domingo, 13 de outubro de 2013

Elio Gaspari

folha de são paulo
O xerife da Receita preferiu ir embora
Cândido incomodou-se com o que chamou de "influências externas divorciadas do melhor interesse" da Viúva
Não há lembrança de um subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, o segundo homem da instituição, que tenha pedido o chapéu informando aos colegas que "há algum tempo estava incomodado com a influência externa em algumas decisões" envolvendo "posições menos técnicas e divorciadas do melhor interesse". Caio Cândido estava no cargo desde 2011. Atribuir a decisão a um "natural desgaste", como fez o secretário da Receita, doutor Carlos Alberto Barreto, é tática bolchevique. Vale o que está escrito na carta do servidor.
O subsecretário Caio Cândido pediu demissão porque incomodou-se com a "influência externa". Não foi específico, mas foi claro. Em 2009 a secretária Lina Vieira foi demitida pelo ministro Guido Mantega num episódio que passava pelo Palácio do Planalto. A Receita fizera autuações bilionárias contra a Ford e o Banco Santander. A secretária foi substituída por administrações que, para o bem ou para o mal, tentam controlar a máquina da fiscalização, sem grande sucesso. (O caso do Santander morreu no Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda.)
O comissariado petista e o ministro Guido Mantega conseguiram ter uma secretária e um subsecretário de Fiscalização denunciando aquilo que, no mínimo, são pressões "divorciadas do melhor interesse" da Viúva.
PISTA LIVRE
Saiu do STF uma mensagem críptica aos mensaleiros petistas que temem ir para o Tremembé.
Decifrada, resultou no seguinte: Fiquem quietos, tudo acabará bem para vocês.
PORTA GIRATÓRIA
Em 2011 a Fiocruz entregou a diretoria-executiva do seu plano de saúde a José Antonio Diniz. O FioSaúde atende os 5.000 funcionários e familiares da veneranda instituição médica e, desde sua fundação, era dirigido por servidores da Casa. Diniz vinha da Axismed, do ramo privado de gestão de planos. Em janeiro deste ano ele rescindiu o contrato com a empresa que geria o plano da FioSaúde. Tudo bem.
Noticiado aqui que a Axismed ficaria com a gestão do plano da FioSaúde, o doutor Paulo Gadelha, presidente da Fiocruz, prontamente desmentiu a informação. O que havia era apenas uma proposta específica da empresa onde trabalhara o novo diretor-executivo. Numa apresentação intitulada "Plano de Trabalho 2013", apresentada à FioSaúde, a Axismed usara um texto onde se lia: "Nós até podemos escolher o que semear, mas necessariamente vamos colher o que plantamos".
Começaram a colher. A súmula da reunião de 21 de agosto da diretoria da Caixa de Assistência Oswaldo Cruz informa que decidiu colocar "em andamento" a seguinte decisão do seu conselho deliberativo:
"Deverá ser contratado inicialmente o serviço de Acompanhamento de Pacientes Internados e Orientação Médica por Telefone (AxisLine) para os 2.200 beneficiados elegíveis." A AxisLine é um serviço da Axismed.
AVISO AMIGO
O editorial do "New York Times" louvando os avanços sociais brasileiros e pedindo mais pulso nas obras de infraestrutura e na educação é um sinal de alerta para o comissariado. Ao contrário da "Economist" e do "Wall Street Journal", o "Times" reflete um pensamento liberal.
Dois editoriais do jornal relacionados com um momento importante da vida brasileira tiveram macumbas.
