sábado, 9 de novembro de 2013

Julio Abramczyk

folha de são paulo

A doença de Chagas na Amazônia

Ouvir o texto

A doença de Chagas está sendo considerada emergente na região amazônica. Ela vem ocorrendo por meio de surtos agudos associados ao consumo de suco de açaí.
A contaminação ocorre pelas fezes do "barbeiro" no suco ou do inseto triturado junto com a fruta.
No último número da "Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical", Rita de Cássia de Souza Lima e colaboradores da Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado e Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas, em Manaus, descrevem as características da transmissão da doença, há três anos, nas vizinhanças de de Santa Isabel do Rio Negro.
Lembram, também, os surtos nas cidades de Tefé, em 2004, e Coari, em 2008.
Na transmissão da doença em outras áreas, surgem inchaço facial e irritação na epiderme quando a deposição das fezes contaminadas pelo inseto ocorre na pele; na transmissão oral, febre acompanhada por dor muscular e fraqueza tem início súbito.
Como a região amazônica é habitada por mais de 30 milhões de pessoas, os autores destacam ser fundamental manter os testes de malária com os exames para Chagas nos casos suspeitos.
Os autores acrescentam a necessidade de manutenção do atual sistema preventivo de vigilância para diagnosticar e tratar os casos autóctones e importados para impedir a dispersão e intensificação da transmissão endêmica da moléstia de Chagas na Amazônia.
Julio Abramczyk
Julio Abramczyk, médico formado pela Escola Paulista de Medicina/Unifesp, faz parte do corpo clínico do Hospital Santa Catarina, onde foi diretor-clínico. Na Folha desde 1960, já publicou mais de 2.500 artigos. Escreve aos sábados na seção 'Saúde'.

