terça-feira, 8 de outubro de 2013

Mirian Goldenberg

Velho está na moda
O mercado é voltado para as jovens magras e exclui quem não se enquadra no padrão
Muitas mulheres de mais de 40 anos dizem que são ignoradas pelo mercado. Além de se sentirem invisíveis, pois não são mais olhadas ou elogiadas como quando eram mais jovens, dizem que não encontram roupas adequadas para a idade.
Uma nutricionista de 47 anos contou: "Tenho um corpo bonito. Fui comprar um jeans de uma marca famosa e a vendedora me olhou dos pés à cabeça como se dissesse: Não temos roupas para velhas. Não queremos nossa etiqueta desfilando na bunda de uma velha ridícula e sem noção'. Saí arrasada".
Outras querem se diferenciar das adolescentes, mas não querem se vestir como velhas. Uma professora de 41 anos disse: "Não posso usar os mesmos jeans das minhas alunas. Tento encontrar um que não seja colado e de cintura baixa, mas é impossível. Não quero parecer uma garotinha, mas não quero parecer uma velha. As opções para a minha idade são horrorosas".
A dúvida é como se adequar à idade sem abrir mão de roupas bonitas. O mercado está voltado para as jovens e magras e exclui aquelas que não se enquadram no padrão.
Uma arquiteta de 56 anos afirmou: "Sempre usei biquíni e minissaia. Agora não posso mais? Adorei quando a Betty Faria, depois de ter sido chamada de velha baranga' por usar biquíni aos 72, disse: Querem que eu vá à praia de burca, que me envergonhe de ter envelhecido?'".
Em um congresso internacional de moda, afirmei que o mercado reproduz as imagens dos velhos do século passado e não vê os "novos velhos" que têm projeto de vida, saúde, amor, felicidade, liberdade e beleza. Convoquei o público a mudar essas representações e participar da campanha que lancei aqui com o artigo "Velho é lindo".
De biquíni ou maiô, minissaia ou jeans, somos mais livres para inventar nossa "bela velhice". E para mostrar aos velhos de hoje e de amanhã que "velho é lindo!" e que "velho está na moda!".
***
No dia 16, às 19h, estarei na Fnac de Pinheiros para um bate-papo sobre o livro "A Bela Velhice" promovido pela Folha. Será uma alegria conversar com vocês lá!

    Rosely Sayão

    Adolescência: até quando?
    Faz tempo que constatamos que a adolescência tem começado cada vez mais cedo e acabado mais tarde
    A adolescência sempre foi um conceito bem complexo de se abordar. Nem mesmo os estudiosos conseguiram chegar a um conceito único a respeito dessa fase do desenvolvimento. Quando ela começa e quando termina? Quais suas características principais? Tem relação direta com a idade e/ou com fenômenos biológicos ou a estes devemos acrescentar, necessariamente, os sociológicos e os psicológicos?
    Muitos estudos foram realizados, mas estes nunca chegaram a ter unanimidade entre si. Alguns afirmaram que sim, essa é uma fase coincidente com a puberdade, enquanto outros que é um fenômeno exclusivamente sociocultural; tivemos inclusive autores que consideraram a adolescência uma síndrome --ou seja, um conjunto de sintomas-- normal. Por mais que pareça estranha essa última ideia, muitos estudos foram realizados nesse sentido, principalmente pela psicologia.
    Mesmo com tanta complexidade e divergências, alguns elementos eram tidos como referências por quem, de algum modo, se dedicava a trabalhar com os mais novos. A adolescência era considerada um período que compreendia a busca de identidade e o autoconhecimento; que era marcado pela busca de pares, o que provocava o distanciamento dos pais; e era nesse período que ocorria a explosão da sexualidade em sua forma adulta.
    Algumas outras ideias, como a mudança da noção do tempo --que passava a ser conjugado no passado, presente e no futuro-- e a busca de segurança e de estabilidade --emocional, afetiva, pessoal, profissional, por exemplo-- juntavam-se às primeiras e formavam um conceito que, na prática, caracterizava o comportamento dos adolescentes.
    Pois bem: esse conceito, já tão complexo, passou a ficar cada vez mais irreconhecível a partir do final do século 20. É que o mundo adulto foi invadido pela busca da felicidade e da juventude, entre outras coisas, o que transformou muito o comportamento de quem já tinha maturidade.
    Dessa maneira, características antes creditadas apenas a adolescentes passaram a fazer parte da vida adulta também. A impulsividade, o imediatismo, a busca do prazer e da liberdade e o comportamento de risco, por exemplo, passaram a ser fatos corriqueiros na vida dos mais velhos.
    Ao mesmo tempo, as crianças passaram a perder a infância cada vez mais cedo e seus interesses, seu comportamento, suas vestimentas, sua vida social e a linguagem usada ficaram cada vez mais parecidas com as dos adolescentes.
    Por isso, a notícia que saiu dias atrás que, agora, a adolescência deve ser considerada um período que vai até os 25 anos não é nenhuma novidade. Já faz tempo que constatamos que a adolescência começa cada vez mais cedo e termina cada vez mais tarde. Quando termina!
    Por isso, não deve estar longe o tempo em que a adolescência vai se tornar um conceito obsoleto. Vai deixar de ser um período da vida para ser um estilo de vida. O nosso.
    Se isso é bom ou não, só saberemos mais tarde. Pagamos para ver: essa é uma expressão que se aplica muito bem a essa questão. Entretanto, precisamos considerar a possibilidade de a maior parcela dessa conta poder ser debitada aos adolescentes de fato. Pelo menos, como eram considerados antes de todas essas mudanças.
    É que eles podem olhar para nós e perceber que, depois de chegarmos à vida adulta, decidimos retornar; e podem até concluir que nem vale a pena experimentar essa tal vida adulta, não é?