No dia 28 de março de 1964, um grupo de mandarins reuniu-se na Casa Branca para discutir o futuro do governo de João Goulart. (O embaixador Lincoln Gordon pedia um desembarque clandestino de armas no litoral paulista.) Um dos participantes sugeriu que se cabalassem dois editoriais "apropriados", um no "Times" e outro no "Washington Post".
No dia 31 de março, o "Times" circulou com um editorial dizendo que a situação estava "próxima do caos". Estava. No dia 3 de abril, depois da deposição de Goulart, outro editorial chamou-o de "incompetente" e "irresponsável". Era. Seu autor provavelmente foi o o editorialista Herbert Mathews, eterno quindim da esquerda pela ajuda que deu a Fidel Castro em 1957, quando ele estava na Sierra Maestra e era dado por morto pelo governo cubano.
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e acredita em tudo que o governo diz. Soube que o prefeito Fernando Haddad, de São Paulo, passou a andar de ônibus e que o governador Geraldo Alckmin anunciou que usará trens e o metrô.
O idiota acha que eles devem andar de Rolls-Royce, desde que os transportes públicos funcionem.
UM GRANDE RETRATO DO PAPA FRANCISCO
Quantos pares de sapatos o cardeal Jorge Bergoglio levou para Roma em março? Um, preto e velho, o único que tinha. Para quem quiser entender o que vem por aí, saiu um livraço nos Estados Unidos --é "Pope Francis - Untying the knots" ("Papa Francisco - Desatando os nós"), do jornalista inglês Paul Valelly. Está na rede por US$ 9,99.
Ele conta que, no conclave de 2005, Bergoglio chegou à terceira votação com 40 votos, mas o cardeal Ratzinger teve 72. Faltariam cinco para que atingisse os dois terços, e seus aliados avisaram que iriam até o 34º escrutínio, no qual bastaria a maioria absoluta, que já tinham. A demora exporia uma igreja dividida, e Bergoglio desistiu. Como arcebispo de Buenos Aires, a Cúria deu-lhe para comer o pão de Asmodeu. Rejeitavam suas indicações para bispados.
O livro explica como um personagem tradicionalista na doutrina e reformador em questões da Igreja, tendo sido um algoz da esquerda católica dos anos 70, tornou-se um mensageiro dos pobres. Bergoglio apoiou a ditadura argentina que matou dez mil pessoas, inclusive um bispo. Ajudou-a ao ponto do arrependimento. Exagerando, fez um percurso semelhante ao de d. Hélder Câmara, fascista nos anos 30, herói de letra de samba a partir dos 50.
O simpaticão da avenida Atlântica é um homem reservado, de poucos amigos, meditador solitário. Cozinhava suas refeições, mas comia sozinho. Quando tem de resolver uma questão, começa perguntando-se o que não deve fazer. Quando decide, medita de novo.
O mérito do livro de Vallely está na busca da alma de Francisco. Ele vai do par de sapatos para explicações muito mais complexas e documentadas. É uma biografia simpática, talvez passasse pelo crivo de Roberto Carlos.
No conclave de março, d. Odilo Scherer, o cardeal de São Paulo apresentado como um nome do Terceiro Mundo, era na realidade uma aposta da Cúria. Foi pouco votado no primeiro escrutínio, no qual Bergoglio teve 20 votos, e o favorito da imprensa italiana, o cardeal Scola, arcebispo de Milão, teve 35.
Na segunda votação os aliados de Scherer foram para Bergoglio. Scola entalou e, no quarto escrutínio, o argentino ultrapassou-o. No quinto foi eleito.
Em La Plata, o bispo Héctor Aguer, seu adversário na Argentina, proibiu o tradicional dobre de sinos.

