sábado, 26 de outubro de 2013

Morrissey, ex-Smiths, lança autobiografia e bate recorde de vendas na Inglaterra

folha de são paulo

Morrissey, ex-Smiths, lança autobiografia e bate recorde de vendas na Inglaterra


 
ANDRÉ BARCINSKI
CRÍTICO DA FOLHA
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O caso de amor dos britânicos com Steven Patrick Morrissey parece não ter fim.
Mais de 31 anos depois de a banda de Morrissey, The Smiths, lançar seu compacto de estreia, "Hand in Glove", o cantor de 54 anos ainda é capaz de provocar cenas explícitas de fanatismo.
Semana passada, admiradores madrugaram nas livrarias inglesas para comprar o primeiro livro de Morrissey, "Autobiography".

Segundo o jornal "The Guardian", "Autobiography" é o segundo livro de memórias mais vendido na semana de lançamento na Inglaterra desde que a lista começou a ser compilada, em 1998 (o primeiro é de Kate McCann, mãe da menina desaparecida em Portugal, em 2007).Resultado: quase 35 mil cópias vendidas em uma semana, batendo o recorde britânico para autobiografias musicais, que era de Keith Richards ("Vida"), com 28 mil.
O lançamento de "Autobiography" teve todas as marcas da personalidade de seu autor: mistério, muito drama e uma boa dose de arrogância.
Pouco se falou sobre o livro antes do lançamento.
Tanto a editora, a Penguin, quanto o próprio Morrissey não deram maiores informações à imprensa. E muita gente estranhou o fato de o livro ter saído com o selo "Penguin Classics", uma coleção reservada a autores clássicos como Dante, Henry James, Dostoiévski e John Steinbeck.
O fato de a Penguin ter cedido à exigência do cantor e lançado seu livro de estreia em uma coleção reservada a obras-primas da literatura causou polêmica. O jornal "The Independent" afirmou: "O narcisismo tedioso do livro pode prejudicar o nome de Morrissey um pouco, mas arruína o de sua editora".
Ao ler "Autobiography", fica evidente que Morrissey não quis fazer nenhuma concessão comercial ou "jornalística". O livro não tem índice ou divisão por capítulos. Quem quiser alguma história sobre o guitarrista Johnny Marr, parceiro nos Smiths, terá de procurar página a página.
O cantor/autor surpreendeu também com as exigências para lançamentos em outros países: além dos lances em dinheiro, as editoras interessadas devem escrever "cartas de amor" para Morrissey, que supostamente serão lidas por ele e terão peso na decisão de quem leva o livro.
E o único comentário de Morrissey sobre a repercussão do livro foi um texto curto publicado em um site de fãs, em que o cantor fala sobre um trecho que relata um relacionamento com outro homem. "Infelizmente, não sou homossexual, sou humanossexual, atraído por seres humanos. Mas não muitos."
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Confira algumas histórias contadas por Morrissey
Morrissey conta que quase matou a mãe durante o parto: "Minha cabeça era grande demais". E revela que a irmã, Jackie, tentou matá-lo quatro vezes quando ambos eram pequenos.
Morrissey admite ter inveja da verve ácida de Chrissie Hynde, cantora do Pretenders: "Chrissie tem a capacidade de fazer as pessoas gargalharem no funeral de trigêmeos".
Um dos shows mais emocionantes do cantor foi em São Paulo. O público ergueu uma menina no palco. Morrissey se aproximou da fã e percebeu que ela era cega: "Ela me deu um bilhete que dizia: 'Eu não posso te ver, mas te amo'".
Assim que lançou seu primeiro disco solo, "Viva Hate" (1988), Morrissey recebeu a visita de Michael Stipe, do REM: "Quando ouvi 'Everyday is Like Sunday' fiquei com muita inveja de você", disse Stipe.

Análise: Livro de Morrissey é fascinante até a fama, depois se torna chato e mesquinho


 
BEN RATLIFF
DO "NEW YORK TIMES"
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The New York TimesSteven Patrick Morrissey, de Manchester, Inglaterra, ex-vocalista do grupo The Smiths, herói passado e futuro dos incompreendidos, e defensor dos seres humanos e animais indefesos, também é um publicitário inspirado.
O conceito das capas dos discos, ele explica em seu novo livro, "Autobiography", era "tomar imagens que fossem o oposto do glamour e injetar coração e desejo suficientes nelas para que pudessem mostrar a vida comum como um instrumento de poder --ou talvez glamour".
"Autobiography" é um livro tanto aguçado quanto tedioso, tanto enfático quanto desnecessariamente cruel, e saiu na Inglaterra em edição da Penguin Classics.
30.dez.95/Folhapress
O cantor inglês Morrissey, ex-líder da banda The Smiths
O cantor inglês Morrissey, ex-líder da banda The Smiths
A capa do livro irradia poder. Segue o padrão de design da Penguin para livros anteriores ao século 20. Morrissey conseguiu convencer a editora a inclui-lo em uma exclusiva quadrilha de mortos. E ainda que seja um tesouro nacional britânico etc., como é que ele conseguiu isso?
Os melhores trechos do livro, escrito no presente, um modo gramatical comum aos entusiasmos adolescentes, derivam de sua estreita atenção à música, filmes, televisão e atitudes da Inglaterra até o final dos anos 70.
Em suas atitudes extremas, ele parece exatamente meio americano e meio inglês. Uma mistura de "quero isso para ontem" e de modéstia autoconsciente e desapontamento mórbido e reflexivo.
As relações entre ele e outros seres humanos, famosos ou não, são complicadas. Tão logo descreve uma pessoa como dotada de integridade, o leitor pode ficar certo de que ela não demorará a morrer.
Morrissey é um astro pop de talento literário incomum, mas escreveu memórias do tipo mais comum entre os astros pop: fascinantes até o momento em que ele conquista poder verdadeiro e ganha dinheiro suficiente para que proteger seu patrimônio mereça esforço, e depois disso o livro se torna chato e ocasionalmente mesquinho.
As prolongadas disputas judiciais que ele teve com Mike Joyce, baterista dos Smiths, quanto ao esforço deste para receber parcela igual dos royalties da banda ocupam quase 50 páginas.
O livro chega ao final aos tropeços, em uma série de batalhas contra a imprensa, contra supostas declarações desdenhosas de outros músicos, e contra a adoração dos fãs, que lhe causa sentimentos contraditórios.
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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