Entrevista - Francisco de Oliveira

folha de são paulo
Assustaram os donos do poder, e isso foi ótimo
AO COMPLETAR 80 ANOS, SOCIÓLOGO FAZ BALANÇO POSITIVO DA ONDA DE PROTESTOS NO PAÍS E CRITICA O 'VIOLENTO' MODELO BRASILEIRO DE CRESCIMENTO
RICARDO MENDONÇADE SÃO PAULOSocialista inveterado, acadêmico prestigiado, parceiro rompido de Fernando Henrique Cardoso e Lula, o sociólogo Francisco de Oliveira completou 80 anos na última quinta sem qualquer sinal de afrouxamento da energia crítica.
Em entrevista em seu apartamento, em São Paulo, falou com entusiasmo dos protestos de rua ("a sociedade mostrou que é capaz ainda de se revoltar") e criticou as principais figuras da cena política.
A presidente Dilma Rousseff é uma "personagem trágica" que deu uma "resposta idiota" às manifestações de junho. Lula "está fazendo um trabalho sujo". Marina Silva é uma "freira trotskista". O Bolsa Família, "uma declaração de fracasso". E por aí vai.
Oliveira não teme expor suas posições ousadas. Uma delas é separar o Brasil para resolver a questão indígena: "Há um Estado indígena. Ninguém tem coragem de dizer".
-
Folha - Oitenta anos. Que tal?
Chico de Oliveira - Oscar Niemeyer disse que a velhice é uma merda. Não sou tão radical. Mas não tem essas bondades que se diz. A história de que se ganha em sabedoria é uma farsa. Não é bom envelhecer. As pessoas sábias deveriam morrer cedo [risos].
Antigamente era assim. Longevidade é uma novidade, né?
É recente mesmo. Não é façanha sua. É a economia que te leva até os 80. As condições de vida mudam, você não precisa de trabalho pesado. Quem condiciona tudo é o trabalho. E gente da minha classe social está apta a aproveitar essas benesses do desenvolvimento capitalista. Mas não é agradável. E não há solução. Você vai se matar para poder não cumprir os desígnios de sua classe social?
O senhor se surpreende aos 80. Em junho, falou do ineditismo dos protestos. Qual é o saldo?
Deu uma coisa ótima: a sociedade mostrou que é capaz ainda de se revoltar, ir para a rua. Não precisa resultado palpável. Assustaram os donos do poder, e isso foi ótimo. Eu falava inédito porque a sociedade brasileira é muito pacata. A violência é só pessoal, privada, o que é um horror. Quando vai para a violência pública, as coisas melhoram. Isso que interessa: um estado de ânimo da população que assuste os donos do poder.
Assustou mesmo?
Assustou. Foi mesmo inédito. Isso é bom para a sociedade. Não é bom para os donos do poder. Mas são eles que a gente deve assustar. Se puder, mais que assustar, derrubá-los do poder. Não acho que as manifestações tenham esse caráter. Mas regozijo-me porque foi manifestado o não conformismo.
Aí a presidente Dilma lançou a ideia de Constituinte para a reforma política. O que achou?
Eu achei idiota. Não gostaria de fazer uma avaliação precipitada do governo Dilma para não dar força à direita, que está em cima dela. Mas é uma resposta idiota. Ninguém resolve problema assim na Constituição.
O que teria sido adequado?
Reconhecer que o país está atravessando uma zona de extrema turbulência devido ao crescimento econômico. É o crescimento que cria a turbulência, não o contrário. Todos pensam que crescimento apazigua. Não é verdade. Ele exalta forças que não existiam. O capitalismo é um sistema violentíssimo. Os EUA, o paradigma, são uma sociedade extremamente violenta. O Brasil vive adormecido. De repente, o tipo de crescimento violento e tenso em pouco tempo quebra as amarras, e a violência vai para rua.
Mas Dilma é criticada pelo baixo crescimento.
Não é verdade. O país cresce de forma violentíssima nos últimos 20 anos. E é um crescimento diferenciado. Não dá mais para ser no campo. Agora é na cidade, com relações público-privadas diferentes. Se o Estado não tem políticas para tal, é melhor ficar calado do que dizer besteira.
E o que achou do papel dos governadores?
Esse [Geraldo] Alckmin é uma coisa... É bem o representante dessa política. Um ser anódino. Já o chamaram picolé de chuchu. Ele de fato não desperta paixões nem ódio. Em geral é assim. Não tem nenhum governador que inspire empolgação. Tudo conformado. E a imprensa tem um papel horroroso: o que for conformismo, exalta; o que for rebeldia, condena.
Que avaliação o senhor faz do movimento "black bloc"?
Boa avaliação. Se eles se constituem como novos sujeitos da ação social, é para saudar. Vamos ver se, com eles, a gente chacoalha essa sociedade conformista. Parece que tudo no Brasil vai bem. Não é verdade. Vai tudo mal. O Estado não age no sentido de antecipar-se à sociedade que está mudando rapidamente. E aí vem o Lula fazendo um trabalho sujo, aquietar aquilo que é revolta.