    Janio de Freitas

    folha de são paulo
    Entre ceder e conceder
    Leilões para concessão de aeroportos correm risco de juntar-se à história moral das privatizações de FHC
    Por falta de batalha não será, mas pode ser por falta de firmeza para a palavra decisiva. Por que tal falta, não está claro. O fato é que os leilões para concessão dos aeroportos do Galeão e de Confins (região metropolitana de Belo Horizonte), a julgar pela preocupação do próprio grupo central do governo, estão em risco iminente de juntar-se à história moral das privatizações das teles e da Vale no governo Fernando Henrique.
    Embora, fique ressalvado desde logo, essa integração se desse com inversão dos papéis representados nas privatizações anteriores e nas previstas para o próximo 22 de novembro. Ou seja, naquelas foi o núcleo poderoso do governo a entortar as concorrências e dirigi-las previamente para determinados resultados. Agora, o grupo central do governo pressente o dirigismo, faz investidas contra ele, mas só ganha batalhas, não a guerra.
    Como de praxe nas licitações, as exigências a serem preenchidas pelos concorrentes são a chave. Tanto para a incomum preservação de condições limpas e igualitárias entre os pretendentes, como para selecionar os concorrentes pela eliminação antecipada de alguns, enfraquecimento mortal de outros e consagração do sobrevivente.
    Aqui mesmo foi revelada, há tempos, a fraudulência de uma concorrência em que os pretendentes, para habilitar-se, precisavam comprovar a experiência de colocar 20.000 m² de piso de granito. Ora, quem sabe colocar 10m² sabe fazer o mesmo ao infinito. Mas a exigência tinha finalidade precisa: só a empreiteira Andrade Gutierrez podia comprovar a colocação da metragem pedida, que fez ao construir o aeroporto de Confins.
    As grandes empreiteiras estão todas interessadas nas privatizações de agora. É apenas habitual, portanto, que já nos primeiros estudos aparecessem exigências exóticas. E se sucedessem, ou ressurgissem, à medida em que a Casa Civil da Presidência da República as derrubava. O que foi feito, parcialmente, também pelo Tribunal de Contas da União. Mas dois fatos esquisitos deram-se nos últimos dias.
    Um deles, a viagem da relatora do assunto no TCU e o parecer do relator-substituto, em nova revisão das exigências, protegendo a adoção de cláusulas que a Casa Civil da Presidência considerara impeditivas de concorrência aberta, ampla e igualitária para todos os possíveis interessados. Além disso, a preocupação no governo continua se agravando. Ainda na sexta-feira, o jornalista Lauro Jardim informava pela internet que a ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, tivera mais uma dura reunião com Moreira Franco, da Secretaria da Aviação Civil, onde se prepara a concessão dos dois aeroportos. Aloizio Mercadante e Fernando Pimentel, que integram o núcleo da Presidência, são outros dois ministros inquietos com os rumos das concorrências.
    Mas o ministério e a Presidência são as instâncias mais altas de responsabilidade sobre os aeroportos e sobre o processo de concessões. É seu o dever administrativo, jurídico e moral de dizer como deve ser o processo. Que poder impede a eliminação completa e definitiva dos indícios de restrições para dirigismo dos resultados, eis o que falta esclarecer.
    O PMDB tem participação nisso, ao lado de grandes empreiteiras. Quem confundirá, ou não, ceder com conceder, será o governo. A história das privatizações aguarda.

      sábado, 12 de outubro de 2013

      José Simão

      folha de são paulo
      Ueba! Marina e Campos: MACA!
      Dilma vai dar uma declaração: "Crianças, vou dar uma voadora se sua mãe não vier trabalhar"
      Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Hoje! Dia da Padroeira e Dia das Crianças. E eu acordei deprimido porque não sou mais criança! E a Nossa Senhora da Aparecida que me perdoe, mas a padroeira do Brasil é a Ladroeira. Nossa Senhora da Ladroeira!
      E como esse ano não tem eleição, não tem político na Basílica. Só o Alckmin. Que é barata de igreja. O Serra Vampiro Anêmico não pode ir. Quando o padre joga água benta, ele dissolve. Rarará!
      E vampiro não tem medo de crucifixo? Não, o crucifixo que tem medo do Serra!
      E a Dilma quando foi pela primeira vez na Basílica, gritou: "Que lindo! Parece uma padaria!". Rarará! E eu disse que vai ter um programa de ajuda ao Eike: Bolsa Famíliax. Todos com xis no nome terão direito. Xisleine, Xisvaldo, Xana e Xuxa!
      Gente, e o discurso da Marina? Uma amiga me disse que a Marina tá parecendo a Menina Pastora Louca! Rarará. E essa fusão Campos-Marina devia ser CAMA! Não tem rede, deita na cama. Se não der certo, a CAMA vira MACA! Rarará! Eu acho que a Marina vai dar uma rasteira e roubar o partido do Eduardo Campos. Que com aquele olho esbugalhado parece o Jack Nicholson em "O Iluminado"! A Menina Pastora Louca e O Iluminado!
      E Dia da Criança! Diz que a Dilma vai dar uma declaração: "Crianças do meu Brasil: a Fadinha do Dente não existe, coelho não bota ovo e eu vou dar uma voadora na sua mãe se ela não vier trabalhar hoje".
      E como disse o chargista Marco Aurélio: criança é a pessoa mais requisitada da casa. "Filho, o Macintosh não deleta." "Filho, dá uma olhada no iPhone da mamãe?" "Netinho, como ligo o celular?" E o filho de um amigo meu pediu de presente: "Um 1x1 com cabo HDMI e um MP3 com 64 GB". E ele não entendeu nada. E a filha duma amiga minha perguntou: "Mãe, o que é orgasmo?". "Não sei, pergunta pro seu pai!" Rarará. É mole? É mole, mas sobe!
      O Brasil é Lúdico! E essa placa no supermercado: "Rabo Salgado, R$ 7,99!". Deviam botar embaixo: "Não recomendado para hipertensos!". Rarará. E olha esse outdoor em Petrolina, Pernambuco: "Governo Federal. Brasil. País Rico é País Sem POPREZA". Rarará! O Brasil acabou com a "popreza". E com a língua portuguesa! Brasileiro escreve tudo errado, mas todo mundo se entende! Nóis sofre, mas nóis goza!
      Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

