terça-feira, 19 de novembro de 2013

Helio Schwartsman

folha de são paulo
Em busca do discurso perdido
SÃO PAULO - Com algumas das principais lideranças petistas atrás das grades, os militantes do partido parecem dividir-se em dois grupos. Um primeiro, mais delirante, afirma que tudo não passou de um conluio da direita com a mídia golpista para derrubar o primeiro governo popular da história deste país.
Praticamente nada dessa narrativa para em pé. Se há um grupo que se aliou à direita, personificada em Sarney, Collor, Maluf, Renan etc., é justamente o PT. Ademais, as investigações e o julgamento do mensalão ficaram a cargo de promotores e juízes que foram, em sua maioria, indicados pelo PT. Provas foram levantadas, expostas ao contraditório e analisadas. Se os petistas acham que houve perseguição, em vez de acusar a imprensa deveriam procurar um sabotador em suas próprias fileiras.
De resto, a gestão Dilma segue firme e forte. Nem ela nem Lula estiveram perto de ser defenestrados, de forma legal (impeachment) ou ilegal (golpe). Ao contrário, a presidente é a franca favorita no pleito de 2014.
O segundo grupo razoavelmente alega que o PT não fez nada que outros partidos também não façam. Fora um detalhe ou outro, é verdade. Como defesa, porém, a estratégia é fraca. Combina uma confissão de culpa com a tática de acusar a todos.
O argumento serve bem para que se exija que escândalos capitaneados por outros partidos sejam punidos com igual rigor, mas não justifica os atos da cúpula da agremiação.
Vou um pouco mais longe e digo que é razoável que parte da opinião pública julgue o PT de forma mais severa que outras legendas. O PT, afinal, passou a primeira metade de sua existência alardeando que fazia política de um jeito diferente, ético. É como o deputado pego em flagrante de adultério com um estagiário do mesmo sexo. Ele pagará um preço maior por sua indiscrição se for um moralista, daqueles que impreca contra homossexuais, do que se for alguém que jamais condenou o hedonismo.

Eliane Cantanhêde

folha de são paulo
Nem ódio nem adoração
BRASÍLIA - Foram 25 condenados pelo mensalão, 12 com mandado de prisão até ontem à noite, mas não se veem manifestantes contra e muito menos a favor da banqueira Kátia Rabello, do publicitário Marcos Valério nem da mera funcionária Simone Vasconcelos, atingidos por pesadas penas em regime fechado.
Também não se veem manifestantes gritando contra ou a favor de deputados e ex-deputados do PP, do PR nem do PTB, de quem nunca se esperou nada diferente de mensalões. A estes, a lei e o descaso.
Toda a comoção nacional, pró e contra, está concentrada em três réus: José Dirceu, apontado pela Procuradoria-Geral da República como o "chefe da quadrilha", José Genoino, que caiu na besteira de assinar um documento e --ao contrário de uns e outros-- sai dessa preso e sem ficar rico, e Delúbio Soares, o ex-tesoureiro petista, desses que apanha calado.
Por que os manifestantes, que desdenham da sorte dos demais, adoram ou odeiam esses três personagens? Porque eles são do PT, que foi heroico nas CPIs, dossiês e escândalos contra adversários --até no impeachment de um presidente--, mas aderiu às mesmas práticas para chegar ao poder e se agarrar a ele. Os três pagam pelo crime e pela hipocrisia.
A banqueira, o publicitário, a funcionária, os pepistas, os petebistas e os do PR não tinham assento no Palácio do Planalto, não eram do partido do presidente e não tinham a caneta. Se houve algum crime --e o Supremo diz que houve--, eles foram participantes, não mandantes. Logo, que as manifestações sejam mais justas e não seletivas. Ou se defendam todos os réus, ou se ataquem todos eles.
De toda forma, as penas devem ser para fazer justiça, não para aniquilar pessoas. As prisões são tenebrosas, os réus são muito visados e o Estado é responsável pela integridade física de cada um. Especialmente de Genoino, que acaba de passar por uma cirurgia cardíaca, está em regime semiaberto e tem direito, antes de mais nada, à vida.