Trabalho sujo?
Ah, tá. A questão operária tem a capacidade de transformar o Brasil e ele está acomodando, matando a rebeldia que é intrínseca ao movimento. Rebeldia não quer dizer violência, sair para quebrar. É um comportamento crítico.
Onde o senhor vê isso no Lula?
Em tudo. Lula é um conservador, nunca quis ser personagem do movimento [operário]. Na Presidência, atuou como conservador. Pôs Dilma como uma expressão conservadora. Você não vende uma personalidade pública como gerente. Gerente é o antípoda da rebeldia. Ele a vendeu como a gerentona que sabe administrar. É péssimo. O Brasil precisa de políticos com capacidade de expressar essa transformação e dar um passo a frente. Não se pode nem ter uma avaliação mais séria dela, pois ele não deixa ela governar. Atrapalha, se mete, inventa que é o interlocutor. Ela não pode nem reclamar. É uma cria dele, né?
O sociólogo Boaventura Santos disse que Dilma tem insensibilidade social. Citou problemas com movimentos sociais, indígenas, camponeses, meio ambiente. Concorda?
Não diria com essa ênfase. É um equívoco analisar o capitalista brasileiro nos moldes europeus. Aqui nunca teve campesinato, pois teve uma propriedade extremamente concentrada do escravismo. Isso se projetou depois numa economia capitalista. O que tem é uma questão urbana grave, que é preciso resolver.
Mas problema indígena tem.
É um problema. Porque a sociedade só sabe tratar indígena absorvendo e descaracterizando. Para tratar dessa questão é preciso, na verdade, de uma revolução de alto nível. Qual é? É reconhecer que há um Estado indígena.
Estado indígena?
É. A real solução. Há um Estado indígena. O Estado capitalista no Brasil não sabe tratar essa questão. Só sabe tratar indígena atropelando, matando, trazendo para a chamada civilização. A real solução é de uma gravidade que a gente nem pode propor. Um Estado indígena. Separa. Ninguém tem coragem de dizer isso. Então todo mundo quer integrar. Para integrar, você machuca, mata, dissolve as formações indígenas.
E meio ambiente,sensibiliza?
Não acredito que seja uma forma de fazer política. A Marina Silva está aí. Ela não tem nada a dizer sobre o capitalismo? Será? Será que a política ambiental é ruim? Ou é o capitalismo que é ruim? Ela não diz. Então, para mim a Marina é uma freira trotskista [risos]. Cheia de revolução sem botar o pé no chão. Ela juntou com o Eduardo Campos, uma jogada política importante. Mas eles não têm proposta nenhuma. A Marina fica com esse ambientalismo démodé. Criticar a política de meio ambiente é fácil. Quero ver criticar o sistema capitalista nas formas em que ele está se reproduzindo no Brasil. Aí sim é botar o dedo na ferida.
O senhor disse que a política da Dilma é conservadora. Diria que ela é de direita?
Não diria. Ela é um personagem difícil, coitada. Uma personagem trágica. Porque ela não pode fazer o que ela se proporia a fazer. Ela tem uma história revolucionária. Mas não pode fazer isso porque está lá porque Lula a colocou. E Lula é o contrário, um antirrevolucionário. Ele não quer soluções de transformação, quer apaziguamento. Talvez, se as opções estivessem em suas mãos, Dilma faria uma política mais de esquerda. Mas ela não foi eleita para isso. Nem tem força social capaz de impor essa mudança.
O senhor vê alguma virtude?
O pouco de virtude é, talvez, dar um pouco mais de atenção à área social. Que eu não gosto, porque é um conformar-se em não resolver. O Bolsa Família é uma declaração de fracasso. Para não morrer de fome, dá uma comidinha. Sou socialista há 50 anos. Para mim, a gente tem de mudar. E não necessariamente por revolução violenta, que está fora de moda. Bolsa Família é política conservadora. Atende uma dimensão da miséria, mas sem promessa de transformação.
    RAIO-X - CHICO DE OLIVEIRA
    Sociólogo, 80 anos
    CARREIRA
    Professor titular aposentado da USP, foi coordenador da Sudene até o golpe de 1964
    VIDA ACADÊMICA
    Graduação em ciências sociais pela UFPE (1956); pós-doutorado pela Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales (França, 1984)
      pRINCIPAIS LIVROS
      CRÍTICA À RAZÃO DUALISTA (1972)
      EDITORA Cebrap
      TEMA Critica a tese de que o país ficaria estagnado porque o setor arcaico barrava o avanço da indústria e mostra como o capital se alimentava do atraso
      CRÍTICA À RAZÃO DUALISTA/O ORNI-TORRINCO (2003)
      EDITORA Boitempo
      TEMA Sustenta que a elite sindical tornou-se uma nova classe social ao controlar verbas do BNDES e dos fundos de pensão das estatais

