sábado, 16 de novembro de 2013

Regressão continuada - Helio Schwartsman

folha de são paulo
sÃO PAULO - Depois do prefeito Fernando Haddad (PT), o governador Geraldo Alckmin (PSDB) resolveu ampliar o número de séries em que o aluno poderá ser reprovado, desfazendo parte da progressão continuada, que já foi bandeira de administrações petistas e tucanas.
Esse é um daqueles temas permanentes. Ele vai e volta à agenda porque há um desacordo original entre o que a maioria das pessoas pensa sobre educação e a já respeitável massa de dados empíricos acerca do que funciona e não funciona. Lamentavelmente, políticos ouvem mais a heurística popular do que a ciência.
As pessoas, especialmente pais, gostam da ideia de repetência porque imaginam que ela assegura que o aluno aprenda o que foi ensinado. Seus conhecimentos são testados de modo objetivo e, se ele não souber o bastante, será retido, garantindo que todos os que concluam seus estudos de fato dominem o currículo.
O problema com esse raciocínio é que ele é desmentido pelos fatos. Ou melhor, pode até ser que valha para o ensino superior e as séries mais altas, mas não funciona no ensino elementar. Um conjunto de metanálises (estudos que comparam dezenas, às vezes centenas, de estudos) mostra que a retenção não apenas não cumpre o objetivo esperado como pode até piorar o desempenho dos estudantes. Vale a pena aqui conferir os trabalhos de Shane Jimerson.
O repetente pode até se sair um pouquinho melhor num primeiro instante, mas esse efeito desaparece em dois ou três anos. No longo prazo, sua performance tende a ser pior do que a de grupos de alunos semelhantes que foram promovidos.
Considerando que a reprovação tem alto custo financeiro (equivalente a 11% do que se investe na rede básica no Brasil) e faz aumentar os índices de evasão escolar, fica difícil defendê-la em termos racionais.
Alguém já afirmou que o problema da democracia é que ela sanciona os piores vieses cognitivos dos eleitores.
hélio schwartsman Hélio Schwartsman é bacharel em filosofia, publicou "Aquilae Titicans - O Segredo de Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001. 

Painel das Letras - Raquel Cozer

folha de são paulo

O estreante de US$ 2 mi

 Não é juvenil, erótico nem de fantasia o título que, nos últimos dias, foi comprado pela gigante americana Knopf por quase US$ 2 milhões (cerca de R$ 4,6 milhões) --bem mais do que a Vintage Books pagou, em 2012, pelos três livros da série "Cinquenta Tons". A obra é "City on Fire", romance de estreia do crítico Garth Risk Hallberg, 34. Aborda a Nova York dos anos 1970, tem 900 páginas e levou o autor a ser comparado, entre editores que leram trechos para participar do leilão, a Michael Chabon e Thomas Pynchon. No Brasil, quem venceu a disputa (com valores não divulgados) foi a Companhia das Letras. Os direitos cinematográficos ficaram com Scott Rudin, produtor de "Frances Ha".
Fenômeno incompreendido
Publicações internacionais vêm tentando entender o fenômeno "City on Fire", que, representante de uma literatura que se propõe séria, dificilmente venderá tanto quanto "Cinquenta Tons".

O site Vulture fez uma lista com "28 coisas que você pode especular" sobre o livro --já que o autor, colaborador do "New York Times" e do site "The Millions", não dará entrevistas até o lançamento.
Entre outras coisas, cita que o autor publicou em 2007 uma novela com 63 vinhetas associadas a fotos (que não precisam ser lidas na ordem) e que ele adora usar neologismos, como "N3J" (para "novo novo novo jornalismo").
Infantil
Divulgação
As aventuras do garoto Archibald, neto de exploradores famosos, e seus amigos Adelaine e Oliver (imagem) estão no centro de 'Doldrums', de Nicholas Gannon, comprado pela editora WMF Martins Fontes.
Biografia nacional
Aos 80 anos recém-completados, o sociólogo Francisco de Oliveira prepara para a Boitempo a "Biografia Não Autorizada do Brasil", que abordará sociedade, economia e política dos anos Vargas aos dias de hoje.

