'The Good Wife' chega aos cem em boa forma
Emily Nussbaum, a excelente crítica de séries da revista americana "The New Yorker", certa vez argumentou que "The Good Wife" era a primeira grande série de TV sobre tecnologia, dado o número de casos envolvendo o tema em que seus protagonistas trabalharam. Faz sentido e há mérito, mas a série que completa hoje cem episódios nos EUA é bem mais que isso.
O que "The Good Wife" não é, aliás, é exatamente aquilo que ela parece à primeira vista: um drama -mais um- sobre advogados. E parecer com um, sem o ser, tem garantido que a série envelheça bem, até cada vez melhor.
Jeff Neira/Divulgação/CBS | ||
Os atores T.R. Night, Mike Pniewski e Alan Cumming em cena da série |
Sob a trama simples, mulher-de-político-com-a-vida-ganha-se-descobre-traída-e-decide-retomar-carreira-nos-tribunais, a série foi capaz de tratar de política e do papel da mulher (para ficar nos temas grandes) com a mesma sutileza que valeu à interpretação irretocável de Julianna Margulies um Emmy, um Globo de Ouro e um prêmio do sindicato dos atores.
É possível, a partir dela, tecer debates sobre como as mulheres de candidatos e primeiras-damas são simultaneamente objeto de fascinação e desdém nos EUA (a série começou em 2009, após uma onda de revelações de casos de políticos proeminentes) e de como elas frequentemente anulam seu potencial para assumir um papel de, vá lá, boa esposa (Michelle Obama que o diga).
É possível, até, fazer uma tese sobre estereótipos femininos no mercado de trabalho e na TV a partir de sua vasta amostragem de personagens mulheres.
Mas é possível, também, apenas relaxar e se divertir, focando seja o enredo central seja os sub-roteiros que se desenvolveram a partir dele em quatro anos e meio, alinhavados com uma sofisticação rara para a TV aberta dos EUA.
Mas é possível, também, apenas relaxar e se divertir, focando seja o enredo central seja os sub-roteiros que se desenvolveram a partir dele em quatro anos e meio, alinhavados com uma sofisticação rara para a TV aberta dos EUA.
Um ingrediente para tanto é o cuidado com os personagens secundários (cada um ali, do Eli vivido por Alan Cumming à Kalinda de Archie Panjabi, parece capaz de protagonizar sua própria série) e com o elenco convidado (Nathan Lane, Jeffrey Tambor, Maura Tierney, Stockard Channing).
Um ano atrás dos episódios exibidos nos EUA, fãs no Brasil serão recompensados nesta semana, após uma temporada meio trôpega, pelo retorno de Louis Canning, o advogado sem caráter interpretado por Michael J. Fox, em um bem-vindo papel de vilão.
O outro, mais importante, é a introspecção e as nuances que Margulies deu à sua Alicia Florrick, que permite enxergar a personagem de tantas maneiras quanto é possível ver a série.
Ela é corruptível, é verdade, mas não há uma derrocada moral óbvia como houve no Walter White de "Breaking Bad" ou no Jack Bauer de "24 Horas". E é a heroína, inequivocamente, não só para amarrar a "história do dia" como é praxe nas séries de advogados e policiais.
Provavelmente o maior mérito de "The Good Wife" é se manter atual sem tentar reinventar a roda, absorver maneirismos nem querer copiar a receita das séries que bombam na TV paga adoçando-as para a TV aberta, como tem sido feito exaustivamente. Se há uma fórmula que pode envelhecer bem, é esta.
Luciana Coelho é editora-adjunta de Mercado. Pelo jornal, já foi correspondente em Nova York, Genebra, Boston e Washington, além de editora-adjunta de Mundo.
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