        Mônica Bergamo

        folha de são paulo

        Caetano, Gil, Djavan e Marisa Monte se reúnem para discutir biografias

        Ouvir o texto

        Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan e Marisa Monte se reuniram anteontem no Rio. Em pauta, a repercussão do posicionamento deles sobre a questão das biografias. Decidiram, em primeiro lugar, contratar uma assessoria que funcione como porta-voz do grupo, reunido na entidade Procure Saber. A ideia é fazer com que seus argumentos sejam divulgados de modo mais claro.
        CHAPA
        Apesar das críticas contundentes que receberam de escritores, jornalistas, editores e outros músicos, o grupo permanece na defesa da manutenção da lei atual. Ela diz que uma biografia só pode ser feita depois de autorizada pelo personagem a ser retratado. Na visão de escritores como Laurentino Gomes, a regra transforma o Brasil no paraíso das biografias chapa-branca.
        CHAPA 2
        Os cantores discutiram argumentos como o de que uma editora pode ganhar milhões com um livro que inclusive abrigue mentiras sobre o personagem que pretende retratar, sem que o atingido tenha instrumentos eficientes para evitar um eventual dano. Muitos ponderaram que é preciso diferenciar a empresa e seu lucro de jornalistas e autores que fazem um trabalho investigativo. Mas continuaram achando que o melhor instrumento para coibir o que consideram abusos é a manutenção da lei em vigor.
        JARDIM DE INFÂNCIA
        O número de crianças com menos de dez anos no Estado de São Paulo é de 5,5 milhões em 2012, segundo dados inéditos da Fundação Seade. Equivale a 20% da população infantil do país. A capital concentra 1,5 milhão das crianças. Com dados dos cartórios, o estudo mostra ainda que nasceram 312 mil bebês do sexo masculino e 297 mil do feminino, em 2012, no Estado.
        NA CABEÇA
        O movimento Psicofobia É Crime, que chama atenção para o preconceito contra pessoas que sofrem de transtornos como autismo, bipolaridade, depressão e TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), ganhou a adesão de Cássia Kiss, Luciano Szafir, Mauricio Mattar e Luciana Vendramini.
        NA CABEÇA 2
        "Cerca de 40 milhões de brasileiros têm algum tipo de transtorno psiquiátrico. É grande a falta de informação e o preconceito, tanto da família quanto dos próprios médicos", afirma Antonio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria. A questão é tema do congresso da especialidade, que ocorre entre os dias 23 e 26, em Curitiba.
        ALTAR
        Zezé di Camargo e Zilu serão padrinhos de casamento de um sobrinho dela, amanhã, em Goiânia. Eles se separaram, mas continuam amigos. "Ainda somos uma família. Só não estamos casados", diz ela. De volta a SP, após temporada em Miami, Zilu afirma estar gostando da nova fase. "É até melhor, porque a relação de marido e mulher tem muita cobrança."
        MENORES FRASCOS
        E Zezé e o irmão Luciano vão entrar na onda do EP (álbum com menos faixas). A dupla lança nos próximos dias "Teorias", com cinco músicas inéditas. "O Roberto [Carlos] lançou esse formato e vendeu muito [2 milhões de cópias]. É uma maneira de competir com os piratões também", diz Zezé.
        CURTO-CIRCUITO
        A mostra "Resistir É Preciso...", sobre a ditadura, começa hoje no Centro Cultural Banco do Brasil, às 11h.
        Tiago Abravanel e o maestro João Carlos Martins fazem pocket show hoje, às 19h, na Brookfield Incorporações, na Lapa.
        Juca Ferreira, secretário municipal de Cultura de SP, estará amanhã, às 19h, no ciclo de debates Movimentos que Queremos, na Casa Fora do Eixo, no Cambuci.
        com ELIANE TRINDADE, JOELMIR TAVARES, ANA KREPP e MARCELA PAES
        Mônica Bergamo
        Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.