A obra, prevista para março, promete levantar debate na esquerda ao destacar a necessidade de uma revolução social num país ao qual faltam forças para isso e criticar um PT que se afastou dos ideais, inscrevendo o Brasil numa "hegemonia às avessas" --em que, segundo ele, o dominado conduz a política em benefício do dominante.
Som
"Sejamos todos musicais", reunião de crônicas de Mário de Andrade na "Revista do Brasil", publicadas de 1938 a 1940, quando o paulistano morava no Rio, sai em março pela Ateliê Editorial.

Som 2
Nos textos, o modernista aborda nomes como Radamés Gnatalli e Camargo Guarnieri e compara a produção carioca com a paulistana. "Não acho que se faça aqui música inferior a de São Paulo. [...] Mas a orientação da música pública que se faz no Rio e a sua qualidade é incomparavelmente inferior", escreveu, em 1938.

Menos é mais
Publicado apenas em 2009 na França, com exíguas 64 páginas, "O Corpo Utópico, as Heterotopias" traz Michel Foucault (1926-1984) mais confessional e próximo da literatura.

Menos é mais 2
O volume, feito a partir de conferência de 1966, ganhará edição bilíngue pela N-1 Edições.

Abuso
Da autora de "Assédio Moral", a Bertrand Brasil publica, em 2014, "Abuso de Fraqueza e Outras Manipulações". No livro, a psiquiatra Marie-France Hirigoyen mostra como a
capacidade de manipulação torna as pessoas vulneráveis.

Água
A tradicional livraria nova-iorquina Strand, famosa por oferecer as melhores pechinchas do ramo, anda mal na fita desde que o site DNAinfo noticiou o uso, pela loja, de um sistema de irrigação para tirar moradores de rua debaixo de seu toldo. A intenção foi confirmada por uma vendedora, mas depois a gerência disse que a ideia era só lavar a calçada.


painel das letras Raquel Cozer é jornalista especializada na cobertura de literatura, mercado editorial e políticas de livro e leitura. É colunista e repórter da "Ilustrada", na Folha, desde 2012, com passagem anterior pelo caderno de 2006 a 2009. Foi repórter do "Sabático", no "Estado de S. Paulo", e do jornal "Agora", do Grupo Folha. Também trabalhou nas editoras Abril, Globo e Record. Escreve a coluna Painel das Letras, aos sábados.