    Pedro Soares

    Inclusão digital (e desigual)
    RIO DE JANEIRO - O acesso ao celular no Brasil é uma fotografia idêntica à da renda. Quanto menor a remuneração numa região, mais baixa é a penetração do telefone móvel. O mesmo retrato se repete quando o tema é o uso da internet.
    A partir dessa premissa, extraída dos dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2012, pode-se vislumbrar que a inclusão digital, crescente ano após ano, caminha para replicar um padrão histórico de desigualdade no país.
    No Nordeste, 64,6% das pessoas possuem celular. No rico Sudeste, 77,1% dispõem do aparelho. A pesquisa releva ainda o que intuitivamente já sabíamos: os mais jovens são mais conectados à rede.
    O advento crescente dos smartphones junta as duas coisas: internet e telefonia móvel. A ideia de que na era do conhecimento haverá um computador por pessoa possivelmente se materializará com os telefones inteligentes. Mais caros, esses aparelhos são menos acessíveis às regiões e faixas de renda mais pobres. Ainda mais num país que pratica a mais alta tarifa de celular do mundo, segundo levantamento de entidade da ONU.
    No anúncio da fusão da Oi com a Portugal Telecom, na semana passada, o presidente da nova companhia (que nasce carioca), Zeinal Bava, prometeu custos menores, a serem repassados nas tarifas. O compromisso parece distante ao se desenhar uma possível venda da TIM para a Vivo, limando uma concorrente.
    Sob o pretexto de criar uma "supertele" nacional, o governo Lula mudou as regras e estimulou a compra da Brasil Telecom pela Oi, em 2008. O negócio, que tinha estrangeiros no páreo, só saiu graças ao gordo financiamento do BNDES. O projeto naufragou e o mercado perdeu um competidor.
    Ao fim e ao cabo, não importa a nacionalidade da prestadora de serviços. Para o consumidor, o relevante é a maior concorrência, que abre espaço para tarifas mais baixas.

