comentários que recebe de volta, quase sempre escritos com caneta vermelha.
"Os censores são obcecados por sexo", disse à Folha. "Eles mandam recadinhos com lições de moral".
Chen não se dá por vencido. Muitas vezes envia uma versão comportada para a censura e a verdadeira para o palco. O truque já foi descoberto duas vezes por censores à paisana, que ameaçaram fechar o teatro.
Outra estratégia é mudar a linguagem sem alterar a mensagem. "O público sempre entende", diz.
MODA É CULTURA
A ministra da Cultura, Marta Suplicy, não escondeu seu encanto com uma exibição em Pequim que conta a história da moda chinesa nos últimos 30 anos.
Longe da polêmica que gerou no Brasil ao liberar recursos da Lei Rouanet para estilistas famosos, a ministra estava à vontade para extravasar sua convicção de que moda também é cultura.
A exposição tenta mostrar que o estilo chinês não se limita à imitação de grifes estrangeiras.
Uma das estilistas mais faladas da exibição é Ma Ke, que recebeu um empurrão na mídia local ao ter suas criações usadas pela primeira-dama chinesa, Peng Liyuan, uma famosa cantora.
Peng virou modelo nacional de glamour ao aparecer --com destaque e elegância incomuns para uma primeira-dama chinesa-- ao lado do marido, o presidente Xi Jinping, desde que ele assumiu o cargo, em março.
Mas ousadia tem limite. Peng prefere modelos clássicos, em nada parecidos com a extravagante armadura inspirada nos guerreiros de terracota exibida por Ma Ke na exposição de Pequim.
LUA MINGUANTE
Depois de amanhã os chineses entram em pausa durante uma semana para o feriado de meio de outono, o mais longo de seu calendário ao lado do Festival da Primavera (Ano Novo).
Mas neste ano, a principal tradição da temporada, o ato de presentear com pequenos bolos recheados, foi abatida pela cruzada anticorrupção do governo.
Conhecido como "bolo da lua", a guloseima cabe na palma da mão mas pesa no estômago, por sua massa pesada e o recheio idem.
A tradição, que remonta à dinastia Yuan (1271-1368), virou um símbolo de extravagância, com bolinhos chegando a custar até R$ 2.000 em caixas luxuosas que incluem joias e outros mimos.
Em muitos casos, o bolo da lua é usado como propina --o que explica a ordem do governo de vetar o uso de verbas públicas para a compra do doce.
HOLLYWOOD CHINESA
Uma constelação de astros internacionais do cinema desembarcou na cidade costeira de Qingdao no último fim de semana, a convite do bilionário Wang Jianlin, o homem mais rico da China.
Era o lançamento do mega- estúdio planejado por Wang para competir com Hollywood. Quem é do ramo prevê uma revolução.
"Hollywood chinesa é uma contradição em termos. Ou é Hollywood ou é chinesa", disse à Folha o ator austríaco Christoph Waltz, ganhador de dois Oscars por filmes de Quentin Tarantino.

