sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Barbara Gancia

folha de são paulo
Jogue Bucicleide do helicóptero
Buci, digo, Cleide chegou para me bombardear com um arsenal de perguntas sobre uma tal família Perrella
Desta vez o choque foi quase insuperável. Eu ainda estava acabrunhada e perguntando a mim mesma o que poderia ter da­do errado, quando minha treslou­cada amiga Bucicleide surgiu do nada, aparentemente para injetar ânimo em minhas veias.
"Não é possível, Buci, digo, Cleide, não entendo", desabafei. "O que é que Dubai tem que São Paulo não tem?" Não me conformo. Como pode a locomotiva do Brasil, exem­plo de cidade de gente que faz e, quando não quer fazer, tem quem faça por ela, ter perdido para uma aldeia de adestradores de camelos, comedores de tâmaras, trepadores em miragens de palmeiras na com­petição para sediar a Expo 2020?
Dubai não fica lá na região da no­vela "O Clone"? Pois então. Vá ver se naquele fim de mundo tem pisci­não, vá examinar se chove e escoa como aqui, se eles possuem 300 km de corredores de ônibus para ornar as avenidas, se tem prefeito boneco Ken ou ruas com lindas guaritas, se produzem o tanto de lixo por reco­lher que a gente vê em nossas calça­das, vá! Só quem gera riqueza pro­duz lixo, sabia não, seu bando de desinteligentes que votou com a bunda em vez do cérebro?
Eliminar nossa potência logo na primeira rodada com apenas 13 vo­tos de 163 possíveis para dar a vitó­ria a uma tribo de nômades fazedo­res de xixi na areia é treta. Está na cara que tem harabishueba nesse negócio.
Bucicleide, que estava esperando meu desabafo chegar ao término com paciência de cuidador de pes­soas idosas, soltou um suspiro tão dolorido que forçou um ponto final em minha fala. "Olha só, dona Bar­barica, não é sobre isso que vim ter", anunciou. "Ah, não? Então do que estamos tratando?"
Buci mandou na bucha: "Quero arrumar um jeito de filar a bóia lá na fazenda dos Perrella, você que é jornalista e conhece todo mundo, não teria um contato bom para me apresentar, não?"
E quem seriam "os Perrella"? De­veria ter desconfiado da compaixão daquele ouvido amigo. Eterna inte­resseira, Bu (sim, Bu) foi tratando de explicar. "Fiz uns cálculos e che­guei à conclusão de que os 445 kg de cocaína apreendidos no helicópte­ro da empresa do deputado Gusta­vo Perrella (SDD-MG), devem va­ler 50 milhões no mercado".
Sei. E daí? "Daí que o piloto do he­licóptero dos Perrella recebe R$ 1.700,00 ao mês. E o advogado do parlamentar disse que o funcioná­rio estaria fazendo bico' naquele dia, sabia?" Não. "Pois é, mas piloto de helicóptero não ganha perto de R$ 15 mil?" E eu lá sei? Não sou pi­loto, ora bolas!
Senti uma mudança no tom de voz. "Ah, é? Então me diga: por que a PF não informou a quem perten­ce a fazenda em que o helicóptero pousou para descarregar a merca­doria? Qual o padrão de vida de um piloto de helicóptero que transpor­ta carga ilícita avaliada em R$ 50 milhões? Por que não foi divulgado o resultado da quebra do sigilo telefônico do deputado Gustavo Perrella, 28, ou de seu pai, o sena­dor Zezé Perrella (PDT-MG), que já foi acusado de enriquecimento ilícito, lavagem de dinheiro e eva­são de divisas? Sabemos se há regis­tro de conversas com o piloto?"
Nossa Bucicleide, você não tem mais o que fazer? Mas, em vez dizer isso em alto e bom tom, acabei per­guntando: "Por que você quer ir fi­lar a bóia na casa dessa gente, me explica?" Buci fez cara de pau de es­panta cupim e revelou enfim: "Ué, porque a comida na casa dos Per­rella deve ser ótima. Só pode ser por causa dela que um sujeito qua­lificado como piloto aceita receber um salário 10 vezes inferior ao do mercado para depois correr um baita risco traficando droga em ae­ronave roubada, né?"

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