Corrupção com limites
SÃO PAULO - "Um mesmo profissional se torna desonesto de uma hora para outra?", perguntou-se o ex-prefeito Gilberto Kassab ao comentar o esquema de fraudes no ISS. É uma questão interessante. Como as pessoas se tornam corruptas?
Não é difícil perceber quais são os incentivos ao logro. No caso em tela, eles se medem na escala das dezenas de milhões de reais. Mas isso não significa que seres humanos não tenham nenhuma defesa contra o vírus da corrupção. Pelo menos duas forças atuam para manter-nos afastados desse gênero de delito.
A primeira, externa, é o temor de ser apanhado e sofrer as sanções legais e sociais correspondentes. No Brasil, infelizmente, a eficácia dos órgãos de controle e da Justiça é tão baixa que, num cálculo estritamente racional, muitas vezes vale a pena roubar. A dificuldade então passa a ser explicar por que a corrupção não é ainda mais generalizada.
Entra aqui a segunda força, que é a autoimagem das pessoas. Sendo interna, ela tem a vantagem de dispensar fiscais e investigadores. O problema é que, como cada qual é juiz de si mesmo, a indulgência corre solta.
O psicólogo Dan Ariely submeteu estudantes a uma série de experimentos em que tinham a oportunidade de burlar regras com diferentes probabilidades de ser pegos e com diversos tamanhos de recompensa envolvidos e concluiu que todo mundo trapaceia --mas com limites.
Para o pesquisador, a desonestidade é o resultado de uma contínua negociação entre o desejo por vantagens materiais e a necessidade que todo indivíduo tem de cultivar uma autoimagem ao menos aceitável. O cérebro resolve o problema impondo um teto aos desvios. Na população estudada por Ariely, as consciências dos estudantes toleravam bem uma burla de até 15%. É uma baliza para a qual ainda conseguiam providenciar uma racionalização que, se não justificava o roubo, pelo menos o fazia parecer menos grave.
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