    Carlos Heitor Cony

    folha de são paulo
    A causa e o efeito
    RIO DE JANEIRO - Pedindo vênia aos doutos ministros do Supremo Tribunal Federal que gastaram muito latim para julgar os réus do mensalão, vou gastar o meu pouco latim, que aprendi na lógica de Aristóteles em versão escolástica de Tomás de Aquino:
    "Posita causa, positur effectus; variata causa, variatur effectus; sublata causa, tollitur effectus." O latim é macarrônico demais, não precisaria de tradução, mas aí vai: pondo, variando ou eliminando a causa, põe-se, varia-se ou elimina-se o efeito.
    O efeito, até agora, foi a prisão de alguns dos condenados do mensalão, mas a causa não foi a corrupção pessoal dos autores materiais dos diversos crimes cuja causa seria o fortalecimento do governo petista, que mantém uma perspectiva operacional de permanecer 20 anos no poder.
    Resumindo: mais uma vez, a causa de tantos crimes foi o poder, o poder em si mesmo, autor intelectual de uma vasta rede de corrupção em diferentes níveis.
    Pelo que se apurou nas infindáveis sessões do Supremo Tribunal Federal, chegou-se a um "capo di tutti i capi" na pessoa simpática e já histórica de José Dirceu, que ocupava a sala ao lado de outra sala, por sinal, mais poderosa e da qual emanava o combustível que mantinha a engrenagem funcionando.
    Do ponto de vista jurídico, a justiça parece que foi feita, em que pesem pequenos ajustes nas penas e até mesmo na mecânica dos crimes.
    Do ponto de vista filosófico, o "quid prodest" que foi a causa da corrupção generalizada, a Justiça chegou até onde podia chegar, funcionários de média ou grande importância, não ultrapassando os limites que poderiam gerar uma grave e até mesmo sangrenta crise institucional.

      Vladimir Safatle

      folha de são paulo
      Liberdade para o racismo
      Há alguns dias, uma revista francesa publicou na sua capa uma foto da ministra da Justiça da França, a negra Christiane Taubira, comparando-a a uma macaca à procura de banana.
      Ela já havia sido comparada ao nosso parente distante por uma criança em uma manifestação anticasamento homossexual, sem que ninguém esboçasse uma reação indignada. A maior indignação partiu, vejam só vocês, da revista em questão, que inverteu o jogo alegando que tudo era apenas uma piada e que não suportava a "ditadura do politicamente correto".
      É interessante perceber como, atualmente, todos os que são pegos em franco delito de racismo e preconceito (contra imigrantes, ciganos, árabes, negros, índios, homossexuais, ecologistas, feministas) alegam, na verdade, serem perseguidos pela implacável polícia do politicamente correto. Estamos diante de uma legião de humoristas incompreendidos a lutar contra burocratas da língua que procuram impor à sociedade um discurso asséptico e uma maneira de ser.
      Afinal, que época é esta em que não se pode mais chamar uma negra de macaca, ou dizer, com uma ironia calculada, que mulher gosta é de apanhar? Será que todos perderam seu senso de humor?
      Há anos, isso era tão engraçado, mas, agora, as pessoas parecem que se deixam policiar por todos os lados, abrindo mão de sua liberdade de livre-pensar e brincar de adolescentes à procura da opinião mais bombástica capaz de chocar seus pais intelectualizados. Sim, meus amigos, a mais nova moda é chamar racismo e preconceito de afirmação rebelde da liberdade.
      Esses estilistas do ressentimento social apareceram travestindo inicialmente seu discurso político de indignação moral. Foram imbuídos do dever de denunciar todos os que usavam o palavreado da igualdade e da tolerância e que, segundo eles, procuravam ganhar dinheiro em ONGs ou aumentar sua vontade de poder.
      Mas, em vez de criticar a pretensa hipocrisia em questão e defender a igualdade e a tolerância de seus usurpadores, eles preferiram aproveitar o que entendiam como fraqueza moral de seus oponentes e colocar na avenida todo o ressentimento escondido durante décadas.
      Assim, aquele sentimento de desconforto diante da diferença e da transformação social, de recusa a autocrítica de seus próprios valores, de mediocridade medrosa e de colonialismo xenófobo mal disfarçado podiam, enfim, voltar. Pior, voltar com o selo da liberdade. Poucos, entretanto, se enganam com o tipo de mundo medieval e pequeno que tal "liberdade" produz.

