quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Os números de Marina - Janio de Freitas

Marina Silva e sua hipótese de partido chegam hoje ao dia crucial envoltos em barafunda ainda maior do que a briga com os números que lhes ocupou os últimos meses. Não bastando a posição da Procuradoria Eleitoral contra o registro ao partido, no Tribunal Superior Eleitoral explicita-se uma tese complicadora para a defesa de Marina Silva, sobre os milhares de apoios eleitorais não autenticados pelos cartórios.
O ministro João Otávio de Noronha antecipou-se ao julgamento de logo mais e negou que os cartórios eleitorais, como afirma a defesa da pretendida Rede Sustentabilidade, precisassem justificar a não autenticação de apoios assinados por eleitores. "Não justificaram", expressão utilizada pela defesa, deu estatura maior do que a conveniente à atitude dos cartórios, enfraquecendo o argumento.
O verbo no seu devido tamanho seria, por exemplo, informar. Informar o motivo da impugnação: a assinatura não confere, o número do título é de outro eleitor, ou não existe, e demais casos. E tais informações os cartórios, como toda repartição pública, devem sim aos cidadãos e às iniciativas que adotem. Ou ficaremos todos à mercê da vontade, do desleixo ou do interesse de funcionários, que assim se tornariam um poder insuperável.
Tanto o cidadão deve explicações ao Poder Público, como o Poder Público as deve aos cidadãos. Do contrário, no primeiro caso é a desordem total e, no segundo, o regime de arbitrariedade em nome do Estado. Até já vivemos esta segunda situação, mas o que nos cabe é recusar qualquer resquício que a imite.
O ministro tem razão ao dizer que as providências de Marina Silva deveriam ocorrer nos cartórios, e em tempo. Ao que conste, houve a tentativa, pelo menos em parte dos cartórios no país afora. É o que sugere o próprio argumento da "falta de justificação". Mas, se não houve a providência, faltou, nem por isso o assunto está encerrado.
O Tribunal Superior Eleitoral é responsável pelo processo eleitoral desde suas preliminares às titulações eletivas. Deve, portanto, o exame do que se passou com tantos dos apoios alegados por Marina Silva, deve uma decisão a respeito e deve uma explicação pública, para que não restem dúvidas fundadas e acusações interesseiras. Se a Rede Sustentabilidade deve ser aprovada ou não, já é outro assunto, a depender só de que o TSE faça convincentemente o que lhe couber.
PROTESTO
Convém notar: dos 17 presos por excesso de violência na balbúrdia de terça-feira no centro do Rio -nenhum professor- dois foram identificados como criminosos com mandados de prisão por roubo à mão armada.
Na história
O papa Francisco não quer apenas que se saiba do seu propósito de reformar a Cúria e o Vaticano -cristianizá-los, é isso-, quer também que se saiba por que deseja fazê-lo. E tem a coragem de dizê-lo com franqueza estonteante.
"A corte é a lepra do papado" -que irado ateu ousou, nos últimos séculos, uma definição assim dura e crua sobre os "cortesãos vaticanocêntiricos"?
Estamos, pode-se admitir, diante de um fenômeno, na acepção mais límpida da palavra. Testemunhá-lo será um privilégio histórico.
Daniel Marenco/Folhapress
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.

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