    Pós-socráticos da bola - Xico Sá

    Amigo torcedor, amigo secador, peço mais uma vez a devida licença para levar uma prosa com o doutor, sim, aqui na terra vão jogando futebol, tem muito samba, muito mimimi e Bruce Springsteen toca Raul no rock'n'roll. A boa nova, porém, caro Magrão, é que a rua mexeu com os jogadores, os pós-socráticos estão chegando juntos com um manifesto contra o calendário de jogos da CBF.
    E que o calendário, doutor, seja apenas o estopim, represente apenas os 20 centavos das passeatas. Mente sã, corpo são. O Bom Senso F.C., como batizaram o movimento, compay, tem o zagueiro Paulo André do teu Corinthians, com quem estivemos em jantares memoráveis antes da tua partida.
    O Alex, aquele 10 que tu tanto admiravas, também está na ponta de lança, o cara pôs o dedo na ferida em entrevista ao "Lance!", faz um tempo, mas tens que saber: "Acho que a CBF não tem uma interferência dentro do futebol tão grande. A CBF cuida apenas da seleção. Quem realmente cuida do futebol é a Globo. A gente sabe que a Globo trabalha na dependência da novela. A gente brinca aqui no Coritiba que os jogos de quarta-feira só rolam depois do último beijo da novela".
    Leio para ti agora também, doutor, o artigo desta semana do teu colunista político predileto, o craque Janio de Freitas, aqui nesta Folha. Tratou da importância do levante dos boleiros. Bem sabes como é difícil jogador de futebol levantar a voz além dos clichês que sopram na latinha dos repórteres. Agora nem os clichês ouvimos a contento: a chefia escolhe quem vai à coletiva no cenário que tem mais propaganda do que macacão da F-1 ou da Indy.
    O bom, doutor, é que o movimento cresce a cada dia, começou com 75 jogadores, os técnicos aderiram, o Tite não teve dúvida, o Muricy cutucou ao seu estilo e até a diretoria de um clube, a do Santos, soltou nota favorável ao agito.
    Não tem como não lembrar de ti nessa hora, Magrão, como falei noite dessas ao prezado amigo Afonsinho, o pioneiro na peleja pelo passe livre, ainda nos anos 1970, em pleno combate às trevas.
    Bem, não vou encher mais teu saco com minhas lenga-lengas terrenas, mas aqui vai uma penca de abraços dos que brindam a ti toda hora, seja na Mercearia São Pedro seja lá no Chico & Alaíde. Sim, o Paulo Cézar Caju, sempre na elegância franco-carioca, Raimundo Fagner e a sua marra de jogador de bola, vestindo uma camisa 10 presenteada pelo Alex do Coritiba.
    Sem se falar, eu nem te conto, nas moças bonitas que enfeitam o drama do relógio na madruga. Ontem cantei para elas, em tua homenagem, o Sérgio Bittencourt: "Naquela mesa está faltando ele/ e a saudade dele/ está doendo em mim".
    @xicosa
    Xico Sá
    Xico Sá, jornalista e escritor, com humor e prosa, faz a coluna para quem "torce". É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Na TV, participa dos programas "Cartão Verde" (Cultura) e "Saia Justa" (GNT). Mantém blog e escreve às sextas, a cada quatro semanas, na versão impressa de "Esporte".

    Ruy Castro

    'Black Bloc do Eu Sozinho'
    RIO DE JANEIRO - Há dias, neste espaço ("A cidade é deles", "Opinião", 30/8), comparei o uniforme dos "black blocs" --coturno, calças, mochila, camiseta e jaqueta pretos-- com a fantasia do Batman. Um e outra só podiam ser usados à noite, eu disse, porque, à luz do sol, eram ridículos. E insinuei que, até há pouco, muitos "black blocs" deviam estar vestidos de Batman e brincando de super-herói no play.
    Na última quarta-feira, um deles, com capa, máscara, luvas, ceroula e botas do Homem-Morcego --talvez compradas na Casa Turuna, na Saara--, intrometeu-se na manifestação dos professores cariocas, que lutam por reivindicações específicas. A presença do fantasiado não condizia com a sisudez do protesto diante da Câmara Municipal.
    Na noite seguinte, na Cinelândia, cem "black blocs" hostilizaram o pessoal de cinema que chegava para a abertura do Festival do Rio, um evento de que a cidade se orgulha. Entre as palavras de ordem, não se sabe por que, o já surrado "Não vai ter Copa!". Aliás, em junho, eles já haviam tentado invadir o Paço Imperial e vandalizar uma exposição de pintura. Com isso, ficamos sabendo que os "black blocs" não gostam de cinema, nem de futebol, nem de artes plásticas.
    Gostam, então, de quê? De rock, sem dúvida, porque o Rock in Rio transcorreu em paz, só tisnado pelos inevitáveis roubos de celulares, comas alcoólicos e diarreias por excesso de batata frita. Devem gostar também de "junk food", porque nenhuma loja do Burger King foi atingida até hoje pelos seus quebra-quebras. E gostam de advogados, sob cujas togas se escondem quando se veem ameaçados.
    Já sem nenhum apoio popular, os "black blocs" limitam-se hoje a si próprios. E o contingente tende a diminuir. Está próximo o dia em que um ou outro ainda sairá individualmente às ruas, no melhor estilo "Black Bloc do Eu Sozinho".