      Filósofo Vladimir Safatle entra no PSOL e pode ser candidato ao governo de SP

      Democracia na USP - Vladimir Safatle
      folha de são paulo

      Na última semana, a Universidade de São Paulo foi objeto de várias notícias, desde sua queda brusca em um ranking internacional de avaliação até a invasão da reitoria por alunos. Diante dessas situações, nosso reitor achou por bem estabelecer um amálgama perguntando, em entrevista concedida a esta Folha: "Há alguma universidade muito bem classificada nos rankings mundiais em que aconteçam tomadas violentas de espaço, como as que voltaram a ocorrer na USP? Obviamente que não".
      Sim, ele tem razão. Por isso, nunca entendi por que nossos reitores costumam chamar policiais militares munidos de metralhadora e bomba de gás lacrimogêneo para mediar conflito com estudantes. Também sempre me perguntei se não seria terrível para nossa reputação ter imagens nos jornais internacionais de policiais dispersando manifestações estudantis com balas de borracha.
      Creio que a reputação ficaria ainda pior se alguém se perguntasse por que os estudantes se manifestam periodicamente: por uma estrutura acadêmica mais democrática. Pois há uma relação entre democracia e qualidade acadêmica.
      Uma instituição mais democrática ouve sistematicamente seus professores e alunos, permitindo que as decisões fiquem mais próximas das reais necessidades de pesquisa e ensino. A luta por democracia na universidade não é estratégia para criar uma instituição mais corporativa, como alguns gostam de acreditar. É defesa de uma instituição mais racional em suas decisões e mais representativa das condições de trabalho que permitam o desenvolvimento de seus corpos docente e discente.
      Por exemplo, na sacrossanta questão da internacionalização da USP, há prioridades que mereceriam um debate com nossos pesquisadores. A universidade gasta prioritariamente na concessão de bolsas para alunos de graduação, além de ter dispensado grande energia na abertura de escritórios em Londres, Boston e Cingapura, que ainda não demonstraram sua real função.
      Não são poucos os pesquisadores que acham mais racional compreender que a USP chamará alunos estrangeiros quando suas pesquisas e pesquisadores forem melhor conhecidos em outros países. Isso exigiria priorizar não a graduação, mas a pós-graduação, pois é lá que está a pesquisa. Por outro lado, se a citação de artigos é uma questão que pesa de maneira decisiva nos rankings internacionais, melhor seria priorizar linhas de financiamento para a tradução de artigos acadêmicos de nossos professores, como várias universidades não anglófonas fizeram.
      Em uma instituição mais democrática, a decisão sobre questões dessa natureza seria tomada por quem realmente trabalha e vivencia o "chão de fábrica" da academia.
        FILIAÇÃO
        Filósofo Vladimir Safatle entra no PSOL e pode ser candidato ao governo de SP
        DE SÃO PAULO - O filósofo e professor da USP Vladimir Safatle se filiou ao PSOL e é apontado como potencial candidato ao governo de São Paulo em 2014. "Tudo isso é muito prematuro", disse Safatle, que é colunista da Folha.
        Ele negou a possibilidade de se candidatar a deputado e disse que conversa com o PSOL há cerca de um ano.
        Em 2012, Safatle coordenou o programa da área da Cultura do então candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad. Com a vitória do petista, especulou-se que o filósofo poderia assumir a pasta, mas o ex-ministro Juca Ferreira acabou nomeado secretário.