Bom Senso,seu moço - Xico Sá

folha de são paulo
 Amigo torcedor, amigo secador, no princípio foi aquele abraço coletivo, o grito de alerta, um "se liga", cartola, um "tome tento", seu Marin, um olha o bom senso, dona Globo. Nesta semana veio o gesto político de classe mais contundente da história do futiba, o manifesto no campo de batalha, e não era apenas por 20 segundos --se a regra é clara, a desobediência civil ficou explícita.
Você mudava de canal e lá estava o mesmo gesto, só trocava o nome dos times, com um bate-bola em que o pé-de-obra, como preferia chamar o doutor Sócrates, mostrou quem manda no jogo.
Rogério Ceni foi na mosca, na sua assertiva: "Isso aqui tem uma conotação muito maior do que imaginam". Bote maior nisso. E, em Itu, óbvio ululante, o gesto foi hiperbólico, gigantesco, naquele São Paulo 2x0 Flamengo.
Ah, se temos que esperar pelo fim da novela, como não esperar mais um pouco pelo início do embate que interessa. Nunca esperei com tanto gosto. Abri uma cerveja e brindei aos velhos rebeldes que abriram caminho, cavaleiros muita vezes solitários no faroeste da cartolagem.
Tintim, Paulo Cézar Caju, tintim, prezado amigo Afonsinho --o homem do passe livre ainda nos anos 1970--, tintim além-mar, meu caro Eric Cantoná, tintim, de novo e sempre, Sócrates Brasileiro, tintim, velhos e novos rebeldes da pelota.
Naquele minuto de Itu passou pela cabeça um longa-metragem. Um jantar inteiro, um dos últimos com o doutor corintiano, em um japonês da ministro Rocha Azevedo, em São Paulo, o olhar atento do zagueiro Paulo André em troca de ideia com o filósofo do calcanhar greco-paraense. Este cronista envelhecido em barris de bálsamo, Kátia Bagnarelli, Vladir Lemos e Mazinho Chubaci --o Sancho Pança do Magrão quixotesco--, por testemunhas oculares da história.
Nesta quarta, guarde a data, 13 de novembro do ano da graça de 2013, isto é história, na noite em que o cosmonauta russo Yuri Gagarin repetia "a terra é azul", em louvor aos cruzeirenses, apontando o dedo lá de cima, mochileiro das galáxias, para o amigo Trajano, mineiro exilado à beira do Capibaribe.
É, como grasna aqui o meu corvo Edgar, o secador-mor do país, se a regra é clara, o poder do pé-de-obra ficou explícito. Nunca é por 20 centavos, nunca é por 20 ou 30 segundos, é para fazer parte do jogo.
E que o país inteiro atinja o bom senso, a imunização racional, como cantava Tim Maia, em nome dos caboclos evoluídos, em nome da leitura, a salvação da história, em nome dos que jogam bola no Cruzeiro ou nos times do salário mínimo convertido ainda em cruzado, em nome do Araripina, o bode do sertão, e de outros times que atuam poucos meses no ano, em nome das bocas que esperam em casa, independentemente do resultado do futebol.
@xicosa

Xico Sá Xico Sá, jornalista e escritor, com humor e prosa, faz a coluna para quem "torce". É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Na TV, participa dos programas "Cartão Verde" (Cultura) e "Saia Justa" (GNT). Mantém blog e escreve às sextas, a cada quatro semanas, na versão impressa de "Esporte".

Mais como nos filmes - Ruy Castro

RIO DE JANEIRO - Saí à calçada e estiquei o braço em busca de um táxi. Passaram vários, todos cheios. Levei 20 minutos para conseguir um. Muito diferente do que acontece nos filmes, em que não apenas o vilão chega à rua e para imediatamente um táxi para fugir, como o herói toma outro segundos depois e começa a perseguição.
No cinema, os bandidos armam uma bomba atômica e a equipam com um mostrador para que o herói saiba a quantos segundos ela vai explodir. Quando o herói, que é um mosqueteiro, enfrenta 20 espadachins, eles o atacam um a um, em vez de todos de uma vez. O herói resiste bem às dezenas de socos que leva dos bandidos, mas geme quando sua namorada aplica um lencinho molhado aos seus ferimentos.
Ao fugir juntos de uma ameaça, o herói e a mocinha insistem em correr de mãos dadas quando fugiriam muito mais depressa se corressem separados. Quando o herói vai ao médico, nunca será por causa de uma diarreia, mas para enfaixar o ombro ou extrair uma bala. O herói só pode ser ferido no braço --jamais será visto mancando ou com uma atadura na cabeça. Ao acordar e pular da cama, toda mulher entrará imediatamente no chuveiro e nenhuma fará xixi.
Os cavalos do cinema são à prova de balas. Todas as invasões de extraterrestres começam pelos EUA. Qualquer monstro tipo morto-vivo, mesmo que recém-saído do túmulo e arrastando os pés ao andar, consegue capturar a mocinha que tenta escapar dele. Quando uma mulher recordar sua infância, será sempre mostrada de tranças, brincando de amarelinha ou pulando corda. Ao pagar uma conta no restaurante, o galã deixará várias notas na mesa --nunca apresentará o cartão ou fará um cheque.
E por aí vai. Estes são alguns dos casos recolhidos no livro "Tous les Clichés du Cinéma", pelo francês Philippe Mignaval. A vida devia ser mais como nos filmes.
ruy castro Ruy Castro, escritor e jornalista, já trabalhou nos jornais e nas revistas mais importantes do Rio e de São Paulo. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas, quartas, sextas e sábados na Página A2 da versão impressa.