      Gregorio Duvivier

      É menino
      É esperto, finge que é menina pra se aproveitar delas, esses são os piores, também não precisava se vestir de menina
      É menino, a cara do pai, a cara da mãe, esse menino vai ser safado, só quer saber das meninas, só brinca com as meninas, nem parece menino, mas é menino, tem pipi de menino, tem que botar ele no futebol, não é possível que ele odeie futebol, todo menino gosta de futebol, ele ainda vai descobrir que gosta, tem que levar ele pro estádio, ele tem é que passar mais tempo com o pai, isso é falta de pai, ele tem é que sair da aba da mãe, ele tem é que ir pra uma escola só de meninos, isso é falta de porrada, é impressão minha ou desde que ele entrou na escola de meninos ele tá ainda mais menina, acho que ele passa tempo demais com meninos, daí só quer saber de meninos, deve ser isso, é falta de carinho, é falta de mulher, acho que ele tem que passar mais tempo com as meninas, ele tem é que se apaixonar por uma menina, ele acha que gosta de meninos porque ainda não encontrou a menina certa, se ele só se dá bem com meninas deve ser porque gosta tanto de meninas que não consegue sair de perto delas, já saquei qual é a dele, é muito esperto, finge que é menina pra se aproveitar delas, esses são os piores, também não precisava se vestir de menina, acho que ele tá exagerando, coitado dos pais dele, o que é que eu vou falar pros seus avós, acho que o seu avô se mata, pena que ainda não dá pra mandar pro Exército, tem que botar no escoteiro que dali ele vai direto pro Exército, acho que nem o escoteiro vai querer saber dele vestido desse jeito, não acredito que ele quer mudar de nome, isso tem que resolver na terapia, deve ter sido abusado na infância, tá querendo agredir os pais, espera que essa moda passa, hoje em dia a pessoa é obrigada a ser bicha, parece que tem um revolver na cabeça da criançada, é a ditadura gay, tá demorando a passar essa moda, cresceu peito nele ou isso é uma meia, onde foi que os pais erraram, ou quem errou foi a sociedade, a culpa é da televisão, a culpa é da escola, a culpa é de algum tio que deve ter abusado dele, e não é que ele dá uma mulher bonita, nem parece homem, já mandei meu marido sair de perto dele, desculpa, eu me recuso a chamar ele de ela, eu vi ele crescer, ele tem um negócio debaixo da saia, ele é menino, ele sempre vai ser menino, essas coisas a gente não muda, essas coisas a gente não muda, essas coisas não mudam a gente, essas coisas a gente é, a gente é o que a gente for, é menina.