        Janio de Freitas

        Presente e futuro
        A história das eleições já legou exemplos suficientes de que acordos são passí-veis de desmanchar-se no ar
        Visão política é a capacidade de olhar para o momento presente e, em vez dele, ver o futuro.
        Tudo indica que Marina Silva e Eduardo Campos voltaram os olhos para o futuro e viram apenas um momento do presente.
        Em um só lance, os dois plantaram fartos problemas para sua adaptação mútua, em meio a igual dificuldade de seus grupos. Políticos costumam ter flexibilidade circense, mas não é o caso, por certo. Bem ao contrário.
        Nem mesmo o pessoal do PSB cita o nome do partido por inteiro, há muito tempo: fazê-lo exigiria mencionar a palavra "Socialista". O que se sabe das ideias do próprio Eduardo Campos não é muito mais do que se sabe de Marina Silva. Em relação aos dois sabe-se, porém, o suficiente para perceber a inconciliação quase completa. Não cabe mais dizer que o PSB seja partido "de esquerda", nem se pode dizer isso de Eduardo Campos. Mas conservadores, o partido e seu presidente não são, nem podem sê-lo, por exigência da ambição eleitoral que expõem.
        Marina Silva tem mais de esfinge que de política (sem alusão a certa semelhança de traços básicos). Se não há clareza de como a ex-candidata à Presidência pensa o país e seus problemas, ao menos se dispõe de uma percepção básica, na medida em que uma dedicação religiosa intensa exprime uma concepção bastante mais ampla. E ao deixar o catolicismo para tornar-se evangélica dedicada, Marina Silva integrou-se a uma corrente de notório conservadorismo. Demonstrado, inclusive, em extensão política, nas posições e atos de sua bancada no Congresso, com frequentes referências nos meios de comunicação.
        Imaginar que tamanha diferença, digamos, conceitual caminhe para a conciliação, em nome de conveniências políticas imediatistas, exige esquecer o início da questão: as conveniências políticas dos dois são as mesmas e concorrentes entre si. Sustentadas, de uma parte e de outra, em graus equivalentes de pretensão e mal contido autoritarismo.
        Com este pano de fundo, veremos o que se passará diante das posições de ambos invertidas na chapa do PSB em comparação com as pesquisas. Os seguidores de Marina nem esperam por próximas pesquisas, já entregues à campanha pela cabeça da chapa. As simpatias dos dois grupos vão mostrar o que são, de fato, quando se derem as verdadeiras discussões sobre liderança, temas de campanha, respostas às cobranças do eleitorado, a batalha.
        A história das eleições, mesmo a recente, já legou exemplos suficientes de que acordos, garantias, alianças e comunhões são passíveis de também desmanchar-se no ar. É só bater um ventinho mais conveniente para um dos lados. Eduardo Campos sabe disso, o que significa que o festejado entendimento com Marina representa, para ele, múltiplos riscos. Entre os quais, até o desgaste político decorrente da simples dificuldade de convivência, descoberta agora por vários (ex-)entusiastas da Rede Sustentabilidade.
        Marina Silva, ao passar de uma posição de liderança para a duvidosa inserção em partido alheio e com líder-candidato definido, na melhor hipótese fez uma jogada no escuro sob a luz do dia. Ao menos terá tempo para sair pelo país explicando ao seu eleitorado o que quer dizer sustentabilidade, um nome de partido à altura da incompetência com que foi tratado por seus sustentadores.

          Minissérie tenta captar o 'sertão real'

