Muitas empresas procuram ONGs da área ambiental apenas para fazer "greenwashing" -marketing verde e do bem sem efeitos práticos maiores-, critica o australiano Scott Poynton, presidente da ONG internacional The Forest Trust.
A entidade ajuda empresas a "limpar" a sua cadeia de produção, selecionando, por exemplo, fornecedores que não causam desmatamento.
Scott Poynton, presidente da ONG The Forest Trust |
No Brasil, a ONG trabalha com empresas como Natura, Grupo Pão de Açúcar e Camargo Corrêa.
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Folha - Como a organização se banca? Vocês recebem dinheiro das empresas?Scott Poynton - Sim. Cerca de 90% da nossa receita vem daí. Outros 10% são de fundações que nos apoiam.
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Como vocês avaliam as empresas cujo dinheiro mantém a ONG, não pode surgir um conflito de interesses?Você tem de ter valores. E é importante deixar claro que você não quer parceiros a qualquer custo. Nós falamos: "Não trabalhe conosco se você não quer mudar".
Nosso trabalho é ajudar as empresas a limpar a sua cadeia de produção, tanto pelo aspecto ambiental quanto pelo social.
Ajudamos a implementar novas políticas, por exemplo, na gestão ambiental de fazendas e de florestas. Quem são os fornecedores? Como eles trabalham?
Nosso objetivo não é dizer à empresa "vocês têm de salvar o mundo", mas "ser sustentável aumenta o valor da sua marca, reduz seu risco, aumenta a receita". Se a empresa entende isso, tudo muda.
Tivemos experiências ruins com empresas que não queriam mudar -mudar é desconfortável para muitas. Em geral, as empresas não reagem bem a críticas. E nós tentamos ser muito transparentes no que estamos fazendo.
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Mas não há muitas empresas que procuram apenas
"greenwashing"[propaganda verde, sem que existam ações ambientais de
fato]? A sustentabilidade não acaba sendo um conceito mais ligado ao
marketing do que às operações?Sim, há muito "greenwashing", uma busca por melhorar a imagem. E acho que muitas empresas procuram ONGs para isso.
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O que vocês fazem quando a empresa não muda? Falam para ela ir embora?Nós somos mais cuidadosos com relação a com quem trabalhamos agora. No começo, há 15 anos, tivemos dificuldades com algumas empresas. Uma grande empresa nos ofereceu uma doação generosa para que continuássemos como parceiros. Não aceitamos, claro, e terminamos a parceria.
Embora as empresas com que deixamos de trabalhar saiam da nossa lista de parceiros no site, evitamos um anúncio público, pois um dia elas podem mudar e voltar a buscar uma cadeia de produção sustentável.
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Nos últimos anos a sustentabilidade, especialmente no que se refere a
aquecimento global, parece ter perdido algum apelo na opinião pública e
entre os políticos. Nos EUA, muitos parlamentares questionam o
aquecimento global, por exemplo. A agenda ambiental anda meio fora de
moda?Por um lado, eventos como o tufão das Filipinas, com milhares de pessoas mortas, mostram que devemos ter cuidado com a mudança climática. Por outro, há essa tendência política da qual a Austrália é um exemplo.
O primeiro-ministro que acaba de assumir [o conservador Tony Abbott] basicamente não acredita no aquecimento global e cortou todo o financiamento de programas de redução das emissões de carbono.
No fim das contas, de maneira geral os governos que têm sido eleitos não encaram o problema de forma enfática. Há uma falta de ação. O problema é que o desafio do aquecimento global tem de ser enfrentado, não se pode deixar a conta para os nossos netos.
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Está começando agora a 19ª Conferência do Clima da ONU. O senhor está pessimista?Acho que o mais importante sobre isso é perceber que dificilmente uma solução de cima para baixo vai ajudar contra o aquecimento global.
Creio que consumidores mais conscientes exigirão das empresas uma nova atitude, uma maior consciência sobre as suas cadeias de produção.
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