        Luiz Felipe Pondé

        Uma mulher linda
        A pergunta que mata de medo as mulheres é: afinal, o que quer o homem numa mulher?
        Recentemente participei de um debate sobre a trilogia "Cinquenta Tons".
        Muitas críticas: típico best-seller que identifica um drama universal (o amor) e propõe uma solução "easy" (seja sadomasô light e o casamento virá); a srta. Steele (a heroína) não está a altura de Lady Chatterley (de D.H. Lawrence) nem das irmãs Justine e Juliette (do Marquês de Sade) nem da personagem de "História de O" (de Anne Desclos, sob o pseudônimo Pauline Réage), porque a srta. Steele se vende por um MacBook Pro, enquanto as outras são para valer. Tudo verdade.
        O maior pecado de "Cinquenta Tons" é que ele vende uma fantasia: o homem ideal. Christian Grey é rico, bonito, inteligente, viril, experiente. Mas o fato é que as mulheres desejam mesmo homens fortes, viris, sensíveis até a página três, ricos não só de grana. Enfim, "Cinquenta Tons" vende porque fala para todas as mulheres, bobas, ignorantes, cultas ou críticas. Mas, como virou moda mentir, ninguém confessa.
        Dias depois do debate, revi um filme idiota americano (como "Cinquenta Tons"), em que um milionário fodão (interpretado por Richard Gere) contrata uma garota de programa (Julia Roberts, ah! Se todas fossem iguais a você, Julia, que maravilha viver...) e acabam se apaixonando. Claro, o filme é "Uma Linda Mulher". A fórmula clara da gata borralheira do sexo que vira a esposa Cinderela.
        Mas o longa é muito mais do que isso. Diante da crítica histérica de que é mais um filme machista (que sono...), vale notar que ele faz a pergunta que mata de medo as mulheres: afinal, o que quer o homem numa mulher?
        Dirão as apressadas que o homem quer que a mulher traga uma cerveja e venha pelada. Errado: melhor de calcinha e salto alto. Seria a superficialidade masculina o último bastião da ideologia "dominante"? Bastião este que agrada a todas as mulheres porque as acalma: os homens só querem uma bunda!
        O filme toca num tema atávico que deixa mesmo as meninas "críticas" de cabelo em pé: seria a garota de programa a mulher ideal?
        O personagem de Gere é fodão. Ele sabe o que os fodões sabem: o mundo é repetitivo, e as pessoas são previsíveis. Querem dinheiro, reconhecimento e "serviços", e fazem qualquer coisa para conseguir, embora neguem.
        Se, no fundo, todos estão à venda por "um programa" de sucesso, melhor sair com alguém mais honesto: a garota de programa é a mulher menos cara do mundo. Ela "só" quer dinheiro, e isso às vezes é uma bênção. Ela é a mulher ideal porque é a única diante da qual o homem relaxa.
        Afinal, o que quer o homem numa mulher? Num dado momento do filme, Gere diz à bela Roberts: "As pessoas são previsíveis, mas você me surpreendeu" (não vou contar detalhes).
        Não devemos menosprezar essa fala e o que acontece depois, o apaixonar-se pela garota de programa. Gere sabe o que diz: as pessoas são mesmo previsíveis. Mas hoje a moda é dizer que são todas "únicas".
        La Roberts encanta o fodão porque ela não é óbvia, e a mulher óbvia só quer fodões.
        Graças a ela, ele rompe o ciclo da desconfiança causada pela obviedade das mulheres, e graças a ele, ela se cansa de ser puta, porque a puta não é uma mulher de verdade.
        Os homens sentem que as mulheres querem deles apenas sucesso (em todos os sentidos). Mas hoje virou moda dizer que isso não é verdade. Ficou pior porque continua sendo verdade, mas, quando o cara sente isso, ele deve se sentir um machista porque sabe disso.
        O homem quer uma mulher para quem ele não tenha que ser o sr. Grey, mas a mulher não perdoa um homem fraco. A garota de programa perdoa porque "só" quer dinheiro.
        A fraqueza masculina aniquila o desejo da mulher. Mas, como essa mulher ideal não existe (assim como o sr. Grey), o ideal acaba ficando colado ao corpo irreal da namorada "paga".
        Mesmo sabendo que sr. Grey (um fodão) não existe, as mulheres não suportam homens que não se pareçam com ele, e esta é a verdade suprema de "Cinquenta Tons".
        Por fim: uma amiga minha, psicóloga, me disse que muitos dos seus pacientes vêm ao consultório falar de como suas mães (fálicas) destroem seus pais (fracos).
        São essas mulheres fálicas, segundo ela, que à noite gemem de solidão sonhando com o sr. Grey.
        Óbvio?