          'Amores Roubados', que a Globo exibe em 2014, traz adaptação de folhetim pernambucano clássico para dias de hoje
          Emissora busca atualização para fidelizar audiência fora do eixo Rio-São Paulo, analisa especialista
          ISABELLE MOREIRA LIMADE PAULO AFONSO (BA)O sertão brasileiro, velho conhecido da Rede Globo, volta à TV. Desta vez, no entanto, sai de cena o agreste icônico de Lampião e Padre Cícero e entra a terra fértil cortada pelo rio São Francisco, produtora de vinho e de frutas para exportação.
          Este é o cenário de "Amores Roubados", série de dez capítulos que a emissora exibe em janeiro de 2014 com a promessa de sotaque mais fidedigno e imagem de cinema.
          A obra é uma adaptação de "A Emparedada da Rua Nova", de Carneiro Vilela, folhetim publicado semanalmente entre 1909 e 1912 pelo "Jornal Pequeno", do Recife (PE). Trata de um Don Juan que entra em apuros ao se envolver com a filha de um homem rico e poderoso da capital. Na época da publicação, a trama, que gira em torno de paixão e vingança, virou febre com status de lenda urbana.
          Agora, foi teletransportada para a área rural e para o século 21. Segundo os idealizadores, a ideia é levar à tela um sertão contemporâneo e mais próximo da "vida real" do Nordeste, ainda que a história original tenha sido escrita há mais de cem anos.
          A professora de comunicação da Universidade Federal da Bahia, Maria Carmem Jacob de Souza, afirma gostar da ideia de ver um sertão mais atual na tela e diz achar importante que a produção de teledramaturgia "saia do eixo rotineiro" e explore diferentes regiões do país.
          "Na verdade, eles podem é desmontar estereótipos e até tornar mais rica a impressão sobre o Nordeste."
          Segundo Julio Wainer, professor de jornalismo e diretor da TV PUC, a escolha da Globo reflete uma necessidade de modernização e de fidelização de um público. "O cavalo não existe mais, existe a moto há mais de dez anos. A emissora é obrigada a se atualizar para não ficar de fora da audiência no Nordeste."
          Para "agarrar" essa audiência, a Globo repetiu o triunvirato responsável por "O Canto da Sereia" (2013): George Moura ("Linha de Passe", 2008) no roteiro (sob a supervisão de Maria Adelaide Amaral), José Luiz Villamarim ("Avenida Brasil") na direção-geral e Walter Carvalho, uma grife do cinema com mais de 80 títulos no currículo, na direção de fotografia e câmera --algo incomum na TV, onde a câmera é operada por outros profissionais.
          "O olhar do Walter vai criar esse sertão contemporâneo, onde tem motoboy e Land Rover, mas tem também uma moral arcaica", diz Moura, que há 17 anos sonhava em roteirizar o folhetim.
          Para Carvalho, a maior marca da minissérie é o sol. "Eu acho que o sertão tem dois sóis, um que queima e outro que aterrissa, chega muito perto de você. Tudo o que eu penso em termos de imagem tem que ir por aí."
          Esse sol "inclemente e cáustico" que Carvalho cita foi também um dos grandes desafios das gravações.
          Folha acompanhou o antepenúltimo dia de trabalho da equipe na última semana no Raso da Catarina, área mais seca de todo o Estado da Bahia, célebre por ter servido de abrigo a Lampião quando fugia da polícia, e presenciou certos cuidados tomados pela equipe de produção.
          As gravações na região começam cedo, às 6h, quando as temperaturas ainda não são insuportáveis. Toda a equipe --exceto os atores --usa roupas com proteção contra raios UV, chapéus e protetor solar, e se aglomera embaixo de tendas. Além disso, há dois funcionários que têm como função primordial distribuir água, isotônicos e melancia frequentemente.
          Villamarim, o diretor, afirma que a saúde da equipe foi uma preocupação constante, mas que o maior desafio é justamente o seu maior objetivo: "Dar um frescor [à adaptação] e mostrar realisticamente o que é o sertão que a gente vê hoje. Eu não estou inventando sertão nenhum".
            ANÁLISE
            Grito da emparedada é ouvido até os dias de hoje no Recife
            XICO SÁCOLUNISTA DA FOLHAO caso se deu no final do século 19, mas até hoje, quem passa no casarão de número 200 da rua Nova, no centro do Recife, ouve os gritos de Clotilde, a moça emparedada viva pelo desalmado pai.