        Painel das Letras - Raquel Cozer

        folha de são paulo
        Daqui pra frente
        Só agora, terminando Frankfurt, o governo começa a pensar na próxima homenagem ao Brasil, na Feira do Livro Infantil de Bolonha, daqui a apenas cinco meses, em março de 2014. O orçamento inicialmente previsto é modesto perto do de Frankfurt (R$ 1,3 milhões para o evento italiano, ante R$ 18,5 milhões para o alemão). Também o espaço será menor, com pavilhão de 250 m² (um décimo do tamanho do espaço em Frankfurt, de 2.500 m²). Aliás, as homenagens ao Brasil no Salão do Livro de Paris e na Feira de Londres nos próximos anos, por tanto tempo alardeadas como confirmadas, ainda estavam em negociação nesta semana.
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        // FASE DE CRESCIMENTO
        Embora infantis e infantojuvenis sejam mercado forte no Brasil, sua exportação é irrisória, concluiu a empresa de pesquisa GFK, há um ano acompanhando o segmento editorial no país e presente em outros 13 países. Dos títulos brasileiros vendidos na Europa, 93% são de literatura adulta ou de autoajuda. Os infantojuvenis representam praticamente traço dentro dos 7% restantes. Mas a Feira de Frankfurt trouxe novidades na área. Paula Pimenta e Bruna Vieira, da Autêntica, tiveram vendas para Portugal e Espanha. Thalita Rebouças, já publicada em Portugal e prestes a estrear na Espanha, terá em breve "Ela Disse, Ele Disse" adaptado para mangá no Japão.
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        // UM CÉLEBRE AUTOPUBLICADO
        Um dos autores mais premiados do país, Cristovão Tezza é agora também autopublicado. Tirou do baú títulos fora de catálogo, incluindo sua dissertação de mestrado, criou capas por conta própria e pôs à venda na Amazon, sem divulgar.
        De seu estudo "Entre a Prosa e a Poesia", oferecido a R$ 9,90, vendeu menos de dez e-books em dois meses. Dois romances, "Ensaio da Paixão" e "A Suavidade do Vento" (capas acima), saem respectivamente a R$ 3,99 e R$ 13,90.
        "Cobrei mais pelos que acho melhores", disse, em Frankfurt. Agora, a Record comprou os direitos dos dois romances, mas os digitais ficarão com Tezza mesmo.
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        A vez da poesia A obra de literatura adulta mais vendida em livrarias do país de janeiro a agosto foi "Toda Poesia" (Companhia das Letras), de Paulo Leminski, segundo a pesquisa da GFK. Foram 58 mil cópias. O título ficou à frente de outros como "Armadilhas da Mente" (Arqueiro), de Augusto Cury, "Anjos da Morte" (Verus), de Eduardo Spohr, e "Manuscrito Encontrado em Accra" (Sextante), de Paulo Coelho.
        Timing Em abril, quando o "Huffington Post" estreia sua versão brasileira, a Sextante manda para as lojas sua tradução de "The Third Metric", espécie de guia de bem-estar escrito por Arianna Huffington, uma das fundadoras do site de notícias. A negociação foi fechada na Feira de Frankfurt.
        Retorno Ninguém melhor que um editor celebrado como Jonathan Galassi para saber como o mercado é inglório para estreantes. Mas o presidente da Farrar, Straus and Giroux apresentou seu primeiro romance, "Muse", sobre o universo editorial, na Feira de Frankfurt. Previsto para 2015, foi comprado pela gigante Knopf e para editoras de cinco outros países.
        Do baú Escrito a partir de anotações de Alfred Rosenberg, um dos mentores da ideologia nazista, "The Devil's Diary", de Robert Wittman e David Kinney, foi adquirido pela Record em Frankfurt. Os diários ficaram desaparecidos por mais de seis décadas e incluem um mapa, feito por Hitler, com planos da operação de invasão à União Soviética em 1941.