José Simão

folha de são paulo

Feriadão! A Marcha dos Vadios!

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! "Babi Rossi termina namoro com filho do Eike." Tá certa! Quem dá aos pobrex, termina pagando a contex do motelzex. Ficou pobrex, levou um pé na bundex! E o pai vai pro semáforo vender MenteX!
E o Zé Dirceu que tá na praia de Itacaré, Bahia. Agora ele vai mudar de banho de sol. O banho de sol continua, só muda o local. E já imaginou estar na praia e receber a notícia de que vai pra cadeia? Morreu na praia! Rarará!
E o Pedro Corrêa, do PP, está esperando a ordem de prisão na fazenda Boa Esperança, município Brejo de Deus! A esperança foi pro brejo.
E o Roberto Jefferson (aaargh) tem cara de delegado de novela da Record!
E a manchete do Piauí Herald: "Dilma autoriza exumação dos restos mortais do DEM". Rarará!
E piada de internet: "Meu filho virou flamenguista, o que eu faço?". "Vai juntando dinheiro pra fiança!". Rarará!
"Meu filho virou são-paulino, o que eu faço?" "Vai juntando dinheiro pro baile de debutantes e pros CDs do Abba!"
"E o meu filho é corintiano, o que eu faço?" "Vai juntando dinheiro pra visita de domingo." Rarará!
E um amigo nesse feriadão levou a namorada pro motel, tirou a cueca e disse: "É pequeno, mas é de coração". E um outro foi passar o feriadão na casa da sogra e só tinha três tipos de comida: enlatada, congelada e queimada.
E na casa de um outro chegou o sogro, a sogra, a cunhada, a prima e o concunhado, a Marcha dos Vadios! Rarará!
Feriadão: A Marcha dos Vadios! E sabe o que uma amiga vai fazer no feriadão? Botar um adesivo na testa: "Tô dando!". Rarará!
E todo feriadão a gente se lembra que BR é abreviatura de buraco. BR-101 quer dizer que tem 101 mil buracos. E que São Paulo é uma cidade rodeada de pedágios por todos os lados!
E um cidadão estava numa fila imensa do check-in, quando a funcionária perguntou: "Qual o seu destino?". "Meu destino é sofrer!" E um outro estava no check-in e a funcionária: "Que poltrona o senhor quer?". "A poltrona da minha casa!" Rarará!
E trabalhar em feriadão dá ziquizira e EMPIPOCA TUDO!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
José Simão José Simão começou a cursar direito na USP em 1969, mas logo desistiu. Foi para Londres, onde fez alguns bicos para a BBC. Entrou na Folha em 1987 e mantém uma coluna que considera um telejornal humorístico.

Mônica Bergamo

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Advogado de pivô do escândalo dos fiscais de SP estuda dizer que crimes foram eleitorais

 A defesa do auditor Ronilson Bezerra Rodrigues, um dos pivôs do escândalo dos fiscais da Prefeitura de São Paulo, estuda argumentar que os crimes, se existiram, foram eleitorais.
PÉ E CABEÇA
"O encaminhamento que o Ministério Público tem dado às investigações, com o envolvimento de vereadores que receberiam dinheiro para campanhas, mostram que as coisas caminham para esse lado. Do ponto de vista jurídico, é uma reviravolta", diz Ricardo Sayeg, advogado de Rodrigues.

É POSSÍVEL
Ele segue: "Ainda não temos um diagnóstico. Mas é uma das possibilidades, se tudo for retratado como um delito eleitoral".

BATE EM CHICO
O advogado de Antonio Palocci, José Roberto Batochio, diz que, caso seja constatado que os fiscais acusados de corrupção também quebraram o sigilo fiscal do ex-ministro, "ficará comprovado mais uma vez que ele é vítima de vazadores militantes juramentados".

