quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Pesquisa traz à tona trabalhos perdidos do artista Flávio de Carvalho

folha de são paulo

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SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO

Mais do que artista plástico, Flávio de Carvalho, morto aos 73 há 40 anos, foi engenheiro, arquiteto, cenógrafo, diretor teatral, performer, designer e cineasta frustrado. Também acabou sendo vítima dessa pluralidade estonteante, já que parte de sua obra acabou espalhada --às vezes esquecida-- em arquivos e depósitos públicos.
Ele tentou refundar os costumes, revendo a moda europeia no clima tropical, reinventando a ideia de moradia ao construir uma vila modernista na alameda Lorena, em São Paulo, e pregando uma arquitetura "nua e lisa". Agora, tem uma parte de sua história desenterrada.

Um garimpo feito no Theatro Municipal, em salas da biblioteca Mário de Andrade e até em fundos de gaveta do Arquivo Histórico trouxe à tona uma série de trabalhos até agora dados como perdidos. A pesquisa foi feita nos últimos meses pela equipe do Museu da Cidade, responsável pelo acervo municipal.

Flávio de Carvalho

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Danilo Verpa/Folhapress
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Criação de Flávio de Carvalho para o balé 'O Cangaceiro'
Entre as obras estão 12 figurinos do balé "O Cangaceiro", encenado por Carvalho nas comemorações dos 400 anos de São Paulo, em 1954, e as primeiras plantas das obras na alameda Lorena.
O Museu da Cidade tentará integrar agora esses itens à coleção de arte de São Paulo, fazendo saltar de quatro para cerca de 40 o número de obras de Carvalho catalogadas no acervo público.
Esse conjunto recém-descoberto também será o ponto forte da ocupação da Oca pela coleção da cidade a partir de janeiro do ano que vem, que estreia com uma grande mostra dedicada ao artista.
"Estamos tomando o caso do Flávio de Carvalho como referência para pensar os objetos na coleção", diz Afonso Luz, diretor do Museu da Cidade. "Essas peças são documentos vivos da história."
Mas, segundo Luz, o esquecimento delas se deu por causa do "olhar conservador sobre seu significado estético".
"Temos o desafio de organizar milhares de bens culturais guardados em inúmeros depósitos e reservas técnicas espalhadas pela cidade", afirma. "Um dos motivos dessa dispersão é que o conceito corrente de artes visuais é de objetos de parede, obras que funcionam como decoração."
ELO PERDIDO
Os vestidos desenhados por Carvalho para "O Cangaceiro" representam uma espécie de elo perdido na trajetória do artista --um contraponto aos experimentos com moda nas performances que ele orquestrou.
Enquanto Carvalho trouxe aspectos femininos ao guarda-roupa do homem em 1956, quando caminhou de saia e meia arrastão pelo centro da cidade na ação "Experiência nº 3", os vestidos de seu balé eram masculinizados, algo entre o sensual e a robustez de jagunços.
Também têm grande ressonância agora as plantas originais da alameda Lorena. Com as casas hoje em grande parte descaracterizadas, algumas funcionando como lojas, os documentos podem servir de base para um restauro das construções que Carvalho criou nos anos 1930 como "máquinas de morar".
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ARTISTA CRIOU 17 CASAS NOS JARDINS, EM SP
O desenho reproduzido abaixo é uma das plantas originais feitas por Flávio de Carvalho para as 17 casas que construiu na alameda Lorena, em São Paulo. As plantas podem ajudar a restaurar as construções, datadas de 1936.
Eduardo Anizelli/Folhapress
Flávio de Carvalho é tema de mostra e documentário
Nos 40 anos de sua morte, modernista tem pinturas exibidas na Faap
Plural, artista também tentou fazer cinema; sua iniciativa de rodar um longa na Amazônia é analisada em filme
DE SÃO PAULOEnquanto a Oca deve receber em janeiro um recorte expandido da produção de Flávio de Carvalho, que vai da arquitetura aos figurinos, uma mostra em cartaz agora no Museu de Arte Brasileira da Faap reúne a ala mais tradicional de sua obra, com retratos de gente como os maestros brasileiros Eleazar de Carvalho (1912-1996) e Camargo Guarnieri (1907-1993).
Tudo, aliás, está interligado nessa história, já que Guarnieri, retratado por Carvalho, compôs "O Cangaceiro", balé que teve os figurinos criados pelo artista plástico.
Maria Izabel Branco Ribeiro, diretora do museu da Faap, não dá a mesma ênfase aos projetos de Carvalho para além da pintura.
"Dizer que a obra dele como figurinista é tão significativa quanto a obra de pintor e de arquiteto é uma afirmação desequilibrada", diz Branco Ribeiro. "Ele não tem uma preocupação com moda. Vejo as atitudes dele como de alguém que contraria regras, um iconoclasta."
'DEUSA BRANCA'
Iconoclasta ou só inquieto, Carvalho também tentou ser cineasta. Sua iniciativa de rodar um filme na Amazônia, para onde levou duas loiras esbeltas e dispostas a encarnar sua "Deusa Branca", virou alvo de um documentário lançado no Itaú Cultural e que deve entrar no circuito de festivais em 2014.
No filme, o diretor Alceu Braga destrincha os bastidores de uma expedição do artista à selva em 1958.
Sem roteiro, Carvalho pretendia gravar o embate de sua trupe com uma perigosa tribo de canibais, os xirianãs.
Mas sua desgraça não veio pelas mãos dos índios, que serviram até banquete de macacos assados à equipe, e sim por ter se apaixonado por uma atriz, que conquistara também o capitão da expedição. Irritado, Carvalho até trocou tiros com o rival, embora nenhum tenha se ferido.
A expedição fracassada sepultou a incursão cinematográfica do artista.

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