          Álvaro Pereira Júnior

          folha de são paulo
          Algo de podre
          Quando uma novata assume o cargo mais importante do país, os princípios são logo esquecidos
          Em uma sequência especialmente nauseante, a chefe decide que um de seus colaboradores mais íntegros precisa ser enquadrado. Andava meio rebelde, contestava as linhas de comando. Seria bom tomar um susto.
          "O que temos contra ele?", pergunta a mulher ao marqueteiro de quem não desgruda um segundo.
          "Quase nada", diz o estrategista. Só uma fofoca: que, apesar de político verde, ele coleciona carros antigos, do tipo de que bebe dez vezes mais gasolina que os atuais. Até importou um Cadillac anos 50 de Cuba, onde as banheiras ainda rodam.
          "Vaze isso para a imprensa", ordena a chefe.
          As consequências são devastadoras. O fato de a notícia não ser exatamente nova, de já ter saído antes, pouco importa. O colaborador, homem reto, tem a vida pessoal e profissional destruída pelo pecadilho do Cadillac. E por obra da chefe a quem servia tão fielmente.
          A chefe é Birgitte Nyborg, primeira-ministra fictícia da Dinamarca, personagem central de uma série de TV fascinante, chamada "Borgen". O subordinado que ela apunhalou é um de seus ministros, Amir Dwian, do Partido Verde.
          Em 2012, "Borgen", produção da emissora dinamarquesa DR, fez muito sucesso na BBC de Londres. Mesmo com legendas, coisa a que o público de fala inglesa está pouco acostumado.
          Também chamou a atenção da crítica americana, quando foi exibida em canais alternativos por lá. Chegou a passar no Brasil, no cabo, mas quase ninguém percebeu.
          A boa notícia é que as duas primeiras temporadas saíram em DVD nos EUA. Ficou fácil achar na internet.
          "Borgen" gira em torno de Birgitte Nyborg, interpretada pela magnética Sidse Babett Knudsen, 45, cujo sorriso caloroso é capaz de derreter as mais renitentes geleiras.
          Nyborg comanda um partido pequeno, o Moderado, que apoia causas fofas e politicamente corretas: condenam leis duras de imigração, querem a saúde cada vez mais pública, defendem o estado de bem-estar social típico da Escandinávia, pretendem preservar a natureza.
          A trama começa em uma crise do regime parlamentar. Nenhum dos dois maiores partidos, o Trabalhista e o Conservador, consegue formar um gabinete. Entregar o posto de primeira-ministra à novata Birgitte Nyborg, líder dos moderados, surge como solução conciliadora.
          Se "Borgen" fosse uma série tradicional, mais próxima do padrão americano, mostraria o embate da militante íntegra conta o pântano da política tradicional.
          Mas não é o que se vê. Um pouco desajeitada no começo, Birgitte rapidamente pega o jeito do cargo e faz aquilo que políticos fazem: trai companheiros, esquece quase todos os princípios, guia-se pela obsessão de manter o poder a qualquer custo. Tem seus dramas de consciência, mas são poucos e passam logo.
          A seu lado, inseparável, o marqueteiro Kasper Juul. Figura misteriosa, ele é ex-namorado da principal apresentadora do maior canal da Dinamarca, a jovem, combativa e estonteante Katrine Fønsmark. "Ex" talvez não seja a melhor definição, já que Kasper e Katrine vivem uma relação de idas e vindas.
          Birgitte, a primeira-ministra, tem marido e dois filhos (um menino de oito anos e uma menina de 13). O marido é um executivo importante, que, muito escandinavamente, vinha passando os últimos anos em casa, a cuidar das crianças, para que a mulher se dedicasse à política. Não demora muito para tudo isso ruir. A vida pessoal de Birgitte se transforma em pesadelo.
          O marqueteiro Kasper --que talvez nem se chame Kasper-- esconde o passado "white trash" e um histórico de abuso doméstico quando criança. Foi justamente por ser tão envolto em segredos que a deusa Katrine Fønsmark o abandonou pela primeira vez.
          Katrine, mesmo bela e famosa, vive só, em um apartamento bagunçado de estudante. De vez em quando, se entrega ao primeiro desclassificado que vê pela frente. De vez em quando volta para Kasper.
          Birgitte, Kasper e Katrine são os três pilares que sustentam a narrativa densa e cadenciada de "Borgen".
          A luz é sempre angulosa (estamos perto do polo Norte, afinal). Vive-se de modo impensável para brasileiros --a primeira-ministra continua morando em sua casa de classe média, reuniões ministeriais só têm 16 pessoas (incluindo assessores), os políticos não roubam e muitos deputados vão trabalhar de bicicleta. Os diálogos fluem com naturalidade, sem a concisão forçada de tantas séries americanas.
          "Borgen", e a produção dinamarquesa em geral, não são televisão como a conhecemos. São uma outra TV. Preste atenção.