        Janio de Freitas

        folha de são paulo
        Quando março chegar
        A ida dos presos para cadeias injustificáveis em Brasília proporcionou um espetáculo de marketing
        Na conturbada sessão do Supremo Tribunal Federal de quarta passada, quando decididas as prisões do mensalão sem esperar pelo fim dos recursos de defesa, um dos vários incidentes surgiu e repicou insistentemente sem sequer indício de algo que o explicasse. A ocorrência das prisões no 15 de novembro não só o explicou, como explicou muito mais. E com mais importância.
        Já a antecipação das prisões entrava em discussão. Ricardo Lewandowski ponderou que, tendo o procurador-geral da República entrado com novo documento no processo, do qual o ministro recebera cópia e notara o despacho "Junte-se" assinado por Joaquim Barbosa, cabia à defesa pronunciar-se a respeito. Marco Aurélio Mello endossou de pronto a ponderação, pronunciamento de uma parte chama o da outra. O documento propunha as prisões imediatas.
        Joaquim Barbosa desfechou, com raiva, um ataque súbito ao procurador-geral Rodrigo Janot, sentado à sua direita, por lhe mandar o documento na véspera, o qual nem ao menos lera antes de despachar. Do seu teor só tomava conhecimento ali, naquela hora.
        Não precisaria dizer, aqui, que Marco Aurélio Mello se esbaldou em gozações ao presidente do tribunal que confessava assinar e despachar documentos sem os ler. Barbosa repetiu, e repetiu mais, o ataque à atitude de Janot, no entanto adotada com perfeita formalidade e no seu direito funcional.
        Também não precisaria dizer que Joaquim Barbosa atropelou a ponderação sobre um direito de defesa e um dever de juízo, e aparentemente foi acompanhado pela maioria (com a intensidade da balbúrdia, o presidente não conseguiu formular o sentido e a forma da decisão do tribunal; adiou-a, e não a expôs na sessão seguinte).
        Mas toda a crítica raivosa, que o procurador-geral Rodrigo Janot ouviu como um soldado ao tenentinho que experimenta o seu recente poder de humilhar, ficou explicada no feriado. Já em meio à exaltação com Marco Aurélio e Janot, aliás, Joaquim Barbosa dissera que já tinha preparada a medida quando o procurador-geral a pedira. Mas, na sessão, isso não pareceu importante porque nada levava a prever-se a intenção de Joaquim Barbosa de determinar as prisões para 15 de novembro.
        Claro, com seu pedido, o procurador-geral pôs-se na iminência de se apropriar das prisões e dos efeitos promocionais decorrentes de providenciá-las. Mesmo não sendo esse o propósito de Rodrigo Janot, foi até manchete de primeira página com o que pedia. A intenção marqueteira pulou-lhe na garganta.
        A ida dos presos de São Paulo, Belo Horizonte e Goiânia, cidades de suas residências, para cadeias injustificáveis em Brasília foi, mais do que sem sentido, por isso mesmo sem amparo legal. Mas proporcionou um espetáculo de marketing político extraordinário pelo alcance, social e geográfico, e pela concentração precisa sobre o beneficiário. Se apenas para colher palmas em lugares públicos ou para mais que isto, saberemos quando março encerrar o prazo especial de inscrições partidárias-eleitorais. Mas a convicção de que não será preciso esperar até lá, com as indicações dadas pelo espetáculo fabricado para o 15 de novembro, já supera as prisões como assunto na política.

