Coisas deles
As gentilezas dos governos Dilma, Lula, Fernando Henrique e Sarney tiveram retribuição à americana
Gentileza não gera gentileza, não. Se há pelo menos dez anos são conhecidas da contraespionagem brasileira as salas sem presença humana e com equipamentos de transmissão, alugadas em Brasília pela Embaixada dos Estados Unidos, temos aí outro caso exemplar de gentileza não correspondida. A qual permite supor que, entre suas consequências, estejam a intercepção e a retransmissão, à Agência de Segurança Nacional dos EUA, das comunicações de Dilma Rousseff e de outras autoridades brasileiras.
O subterfúgio de instalações veladas está na essência da espionagem e das ações de sabotagem, mas tem mais de uma resposta eficaz. Não aplicar nem uma delas parece ser um vício brasileiro.
Bem antes do golpe de 1964, militares do Exército constataram que uma agência de turismo na rua Santa Luzia, na Cinelândia, pertinho da embaixada americana ainda instalada no Rio, na verdade era cobertura para um posto da CIA. No mesmo quarteirão, mas na rua México, em frente ao lado da embaixada, descobriram que um curso para sargentos desejosos de fazer vestibular, ou galgar uma promoção, funcionava para cooptar e infiltrar novos agentes da CIA nos quartéis.
A confiança em que o governo Jango nunca seria derrubado e o receio de um caso problemático com o governo americano sustaram qualquer reação. Houve, se houve mesmo, algum monitoramento, que se distingue das outras ações subterrâneas por se limitar à vigilância cautelosa.
Aqueles e vários outros postos identificados estavam sujeitos, porém, a dois tipos de ação defensiva. Uma, política, de exigir que o governo americano desmontasse os postos e recambiasse os estrangeiros em ação neles (o chefe da agência de turismo era um estrangeiro de língua espanhola). Um aborrecimento diplomático, por certo.
A outra ação possível, mais simples e terminante, seria estourar os postos a pretexto de indícios ou denúncias de contrabando, lavagem de dinheiro, funcionamento irregular, essas atividades que a polícia estoura dia a dia. "Ah, era coisa de vocês? Não sabíamos, agora não há mais nada a fazer."
Salas em Brasília com equipamentos ativos dia e noite, e presença humana muito esporádica, só servem para "guardar equipamento como rádio walkie-talkie" no cinismo conveniente à espionagem --como foi na resposta dada ao excelente repórter que é Lucas Ferraz, revelador de documentos da Abin, a Agência Brasileira de Informação, sobre alguns monitoramentos seus.
A soma das muitas e diferentes gentilezas do governo Jango foram retribuídas do modo que se sabe. As dos governos Lula e Dilma, e provavelmente Fernando Henrique e José Sarney, sabe-se apenas que também tiveram retribuição à americana. Sabe-se graças a Edward Snowden.
VERDADES
O múlti José Miguel Wisnik escreveu, a propósito da patética discórdia sobre biografias, que "a história não é da autoria de ninguém, embora da responsabilidade de cada um que escreve". Perfeito. Então, vamos lá.
Chico Buarque, ao negar que dera entrevista ao biógrafo de Roberto Carlos, disse ser o "Última Hora" paulista "supostamente ligado a esquadrões da morte". O jornalista Paulo César Araújo provou a entrevista com a respectiva gravação.
A acusação ao UH foi, porém, endossada por Wisnik, que colaborara no jornal. O dramaturgo Oswaldo Mendes rebateu a versão e seu reflexo sobre Samuel Wainer, com um adendo histórico: "ao voltar do exílio em 1974, Frias, em um gesto de civilidade", ofereceu a Samuel a direção do jornal que fora dele. Wisnik corrigiu-se quanto ao comprometimento do jornal, e manteve o endosso à volta de Samuel, que "voltou ao Brasil dez anos depois do golpe".
Correção da correção da correção: Samuel Wainer esteve exilado três anos e meio e voltou ao Brasil em 1967. Reassumiu o UH do Rio, quebrou, e foi para SP. Por fim, lembro que nunca existiu "a Universidade Nacional (atual UFRJ)", citada no Globo pelo autor de "As universidades e o regime militar", professor Rodrigo Motta. Houve a longeva Universidade do Brasil.
Aguardo correções às minhas correções.
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