      Helio Schwartsman

      folha de são paulo
      Briga de cachorro grande
      SÃO PAULO - Essa polêmica em torno da neutralidade da internet não me comove. É certo que a definição terá algum impacto na vida do consumidor, mas ele é menor do que sugerem ambos os lados da disputa.
      O que temos, no fundo, é uma briga de cachorro grande. De um lado, estão os provedores de banda larga, notadamente as telefônicas, e, de outro, megaempresas que fazem uso intensivo das estruturas de transmissão, como Google, Netflix, Microsoft etc.
      Se a neutralidade for aprovada, as telefônicas ficam legalmente impedidas de cobrar a mais de empresas e indivíduos que demandam mais da rede e terão de bancar sozinhas os investimentos necessários para manter e ampliar a capacidade da internet. Na outra hipótese, se conseguirem impor uma tarifa mais alta aos usuários pesados, dividirão a fatura principalmente com as pontocom.
      No final, como ensina qualquer manual de economia, é sempre o consumidor que arcará com os custos. Dá para escolher se eles vêm embutidos na conta do provedor ou na dos serviços e bens adquiridos.
      Seria um exagero dizer que toda a disputa se resume a esse aspecto tarifário, mas ninguém me tira da cabeça que isso é o mais importante.
      Os defensores da neutralidade dizem que, se a lei não impuser a obrigação de todos os dados receberem o mesmo tratamento, o caráter democrático da internet fica ameaçado, já que os provedores poderiam discriminar usuários, fornecendo acesso mais precário, por exemplo, a empresas concorrentes, a pobres, que não poderiam pagar pelo acesso "premium", e até a sites que tragam mensagens políticas de que não gostem.
      É forçoso reconhecer que a possibilidade existe, mas esse me parece um cenário meio paranoico e que fica tanto mais improvável quanto maior for a concorrência entre provedores. No mais, vale lembrar que a rede já não é neutra. Internautas e empresas mais ricos já contam com acesso privilegiado. E não apenas à internet.
      helio@uol.com.br

        Editorial FolhaSP

        folha de são paulo
        Kassab se complica
        Em conversas gravadas com autorização da Justiça, fiscais sugerem que o ex-prefeito tinha conhecimento de esquema de corrupção
        Se para 2014 já não eram estimulantes as perspectivas eleitorais do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD), elas se rebaixaram ainda mais após serem reveladas gravações de conversas dos acusados de integrar a chamada Máfia do ISS (Imposto sobre Serviços).
        Noticiado há uma semana, o esquema de corrupção alcançou dimensão impressionante. Estima-se que os cofres públicos tenham perdido pelo menos R$ 500 milhões em impostos que deveriam ter sido recolhidos por diversas empresas, mas que não foram pagos devido à intervenção de quatro fiscais responsáveis pela arrecadação.
        Estes, em troca de polpudas propinas, agiam na contramão de seu dever funcional e livravam as empresas de parte das obrigações tributárias. Calcula-se que, desde 2007, o grupo tenha acumulado um patrimônio de R$ 80 milhões.
        A Controladoria Geral do Município, órgão criado pelo prefeito Fernando Haddad (PT), não precisou de muito esforço para perceber a incompatibilidade entre os vencimentos e a riqueza desses servidores. Investigações posteriores, feitas pelo Ministério Público, levaram à prisão dos quatro fiscais.
        Como três deles ocuparam cargos de confiança na administração passada, Kassab logo se viu chamuscado pelo episódio, embora Haddad tenha reiterado que não havia indícios de envolvimento das autoridades políticas.
        Uma semana depois, Kassab aparece em meio a um incêndio de grandes proporções. Gravações autorizadas pela Justiça e obtidas por esta Folha trazem diálogos com potencial devastador.
        "Chama o secretário e o prefeito com quem eu trabalhei. Eles tinham ciência de tudo", afirma Ronilson Bezerra Rodrigues, acusado de liderar o grupo, em conversa com a chefe de gabinete da secretaria de Finanças da gestão anterior. Não parece haver dúvidas de que o "prefeito" citado é Kassab.
        Em outra gravação, os termos são ainda mais explícitos. Um homem não identificado diz: "Minha esperança é Kassab ganhar a eleição para governador". O fiscal Luis Alexandre Magalhães concorda: "É, pois é, aí tá todo mundo bem". Então o primeiro lamenta: "Mas acho que ele não ganha, não".
        De fato, Kassab não reunia condições reais de disputar o cargo em 2014. Sua intenção era fortalecer a bancada do PSD e manter seu nome na cabeça dos eleitores. Agora, até essa estratégia está em xeque.
        Ainda que o ex-prefeito declare serem falsas as afirmações dos servidores e mesmo com os sinais de que o esquema era suprapartidário, será difícil para Kassab desvincular sua imagem desse escândalo.
        Para que esse ponto seja esclarecido, bem como o eventual envolvimento de outros políticos, a investigação precisa avançar com a maior celeridade possível, sem recair no vício de transformar-se em arma de perseguição, ou preservação, partidária.