            A filha da alta sociedade pernambucana estava grávida de um pé-rapado, um desconhecido e misterioso plebeu, fato inadmissível para a nobre família.
            Não há mais como dizer se a história é verdadeira ou não, debate que se arrasta há um século. Vale a lenda, publicada inicialmente em forma de folhetim no "Jornal Pequeno", entre 1909 e 1912, que daria depois no romance "A Emparedada da Rua Nova", obra de Carneiro Vilela (1846-1913).
            Por muito tempo artigo raro nos sebos, o livro ganhou em setembro a sua quinta edição pela Cepe (Companhia Editora de Pernambuco).
            Em 2010, foi adaptado no curta-metragem homônimo de Marlom Meirelles e neste ano mereceu versão teatral com o título "O Amor de Clotilde por um Certo Leandro Dantas", da Trupe Ensaia Aqui e Acolá.
            O grito que assombra a rua Nova tem um certo eco do conto "O Gato Preto", de Edgar Allan Poe (1809-1849). A prática do emparedamento, porém, como alerta o narrador de Poe, é coisa que vem de relatos ainda da Idade Média.
            Do folhetim de Vilela à lenda da "Perna Cabeluda", misterioso membro que aterroriza a capital desde os anos 1970, o Recife cultiva a fama da cidade brasileira mais mal-assombrada.
            A história da perna nasceu a partir de um programa de rádio feito pelo escritor Raimundo Carrero.
            Em "Assombrações do Recife Velho", Gilberto Freyre também recolheu histórias deste imaginário.
            Atualmente, o projeto "O Recife Assombrado", dos jornalistas André Balaio e Roberto Beltrão, reúne, em site e livros, uma farta antologia do gênero.
              Elenco nordestino combate sotaque global
              Protagonistas da minissérie "Amores Roubados", no entanto, são interpretados por conhecidos do horário nobre
              Acadêmico afirma que a escolha dos atores está relacionada à qualidade atual do cinema feito em Pernambuco
              DA ENVIADA A PAULO AFONSO (BA)Outra arma usada pela TV Globo para conseguir mostrar o "sertão real" na minissérie "Amores Roubados", que exibe em janeiro, foi o sotaque.
              Embora os papéis principais da minissérie sejam interpretados por velhos conhecidos do horário nobre --Murilo Benício, Patrícia Pillar, Ísis Valverde e Cauã Reymond--, foram escalados atores nordestinos que vivem fora do eixo Rio-São Paulo para dar mais credibilidade à pronúncia.
              Entre eles, os pernambucanos Irandhir Santos ("O Som ao Redor") e Jesuíta Barbosa ("Tatuagem") e o potiguar Cesar Ferrario ("Cheias de Charme").
              "Em um primeiro momento, a gente se sente ridículo. Até você realmente começar a se sentir bem falando, você passa por uma estrada muito dolorida", afirma Benício, que se preparou antes das gravações com fonoaudióloga e chegou a pedir ajuda a Irandhir durante o trabalho.
              Para Julio Wainer, diretor da TV PUC, a escolha do elenco faz sentido. "Hoje, o melhor cinema no Brasil está em Pernambuco e as novelas são feitas com atores do Sudeste. É uma tentativa de se atualizar sem perder a referência do imaginário e ainda buscar novos mananciais de atores. É um jogo de caras mais conhecidas e de caras novas."
              Cauã Reymond, uma das caras mais conhecida e o Don Juan da minissérie, experimenta o sotaque nordestino pela segunda vez --a primeira havia sido em "Cordel Encantado" (2011). Ele diz ter ficado feliz em trabalhar com George Moura, autor que "sabe falar bem do universo masculino, que tem uma visão masculina sobre o homem".
              "Na dramaturgia, hoje, os autores escrevem muito para mulher. Isso não é uma crítica, mas uma tendência. Mas o George escreve homens de forma ativa, com personalidade dominante, forte. O Jayme [personagem de Benício] e o Leandro [o de Reymond] são machos alfa", diz.
              Reymond antagonizará com Benício, que faz o homem mais poderoso de Sertão, município fictício de Pernambuco escolhida para mostrar o "sertão contemporâneo".
              A cidade é formada de imagens captadas em locações de Petrolina (PE), onde estão as vinícolas do antagonista Jaime Favais (Benício), e na região de Paulo Afonso (BA), base para as cenas feitas no Raso da Catarina.