        Mensalão tucano fica para início de 2014

        folha de são paulo
        Ouvir o textoTHAIS BILENKY
        DE SÃO PAULO

        O mensalão tucano poderá ser julgado ainda no primeiro semestre de 2014. Segundo apurou a Folha, essa é a expectativa no gabinete do ministro Luís Roberto Barroso, o relator do processo no STF (Supremo Tribunal Federal).
        Diretamente consultado, Barroso evitou comprometer-se com prazo. "Vou julgar o mais rápido que o devido processo legal permitir", disse.
        O mensalão tucano, segundo a descrição do Ministério Público Federal, foi um esquema de desvio de dinheiro de empresas públicas de Minas Gerais para financiar a reeleição do então governador Eduardo Azeredo (PSDB) na eleição de 1998.
        Apesar de os fatos descritos terem ocorrido antes, o caso só veio a tona depois da denúncia do mensalão petista (2005). Foi quando o nome do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza começou a ser citado como um dos operadores do esquema petista.
        Valério também seria um dos personagens centrais do suposto esquema mineiro.
        Segundo a acusação, duas estatais (Copasa e Comig) e um banco público (Bemge) repassaram, com aval de Azeredo, R$ 3,5 milhões em patrocínio a três eventos esportivos promovidos pela SMPB, uma das agências de Valério.
        Para disfarçar o uso desse dinheiro na campanha do PSDB, Valério teria feito empréstimos fraudulentos de R$ 11 milhões no Banco Rural, o mesmo que apareceria depois no mensalão petista.
        Para alguns, o mensalão tucano teria servido de modelo para o esquema petista.
        Azeredo, hoje deputado federal, acabou perdendo a disputa de 1998 pelo governo mineiro para o ex-presidente Itamar Franco (PMDB).
        trâmite
        O julgamento do suposto desvio de recursos públicos em Minas está dividido em duas ações penais e um inquérito, que corre em segredo de Justiça.
        A primeira ação penal é contra Azeredo. A segunda é contra o hoje senador Clésio Andrade (PMDB-MG), então candidato a vice na chapa tucana de 1998.
        A defesa de Azeredo tem até a próxima sexta-feira, 22, para pedir diligências (providências do relator). Barroso poderá aceitá-las ou não.
        Depois, o relator abrirá prazo para as alegações finais da defesa de Azeredo e do Ministério Público Federal.
        Caso ele não requeira novas provas, poderá então elaborar o relatório e enviá-lo ao revisor, Celso de Mello.
        Com o voto feito, o revisor encaminha o caso ao presidente do Supremo, que definirá a data em que a ação será posta na pauta do plenário. O mandato de Joaquim Barbosa na presidência do Supremo termina em novembro de 2014. O próximo presidente será Ricardo Lewandowski.
        A ação contra Andrade está pendente no Ministério Público, por conta de uma testemunha que ainda não foi ouvida. Será preciso que o órgão defina se a substituirá ou se desistirá para que Barroso dê continuidade ao andamento da ação.
        Editoria de Arte/Folhapress

        Veja as manchetes dos principais jornais desta terça-feira

        folha de são paulo

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        DE SÃO PAULO
        *
        Jornais nacionais
        O Estado de S.Paulo
        Dirceu, Genoino e Delúbio vão para ala de regime semiaberto
        O Globo
        Dirceu, Genoino e Delúbio dividem cela com mais dois
        Valor Econômico
        Mudança em dados sociais tira o sono das empresas
        Correio Braziliense
        Dirceu e Genoíno vão para ala semiaberta
        Zero Hora
        Piso regional deverá subir ao menos 10%
        *
        Jornais internacionais
        The New York Times (EUA)
        Calculadora de risco para colesterol apresenta falhas
        The Washington Post (EUA)
        Ganhos de capital
        The Guardian (Reino Unido)
        Subsídios para cursos universitários estão fora de controle
        El País (Espanha)
        O exército entra em ação contra o "radicalismo" em suas fileiras