          Xico Sá

          A criança e a dor do futebol
          Ninguém sofre mais com futebol do que uma criança; aí se forja o homem, o caráter
          Amigo torcedor, amigo secador, ninguém sofre mais com futebol do que uma criança. Nem o mais angustiado dos goleiros na hora do gol, caro Belchior, sofre tanto. Talvez seja a primeira ideia do conhecimento das dores do mundo. Aí se forja o homem, o caráter, aí começa o madureza ginasial completo do menino. Nessa hora todos somos aquele guri, só beiço e lágrimas, da capa do "Jornal da Tarde" na tragédia do Sarriá, em 5 de julho de 1982.
          Fotografado por Reginaldo Manente, um dos gigantes na arte do flagrante esportivo, aquele menino éramos todos nós chorando a eliminação do escrete de Falcão, Zico e doutor Sócrates, um dos maiores times desde que o homem deixou de andar de quatro e fundou a humanidade. Para um pivete, um piá, um pirraia, um cabinha --e outros tantos apelidos de crianças pelo Brasil afora-- nem carece uma Copa para descolorir o universo, basta um jogo qualquer, toda pelada pode se constituir um épico, uma lição de história.
          O futebol é o segundo útero de uma criança em matéria de formação. Nasci em 1962, como na música do Ira!, nasci já bicampeão do mundo com o Brasil de Garrincha e com o Santos de Pelé & grande elenco. As dificuldades materiais, e só materiais, eram muitas no meu Cariri, lá no meu pé de serra. E haja fartura simbólica e futebolística até os anos 1970. Uma coisa compensa a outra, já diria o filósofo da vida simples.
          Signo de homem não é áries, touro, gêmeos, câncer, leão, virgem, balança como este equilibrado cronista. Signo de homem é o seu time. Na maioria das vezes transmitida pelo sangue paterno, em algumas ocasiões pela zebra do destino. É fácil ter nascido nos anos 1960 e ser Santos, Botafogo, Cruzeiro, Bahia, Náutico... É moleza ter sido criança nos anos 1980 e amar o Flamengo de Leandro, Júnior, Andrade, Adílio, Zico... Quem era menino na década de 90 há de lembrar do São Paulo de Cerezo, Raí, Palhinha e Müller e seu Telê no banco.
          Um menino estranho, do tipo que merece cuidados, lembrará, por exemplo, que Dinho, o justiceiro da caatinga, também fez parte desse time. Como também é lembrado por meninos esquisitos do Sport e do Grêmio. O Corinthians, no entanto, tem duas categorias de pequenas criaturas: a que só viu uma taça depois de grande; a geração Japão que abriu os olhos para ser campeã do mundo.
          Há quem diga que a derrota seja uma melhor escola de homem. Talvez forme meninos menos mimados e sem mimimis. Por este critério os velhos corintianos são os caras mais cascudos do planeta. Faz sentido.
          O menino do dedo verde, assim como o Tistu do livro homônimo, estava feliz e com a vida ganha até os oito anos, depois viu o cinza da Segundona, agora amadurece com o seu Palmeiras. Nada como o futebol para formar um caráter e definir uma vida. Parabéns criançada de todas as cores.
          @xicosa