                José Simão

                Folha de São Paulo
                Ueba! Marina parece o Vasco!
                E diz que, em homenagem à Portuguesa, vai ter gata do Brasileirão com bigode! Rarará!
                Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do Pais da Piada Pronta: "Narcisa Tamborindeguy se filia a partido político errado". Ai, que ferradura! Entrou pro PSD pensando que era o PSDB! Imagine na hora de votar! E como disse um cara no Twitter: "Narcisa devia entrar pro LSD!". Rarará!
                E gol da Portuguesa! E gol da Portuguesa! Agora a gente só escuta isso: Goool da Portuguesa! Jogaram pó-de-mico nos jogadores da Lusa? Meteram 4 no Corinthians, 3 no Santos e o Rogério Ceni já tá em pânico! Rarará!
                Tão chamando a Portuguesa de Barcelusa! E sabe por que a Portuguesa tá ganhando? Porque eles usam a tática padaria: atacam em massa e retrancam em bolo! E diz que, em homenagem à Portuguesa, vai ter gata do Brasileirão com bigode! Rarará! Eu acho que eles fizeram macumba com bacalhau preto. E vinho do Porto!
                E a Marina? A Marina parece o Vasco: faz um barulho danado pra ser VICE no final! O plano B era o PSB! Plano PSB! E a Marina não precisa de chapa, precisa de chapinha!
                E o Ciro Botelho disse que PSB quer dizer: Preferimos Surpreender o Brasil. Ou Pretendemos Surrar o Barbudo! Rarará!
                Achei uma incoerência a Marina falar "vamos sepultar a Velha República" e se filiar a um partido que filiou o Heráclito Fortes e o Bornhausen, do DEM! Deu Em Merda! Partido Socialista Brasileiro filia qualquer um, contanto que não seja socialista!
                E a política tá assim: o PT se junta com o Maluf e o Sarney. A Marina se filia ao PSB, que filia o povo do DEM. E o PSDB parece um antiquário. É O NOVO! Como gritou uma leitora: "Junta tudo e JOGA FORA!" Rarará!
                E eu posso ser sincero? Eu não entendo nada do que a Marina fala! Acho que ela tá falando grego com legenda em curdo e dublado em sânscrito! Parece filme da Mostra! E diz que, por causa da fusão Maricampos, a Dilma tá bolada. A Dilma não tá bolada. A Dilma É bolada: "Como presidenta, eu digo: Vamos em frenta que atrás vem genta!'". Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
                Os Predestinados! Mais dois para a minha série Os Predestinados! É que em Moema, aqui em Sampa, tem uma psicanalista chamada Janet NOYA! "Ai, doutora Janet, tô com uma noia!" E em São Carlos tem uma psicóloga chamada Silvia PÂNICO! Rarará!
                Nóis sofre, mas nóis goza!
                Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

                  Festival leva deficientes às telas e à plateia

                  Assim Vivemos chega à 6ª edição e exibe filmes de 17 países que destacam protagonismo de portadores de deficiência
                  Programação tem audiodescrição para cegos, legendas para surdos e acessos com adaptações
                  MARCELO ALMEIDADE SÃO PAULOO festival "Assim Vivemos" completa dez anos como o maior festival do país com temática ligada à deficiência.
                  Além de usarem como tema a deficiência, os 28 filmes de 17 países da programação terão acesso para cadeirantes e recursos para pessoas com deficiência visual (com audiodescrição e catálogos em braille) e auditiva (com legendas e interpretação em libras nos debates).
                  Dentre os destaques está "As Sessões", sobre personagem real que ficou tetraplégico. O filme rendeu a Helen Hunt uma indicação ao Oscar.
                  Segundo Lara Pozzobon, uma das fundadoras e curadoras, a ideia do evento surgiu após ela participar de um festival temático sobre deficiência em Munique, em 2001.
                  "Fiquei maravilhada com o nível de qualidade dos filmes e achei que deveria haver iniciativa semelhante por aqui", afirma.
                  EXIGÊNCIA
                  Pozzobon conta que, quando o festival teve início, em 2003, o conceito de audiodescrição mal existia no país. "Os deficientes auditivos tinham que levar alguém que ficava cochichando o tempo todo."
                  Segundo a curadora, o protagonismo dos deficientes é a principal exigência feita para a seleção. "Priorizamos obras em que as próprias pessoas com deficiência contam suas vidas."
                  A consultora Jucilene Braga, 32, que é deficiente visual, diz que costuma recorrer a eventos do tipo para ter acesso completo a filmes e peças de teatro.
                  Para ela, as duas horas por dia de programação com audiodescrição na TV aberta são pouco. "Em duas horas, dentre as 24 do dia, eu vou ver só a Tela Quente'. É bastante limitante", afima.