          Andre Singer

          folha de são paulo
          Ataque especulativo
          Dias atrás, em rara declaração ofensiva desde a suspensão do ensaio desenvolvimentista há cerca de um ano, o governo, por meio do secretário do Tesouro, Arno Augustin, denunciou estar sob ataque especulativo do mercado financeiro.
          Ato contínuo, como para confirmar a acusação, o dólar foi empurrado para cima, como se viu nesta semana. Por enquanto, os efeitos da pressão mercadista são moderados, mas há razões para supor que ouvimos só os primeiros toques de uma ópera dramática, que apenas acabará quando anunciado o nome do(a) próximo(a) presidente da República.
          A julgar pelos instrumentos mobilizados, a partitura contém passagens marciais tonitruantes. No plano internacional, um arco expressivo de intérpretes já tomou assento nas fileiras da orquestra.
          Quando setembro chegava ao fim, a revista "The Economist" dedicou 14 páginas para mostrar como o intervencionismo de Dilma tinha estragado tudo o que Lula fez de bom. Em seguida, a Moody's, uma das três principais agências mundiais de risco, rebaixou a perspectiva de avaliação do Brasil. Para completar, há duas semanas o FMI emitiu relatório em que a condução governamental é criticada por reduzir a credibilidade do país.
          Em diversos arranjos, a linha melódica narra sempre a mesma história. Uma nação que era bem-vista pelos donos do dinheiro, pois tinha se arrumado de acordo com as regras imperantes no mundo, passa a ser objeto de desconfiança depois que um Poder Executivo hostil às leis da iniciativa privada resolveu mexer onde não devia, reduzindo juros, interferindo no câmbio e obrigando o setor elétrico a diminuir tarifas, só para ficar no principal.
          Se a companhia fosse composta apenas de artistas globalizados, o tamanho da encrenca já seria razoável. Ocorre que se anunciam na boca de cena cantores que encenarão as partes locais do entrecho, prometendo sangue, suor e lágrimas. Desta feita, diferentemente do que aconteceu entre 2002 e 2010, os capitalistas nacionais parecem uníssonos na hostilidade à candidata do lulismo. Admitem até a volta do criador, mas passaram a enxergar a criatura com um misto de medo, raiva e desdém.
          Talvez seja esta a explicação para os últimos movimentos do ex-presidente, que teria patrocinado um projeto de dar autonomia ao Banco Central para, em seguida, deixar transparecer que pode voltar a ser candidato. Em ambos os casos, haveria uma leitura segundo a qual para desfazer o roteiro anunciado, que tem capacidade para desorganizar a economia e, assim, colocar em risco a vitória em outubro de 2014, são necessários gestos fortes.
          A ideia de autonomizar o BC foi vetada por Dilma. Resta ver se o próximo veto não vai recair sobre ela própria.
          avsinger@usp.br