BATE EM FRANCISCO
Palocci, que caiu do ministério de Lula quando foi acusado de vazar dados bancários de um caseiro, em 2006, teria tido os próprios dados vasculhados e vazados pelos fiscais na administração de Gilberto Kassab em 2011, segundo testemunha que depôs no Ministério Público. Então ministro da Casa Civil de Dilma Rousseff, Palocci caiu de novo por não explicar o aumento de seu patrimônio, após série de reportagens da Folha.

TCHAU, MALUF
Antonio Amaral, presidente da CDHU, a estatal paulista de casas populares, vai sair do cargo. Ele foi nomeado pelo governador Geraldo Alckmin na cota do PP de Paulo Maluf --que deve apoiar o PT na disputa contra o tucano em 2014.

TUDO SE TRANSFORMA
Os apresentadores Luciano Huck e Flávio Canto, a atriz Fiorella Mattheis e o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) entregaram nesta semana alguns dos prêmios do Trip Transformadores 2013. A cantora Daniela Mercury e o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ) estavam entre os homenageados da noite. O dono da Editora Trip, Paulo Lima, recebeu convidados como o humorista Rafinha Bastos no Auditório Ibirapuera.

Daniela Mercury e Marcelo Freixo são premiados

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Ali Karakas
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A cantora Daniela Mercury foi um dos homenageados no Prêmio Trip Transformadores 2013, que aconteceu na semana passada no Auditório ibirapuera
ESTRELA PRINCIPAL
O escritor Laurentino Gomes planejava escrever a biografia de Tiradentes. Desistiu depois de descobrir que o jornalista Lucas Figueiredo já iniciara pesquisa sobre o personagem.

CAMINHO
Lucas Figueiredo procurou saber --e descobriu que Tiradentes não tem herdeiros que poderiam complicar a publicação da obra.

TELA
E o agente de Laurentino nos EUA foi procurado por uma produtora de lá interessada em transformar "1889", seu livro mais recente, em série.

CARTA DE FORTALEZA
Mais de uma dezena de escritores reunidos em Fortaleza assinaram uma carta aberta defendendo a ação que tenta derrubar, no STF (Supremo Tribunal Federal), a exigência de autorização prévia para a publicação de biografias. E apoiando o projeto do deputado Newton Lima (PT-SP) sobre o mesmo tema. Assinaram o documento biógrafos como Fernando Morais, Paulo César de Araújo, Mário Magalhães e também Lucas Figueiredo.

CURTO-CIRCUITO
Verônica Ferriani canta hoje no Auditório Ibirapuera, às 21h. Livre.
A peça "A Geometria do Absurdo", de Marcio Aquiles, será apresentada amanhã, às 19h30, na SP Escola de Teatro. 14 anos.
A Cia Soma de Dança estreia o espetáculo "A Última Estrada", na Casa das Caldeiras, amanhã, às 21h. Grátis. Livre.
Alexandre Nero faz show de lançamento do DVD "Revendo Amor, com Pouco Uso, Quase na Caixa", no Auditório Ibirapuera, amanhã, às 19h. Livre.
O livro "Butantã, um Bairro em Movimento" (Versal Editores), do fotógrafo Edu Simões, será lançado no dia 27, no terraço do edifício Odebrecht, às 19h.
com ELIANE TRINDADE, JOELMIR TAVARES, ANA KREPP e MARCELA PAES

Mônica Bergamo Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.

