'Black Orpheus' será lançado na Broadway só com atores negros
NELSON DE SÁ
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
Vinicius de Moraes estreia na Broadway daqui a um ano, no início da temporada teatral nova-iorquina de 2013/14, a tempo de concorrer ao prêmio Tony, com "Black Orpheus", Orfeu Negro.
É um musical escrito pela dupla Charles Möeller e Cláudio Botelho a partir da peça de 1957, "Orfeu da Conceição", e do filme francês dirigido por Marcel Camus em 1959, "Orphée Noir", que também foi baseado na peça de Vinicius, com músicas dele e de Tom Jobim.
Anteontem, Möeller e Botelho, responsáveis por boa parte dos musicais da última década no Brasil, desembarcaram no Rio com um contrato de 46 páginas assinado com o produtor Stephen Byrd --o mesmo de "Romeu e Julieta", que acaba de estrear na Broadway com Orlando Bloom.
"Passamos uma semana em escritório de homens engravatados", conta Botelho. "O dono do projeto agora é o Byrd. A gente foi contratado para escrever o novo musical e já entregou. A família também fez um contrato de cessão de direitos."
Agora o espetáculo entra no ritmo industrial da Broadway, envolvendo "muitos produtores associados", seleção de atores, equipe. O que já está definido é que o elenco será formado inteiramente por atores negros, uma marca das produções de Byrd.
Antes de "Black Orpheus", na Broadway, houve dois musicais não necessariamente brasileiros, mas que adaptavam obras do país: "Magdalena", com música de Villa-Lobos, e "Saravá", baseado em "Dona Flor e seus Dois Maridos", de Jorge Amado.
O primeiro "ficou duas semanas em cartaz", o segundo, "exatamente três dias", descreve Botelho. "Imagina o frio na barriga que a gente tem..." Em "Black Orpheus", ele escreveu o roteiro com Möeller e fez a maior parte das versões das letras para o inglês.
Algumas letras, porém, mantêm as versões de quando foram gravadas por cantores como Frank Sinatra e Ella Fitzgerald. Como os espetáculos na Broadway demandam, em geral, mais de 20 músicas, entrarão outras que não estavam na peça, mas apenas no filme ou até mesmo escolhidas do repertório de Vinicius.
Jaguar/Divulgação | ||
Poeta popular, mas desprezado no meio acadêmico, Vinicius de Moraes faria hoje cem anos
Marco Rodrigo de Almeida
FOLHA DE SÃO PAULO
Poucos brasileiros encarnam tão bem a imagem padrão que se tem de um poeta quanto Vinicius de Moraes.
Nove casamentos, outras tantas paixões arrebatadoras, boêmia irrefreável e fome sem limite pela vida --contrabalançada por uma melancolia que só os mais próximos sabiam reconhecer-- compuseram os 66 anos de vida intensa do escritor, compositor, diplomata, dramaturgo e jornalista.
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"Foi o único de nós que teve a vida de poeta", sintetizou Carlos Drummond de Andrade. O mineiro tímido falava com admiração (e um tantinho de inveja) da "independência de espírito" do colega. E parece ser este, curiosamente, o nó central da recepção acadêmica da obra literária de Vinicius: teria ele gastado muito de sua poesia na própria vida e pouco nos livros?
Vinícius de Moraes
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Vinicius de Moraes, poeta, compositor e diplomata, lê seu livro 'Antologia Poética'
Vinicius de Moraes, que completaria cem anos hoje, é ainda pouco estudado e não tem muito espaço na universidade. Teses e livros de análise dedicados aos seus poemas são poucos, segundo poetas e professores ouvidos pela Folha.
Este deve ser um dos poucos sinais de desdém na trajetória do sedutor Vinicius, ainda mais se levarmos em conta o sucesso mundial de sua carreira na música a partir do final dos anos 1950, com o estouro da bossa nova.
Victor Rosa, mestrando que prepara dissertação sobre Vinicius, diz que quase não ouviu falar dele durante seu curso de letras na UFRJ. "Costumo dizer que o Vinicius é uma espécie de América [time de futebol]. Tudo mundo tem carinho por ele, mas não tem coragem de torcer."
A repercussão crítica da obra de Vinicius ganhou impulso nos últimos anos, quando a Companhia das Letras passou a reeditar seus livros, com organização do também poeta Eucanaã Ferraz.
"Durante muito tempo a universidade esnobou Vinicius, mas ele não precisou dela para se firmar entre os leitores", diz Ferraz. "Suas músicas angariaram novos leitores para a poesia. Hoje há um novo olhar para a obra dele."
A carreira literária de Vinicius de Moraes teve uma trajetória curiosa. Seus primeiros livros, "O Caminho para a Distância" (1933) e "Forma e Exegese" (1935), depois renegados por ele, trazem versos com feição simbolista, de religiosidade opressiva e tom grandiloquente.
A grande virada começa a partir dos anos 1940, quando a sensação de culpa do poeta sai de cena e ganham espaço o erotismo, um ambiente solar e a ode às mulheres.
É a grande fase de Vinicius, com os célebres sonetos de "Poemas, Sonetos e Baladas" (1946) e "Novos Poemas (II)" (1959). Depois disso, seu foco passa a ser a música e a produção em poesia diminui.
"O sucesso com as canções obscureceu o lado poeta. Mas sinto que isso está mudando. Vinicius é o maior sonetista do Brasil, não deve nada aos grandes da língua portuguesa", diz o poeta e tradutor Paulo Henriques Britto.
'FÁCIL DE FAZER'
José Castello conta que escreveu a biografia "Vinicius de Moraes - O Poeta da Paixão" (1994) para lutar contra o estigma de "poetinha" associado a ele. "Há um desprezo grande pelo lirismo de Vinicius, como se fosse algo menor, fácil de fazer. Ficou a imagem de um show man, um homem cercado por belas mulheres, o que acabou prejudicando a avaliação do real tamanho de suas poesias."
Já o professor de literatura brasileira da USP Alcides Villaça diz que Vinicius ainda não foi compreendido de forma integral. "Ele é o poetinha, mas ao mesmo tempo tem um verso que diz 'poeta sou altíssimo'. Ele está nessas duas partes e em tudo o que está no meio disso."
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