folha de são paulo
DO "NEW YORK TIMES"
Para Donald E. Canfield, existe algo incrível a cada vez que respiramos. "As pessoas consideram o oxigênio um fato consumado porque ele está aí e o respiramos o tempo todo", disse o doutor Canfield, geoquímico na Universidade do Sul da Dinamarca. "Mas nós temos o único planeta conhecido que possui oxigênio."
O que é ainda mais surpreendente é que a Terra começou com uma atmosfera sem oxigênio. Passaram-se bilhões de anos antes que houvesse oxigênio suficiente para que animais como nós pudessem viver.
Os cientistas continuam fazendo descobertas. Recentemente, o doutor Canfield e seus colegas publicaram alguns estudos que forneceram pistas significativas sobre alguns dos capítulos mais importantes da história do oxigênio na Terra. Eles estão descobrindo que nossa atmosfera é o resultado de uma complexa dança entre geologia e biologia.
Para estudar a antiga atmosfera, os geoquímicos examinam as "impressões digitais químicas" deixadas nas rochas. Algumas contêm moléculas que só poderiam ter se formado na presença de oxigênio.
Quando eles examinam as rochas mais antigas da Terra, não encontram vestígios de oxigênio na atmosfera. Suas pesquisas indicam que o ar primordial da Terra era formado principalmente por dióxido de carbono, metano e nitrogênio. Os raios de sol criavam um pouco de oxigênio livre, ao separá-lo do dióxido de carbono e outras moléculas. Mas o oxigênio desaparecia logo depois de se formar.
Isso porque o oxigênio é um elemento extremamente amigável, formando ligações com um amplo leque de moléculas. Ele se ligava ao ferro nas rochas, por exemplo, criando ferrugem. Em outras palavras, nosso planeta foi um gigantesco vácuo de oxigênio em seus primeiros anos.
Isso mudou há cerca de 3 bilhões de anos. Na edição de 26 de setembro da revista "Nature", o doutor Canfield e seus colegas relataram impressões digitais de oxigênio nas rochas daquele período. Eles estimam que a atmosfera tinha apenas 0,03% dos níveis de oxigênio atuais.
Mas isso marcou uma enorme mudança na química terrestre.
A luz do sol por si só não poderia ter colocado tanto oxigênio na atmosfera.
Somente a vida poderia.
Alguns micróbios tinham desenvolvido a capacidade de realizar a fotossíntese. Flutuando na superfície do oceano, eles usavam a energia solar para crescer com dióxido de carbono e água e liberavam oxigênio como dejeto. Grande parte do oxigênio liberado por esses micróbios fotossintéticos era sugada da atmosfera pelo vácuo da Terra.
Mas uma pequena quantidade de oxigênio permanecia para trás porque parte da matéria orgânica dos micróbios mortos afundava da superfície do oceano para o leito, onde o oxigênio não podia reagir com ele.
O oxigênio permanecia no ar.
O oxigênio continuou bastante escasso durante algumas centenas de milhões de anos.
Mas, durante esse tempo, o vácuo da Terra enfraqueceu. O planeta esfriava e, por isso, os vulcões expeliam menos hidrogênio na atmosfera para sugar oxigênio.
Em seu novo livro, "Oxygen: A Four Billion Year History" [Oxigênio: uma história de quatro bilhões de anos], o doutor Canfield sugere que esse vácuo fraco promoveu um súbito aumento no oxigênio que os geoquímicos veem nas rochas de cerca de 2,3 bilhões de anos atrás. "Agora chegamos ao ponto em que a Terra se acalmou o suficiente para que o equilíbrio se incline a favor do oxigênio."
Em uma reportagem recente em "The Proceedings of the National Academies of Sciences", Canfield disse que havia tanto oxigênio na atmosfera que ele penetrou 300 metros no oceano. Segundo ele, o oxigênio pode ter sido tão abundante quanto hoje, pelo menos durante algum tempo.
Mas esse processo gerou seu próprio fim. Os micróbios desceram até o leito marinho, criando rochas ricas em carbono. Mais tarde, as rochas foram erguidas para formar terra seca, onde puderam reagir com o oxigênio, extraindo-o da atmosfera. A vida e a Terra continuaram brincando com o "botão" de oxigênio nos últimos 2 bilhões de anos.
Conforme o doutor Canfield conhece melhor a história tumultuada da Terra, ele tem menos certezas sobre seu futuro. "Não estou certo de que temos uma boa previsão", disse. "Isso depende muito dos caprichos da geografia."