Drauzio Varella

folha de são paulo

O vício de comer


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O povo diz que os gordos são mentirosos e preguiçosos, andam pouco e comem mais do que confessam.
Essa visão preconceituosa está por trás do atraso da medicina no tratamento da obesidade. Quando alguém com excesso de peso procura ajuda médica, a única prescrição que leva para casa é a de reduzir o número de calorias ingeridas.
Existe recomendação mais fadada ao insucesso? É o mesmo que aconselhar o alcoólatra a beber com moderação. Quem consegue controlar a compulsão para comer ou beber não engorda nem fica bêbado.
A primeira descoberta relevante no campo da obesidade só aconteceu nos anos 1990, quando Coleman e Friedman relataram que certos ratos obesos eram insaciáveis porque apresentavam um defeito genético nas células do tecido adiposo, que as tornava deficientes na produção de leptina --hormônio ligado à inibição do apetite.
Foi a demonstração inequívoca de que havia fatores hormonais envolvidos na obesidade.
Logo ficou claro, entretanto, que essa visão hormonal era incompleta: 1) São raros os casos de deficiência de leptina. 2) Muitos obesos, ao contrário, produzem níveis mais altos de leptina, insulina e outros hormônios inibidores da fome, mas são pouco sensíveis a seus efeitos.
A visão atual compara a neurobiologia da obesidade à da compulsão por drogas, como cocaína ou heroína.
Quando a fome aperta, hormônios liberados pelo aparelho digestivo ativam os circuitos cerebrais de recompensa localizados no núcleo estriado. Essa área contém concentrações elevadas de endorfinas, mediadores ligados à sensação de prazer.
À medida que o estômago se distende e os alimentos progridem no trato digestivo, há liberação de hormônios que reduzem gradativamente o gosto que a refeição traz, tornando os alimentos menos atraentes. Os hormônios que estimulam ou diminuem o apetite agem por meio do ajuste fino dos prazeres à mesa.
Carboidratos e alimentos gordurosos subvertem essa ordem. São capazes de excitar sensorialmente o sistema de recompensa a ponto de deixá-lo mais resistente aos hormônios da saciedade. Esse mecanismo explica por que depois do terceiro prato de feijoada, já com o estômago prestes a explodir, encontramos espaço para a torta de chocolate.
À medida que o peso corpóreo aumenta, o organismo responde aumentando os níveis sanguíneos de leptina, insulina e outros supressores do apetite.
Como consequência, surge tolerância crescente às ações desses hormônios. Na obesidade, os circuitos de recompensa respondem mal à presença de alimentos no estômago, exigindo quantidades cada vez maiores para disparar a saciedade. Pessoas obesas precisam comer mais para experimentar a mesma sensação de plenitude acessível com quantidades menores às mais magras.
Como defende Paul Kenny, do Scripps Research Institute, da Flórida: "A obesidade não é causada por falta de força de vontade. Como nas drogas causadoras de dependência, a compulsão pela comida provoca um 'feedback' nos centros cerebrais de recompensa: quanto mais calorias você consome, mais fome sente e maior é a dificuldade para aplacá-la".
Essa armadilha não lembra, de fato, a que aprisiona dependentes de nicotina, cocaína, álcool ou heroína? O efeito sanfona não é comparável às recaídas dos usuários dessas drogas? Faz sentido: a evolução não criaria um sistema de recompensa para cada forma de compulsão.
Durante milhões de anos, a sobrevivência de nossos ancestrais esteve ameaçada pela escassez de alimentos. Como ativar a saciedade era preocupação secundária, a seleção natural privilegiou aqueles dotados de circuitos cerebrais mais eficientes em estimular a fome do que em suprimi-la.
Os avanços da culinária, a fartura, a disponibilidade de alimentos industrializados ricos em gorduras e carboidratos, os sucos, refrigerantes, biscoitos e salgadinhos ao alcance das crianças, a cultura de passar horas à mesa e a vida sedentária criaram as condições ambientais para que a epidemia de obesidade se disseminasse.
Segundo o IBGE, há 52% de brasileiros com excesso de peso ou obesidade, número que nos Estados Unidos ultrapassou 70%. Em poucos anos chegaremos lá.


drauzio varella Drauzio Varella é médico cancerologista. Por 20 anos dirigiu o serviço de Imunologia do Hospital do Câncer. Foi um dos pioneiros no tratamento da Aids no Brasil e do trabalho em presídios, ao qual se dedica ainda hoje. É autor do livro "Estação Carandiru" (Companhia das Letras). Escreve aos sábados, a cada duas semanas, na versão impressa de "Ilustrada".