                    João Pereira Coutinho

                    folha de são paulo
                    Homens de bem
                    Não são os homens públicos que devem ser virtuosos; são as leis que devem ser implacáveis
                    Você, leitor, é pessoa honesta e cumpridora. Trabalha. Paga as contas. É decente com a mulher e os filhos. Mas quando olha em volta, o cenário é selvagem. Os colegas usam e abusam da dissimulação e da mentira. Sem falar da corrupção de superiores hierárquicos ou de políticos nacionais, esse câncer que permite a muitos deles terem o carro, a casa, as férias, a vida que você nunca terá.
                    Para piorar as coisas, eles jamais serão punidos por suas viciosas condutas. A pergunta é inevitável: será que eu devo ser virtuoso? Será que eu devo educar os meus filhos para serem virtuosos?
                    Essas perguntas foram formuladas por Gustavo Ioschpe em excelente texto para a "Veja". De que vale uma vida ética se isso pode representar, digamos, uma "desvantagem competitiva"?
                    Boa pergunta. Clássica pergunta. Os gregos, que Ioschpe cita (e, de certa forma, rejeita), diziam que a prossecução do bem é condição necessária para uma vida feliz. Mas o que dizer de todas as criaturas que, praticando o mal, o fizeram de cabeça limpa por terem falsificado a sua própria consciência?
                    Apesar de tudo, Gustavo Ioschpe tenciona educar os filhos virtuosamente. Não por motivos religiosos, muito menos por temer as leis da sociedade. Mas porque assim dita a sua consciência. Um dia, quem sabe, talvez o Brasil acabe premiando essas virtudes.
                    A resposta é boa por seu otimismo melancólico. Mas, com a devida vênia ao autor, gostaria de deixar dois conselhos para acalmar tantas angústias éticas.
                    O primeiro conselho é para ele não jogar completamente fora as leis da sociedade na definição de boas condutas. Porque quando falamos de vidas éticas, falamos de duas dimensões distintas: uma dimensão pública, outra privada.
                    E, em termos públicos, acreditar que os homens podem ser anjos (para usar a célebre formulação do "Federalista") é o primeiro passo para uma sociedade de anarquia e violência.
                    Na esfera pública, eu gostaria que os homens fossem anjos; mas, conhecendo bem a espécie, talvez o mínimo a exigir é que eles sejam punidos quando se revelam diabos.
                    Se preferirmos, não são os homens públicos que têm de ser virtuosos; são as leis que devem ser implacáveis quando os homens públicos são viciosos.
                    Isso significa que a principal exigência ética na esfera pública não deve ser dirigida ao caráter dos homens --mas, antes, ao caráter das leis e à eficácia com que elas são aplicadas. No limite, é indiferente saber se os homens públicos são exemplos de retidão. O que importa saber é se a República o é.
                    Eis a primeira resposta para a pergunta fundamental de Gustavo Ioschpe: devemos educar os nossos filhos para a virtude? Afirmativo. Ninguém deseja para os filhos a punição exemplar das leis. E, como alguém dizia, é do temor das leis que nasce a conduta justa dos homens. Desde que, obviamente, as leis inspirem esse temor.
                    E em privado? Devemos ser virtuosos quando nem todos seguem a mesma cartilha e até parecem lucrar com isso?
                    Também aqui, novo conselho: não é boa ideia jogar fora os gregos. Sobretudo Aristóteles, que tinha sobre a matéria uma posição sofisticada e, opinião pessoal, amplamente comprovada.
                    Fato: não há uma relação imediata entre virtude e felicidade. Mas Aristóteles gostava pouco de resultados imediatos. O que conta na vida não são as vantagens que conseguimos no curto prazo. É, antes, o tipo de caráter que "floresce" (uma palavra cara a Aristóteles) no curso de uma vida.
                    E, para que esse caráter "floresça", as virtudes são como músculos que praticamos e desenvolvemos até ao ponto em que a "felicidade", na falta de melhor termo, se torna uma segunda natureza.
                    Caráter é destino, diria Aristóteles. O que permite concluir, inversamente, que a falta de caráter tende a conduzir a um triste destino. Exceções, sempre haverá. Mas, aqui entre nós, confesso que ainda não conheci nenhuma. Não conheço maus-caracteres que tiveram grandes destinos.
                    Sim, leitor, não é fácil olhar em volta e ver como a mesquinhez alheia triunfa e passa impune. Mas não confunda o transitório com o essencial.
                    E, sobretudo, nunca subestime a capacidade dos homens sem caráter para arruinarem suas próprias vidas.
                    Educar os filhos para serem "homens de bem" é também ajudá-los a evitar essa ruína.