            Ruy Castro

            folha de são paulo
            A sério
            RIO DE JANEIRO - Olhei e vi. Dentro de uma caixa de vidro no Museu do Cinema, em Frankfurt, uma pilha de latas de filme. Ao lado, uma placa com a inscrição: eram os rolos originais de "Tystnaden", de Ingmar Bergman. Nem pisquei: "Tystnaden", de 1963, chamou-se no Brasil "O Silêncio" e ficou famoso por levar anos proibido. Liberado em 1965, viu-se que não tinha nada demais --um ou outro incesto ou lesbianismo, aquelas coisas de filme sueco.
            Os meninos da Geração Paissandu --um cinema de arte no Flamengo, nos anos 60-- só tratavam os filmes pelos títulos originais. Ninguém diria "Um Corpo que Cai", de Hitchcock, quando podia dizer "Vertigo", nem contava vantagem por isso. Os de Bergman, todos sabiam: "Noites de Circo" era "Gycklarnas Afton"; "Sorrisos de uma Noite de Amor" era "Sommarnattens Leende"; e "Morangos Silvestres", "Smultronstället".
            Mais difíceis eram os japoneses --"Contos da Lua Vaga", de Mizoguchi, era "Ugetsu Monogatari"; "Harakiri", de Kobayashi, era "Seppuku"; e "Homem Mau Dorme Bem", de Kurosawa, era "Warui Yatsu Hodo Yoku Nemuru". Com pronúncia certa ou errada, era como chamávamos os filmes.
            Além disso, títulos em português eram um perigo. Um dia alguém se referiu a "Prima della Rivoluzione", do Bertolucci --"Antes da Revolução"--, como "A Prima da Revolução". Que gafe! Era como chamar "Les Cousins" --"Os Primos", de Claude Chabrol-- de "Os Cuzinhos". Ou "Les 400 Coups" --"Os Incompreendidos", de Truffaut-- de "Os 400 Cus".
            Nunca pensamos que, no futuro, os tradutores intitulariam --a sério-- "After Hours" (tarde da noite), de Scorsese, como "Depois de Horas"; "The Day After Tomorrow" (depois de amanhã), de Roland Emmerich, como "O Dia Depois de Amanhã"; e "Whatever Works" (qualquer coisa que dê certo), de Woody Allen, como "Tudo Pode Dar Certo".

              José Simão

              folha de são paulo
              Novela! César é pai dos beagles!
              A Dilma vai contratar um espião português. 'Meu nome é Bond. James Bond'. 'Meu nome é Kim. Joaquim'.
              Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! E um amigo com colesterol fazendo supermercado: "Posso, mas não gosto". "Posso, mas não gosto". "GOSTO, MAS NÃO POSSO!".
              E um leitor me disse que o Maluf não vai morrer: vai transitar em julgado. Rarará! E adorei a charge do Pelicano com os malufistas se desintoxicando. Deve ser a AMA: Associação dos Malufistas Anônimos: "Meu nome é Walter! Eu também fui eleitor do Maluf por vários anos". Eu acrescento essa: "Meu nome é Natália! Eu também fui eleitora do Maluf por vários anos. Mas já superei: votei no Russomanno". Rarará.
              E o Maluf lançou sua biografia: "Ele". Mas os advogados de defesa acharam melhor mudar o nome para "Não Foi Ele". Rarará!
              E as prostitutas mineiras? Minas sempre na vanguarda. Tô adorando essas prostitutas mineiras que já aceitam cartão de débito e crédito. É o Xotacard. Ou Cartão Fodalidade. Rarará. E não se esqueça: beijo na boca, só no débito! E em vez de rodar a bolsinha, estão rodando as maquininhas! Rarará!
              E essa: "Justiça manda Alckmin refazer ação contra a Siemens". Evidente! O Alckmin processando a Siemens é a mesma coisa que o Maluf processando as construtoras que o deixaram rico. Ou como disse um amigo: "O Alckmin processar a Siemens é como se a minha mulher pegasse marca de batom na minha cueca e eu processasse o puteiro". Rarará!
              E atenção! Espionagem e contraespionagem! Diz que a Dilma vai contratar um espião português, o Joaquim. "Meu nome é James. James Bond". "Meu nome é Kim. Joaquim". Rarará! Usa jaqueta, boné, óculos escuros, tem crachá e faz carnê nas Casas Bahia. E no item profissão escreve: espião.
              E espião bom é aquele que desceu no aeroporto, tomou um táxi e o taxista: "Para onde o senhor vai?". "JAMAIS SABERÁ!". Rarará.
              E eu já disse que o Planalto não precisa de espião porque o Mantega já é a cara do Agente 86! E o sapato é da Dilma! Rarará!
              É mole? É mole, mas sobe!
              E a novelha "Amor à Vida"? "Amor à Bimba"! Uma amiga disse que o César é pai da Nicole, da Natasha, dos beagles do Instituto Royal e do Rei do Camarote! O César é pai dele mesmo! Eu acho que também sou filho do César! Eu sou um beagle! Rarará!
              Nóis sofre, mas nóis goza! Hoje, só amanhã!
              Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!