domingo, 27 de outubro de 2013

Leia "É Merlot Uísquecer", história erótica inédita da escritora Juliana Frank

folha de são paulo

Leia "É Merlot Uísquecer", história erótica inédita da escritora Juliana Frank


 
JULIANA FRANK
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A vida não começa agora.
Nem aqui.
Eu deveria estender a mãozinha e te pedir um beijinho. Mas esqueci o meu nome. Eu, a ninfomaníaca, morrerei feliz sem nenhuma cicatriz.
Abro as pernas e agora sim!
Gostam de chamar meu literobocetismo de força da sobrenatureza. Mas na rua, as pessoas xingam. Mudo de cara e fico muda. Só a boceta fala: sem dono, sem eira, sem norte nem oeste. É só foda, olha ela: só foda. Uma rameira!
Muda da linha.
Leia em legítima defesa. É como se escreve. E atentai bem, alma perdida, aos meus olhos azuis de ninfomaníaca.
Vem, seu maxo, dorme comigo no meu mundo. Já aviso: vou fazer você mudar de cor. Abaixo a calcinha e escondo o coração. Dá um gole nesse uísque. Esquece os clássicos, eles não
tinham a quem copiar. Esquece a classe: só me lê. Enfia o dedo dentro da minha boceta e dobra o dedo pra ver se alcança o ponto G.
Só me lê.
De repente, me dou conta de que mudou o cenário aqui. Ele enfiou o dedo tão bem que estou na abóbada celeste. Pude notar um anjinho ao fundo, tocando um instrumento de madeira em cima de uma nuvem cor de céu.
Deos estava ali, ajoelhado no milho e chupando a minha xana já. Agora sou eu que ajoelho diante dele em ação de graças. É fácil matar Deos. Só chupar na hora certa, que nem Lo-li-ta chupava quebra queixo, que nem um gato se lambe ao contrário. Deus ficou cego diante dos meus olhos azuis de gude-grude. Deus enfia sem piedade. Goza logo, goza fora.
Dou um grunhido celestial bem alto:
- Deos, você é a grande boceta!
Ele responde que a boceta sou eu. Você vai questionar?
Entra em susto-dilúvio, depois de lamber tudo. Boceta suja, deliciosa e melada de uísque sem vergonha.
Ah, nada como trepar com Deos de manhã. Dá uma leve sensação de conforto, que ninguém é de ferro.
No começo não era nada.
Nada ainda nada.
Você taí?
Só vou contar depois. Vira agora, vira a página dois.
Deixei um recado preso na geladeira de Deos: "Jamais sejamos soporíferos na chupada".
Se Deos me pagasse por essa foda, eu agradeceria de joelhos. Ajoelhada bonitinha no genuflexório. Cantaria uma canção pífia de piaf misturando tudo com um poema de auden ou de alguém.
- Thanx, God, gozei.
Pronto, já posso ir embora rindo.
Daí, eu indo, Deos gritou:
- Aí, vagabunda, quero saber: tem vaga na tua bunda?
Rebolei essa frase:
- Só pra mágoas mais profundas.
Daí, ele estalou os dedos e mandou:
- Mete fora toda a metáfora que te devora.
Respondi, lânguida de pica:
- É o mundo de Sofria.
Ele respirou fundo e me corrigiu, que injusto:
- Não. É o mundo da filosofria.
Deos me mandou comer uma maçã.
- Não como, o melhor sexo foi feito de barriga vazia. - É a filosofria de bueiro que sempre me vem na hora errada.
Olha que sacana: ele me comeu de novo e me jogou no abismo. Dancei na beira, movendo minha barriga como se tivesse um imenso tsunami dentro dela. Porque, Deos, veja, ele não sabe dançar, como mentiu o filósofo. Ah, Neruda também mentiu. Agonizados. Galera conta historinha em salinha de estar.
Deos saiu cambaleando. Perdeu de mim. Fugi pela janela, já tenho experiência. Tomei a metade de um lexotantan e pensei: "detesto competição porque eu sempre ganho."
Será que a vida começa agora?
Amor de deus não vale nada. Rima pobre. É romance de calçada.
Deos me disse, depois de gozar a quarta que eu não sei de nada.
- Me2mutch, Deos, mas imagino tudo.
Ele ainda tentou rasgar meu vestido, mandei:
- E aí, Deos, Fausto ou Claustro?
- Tanto faz, você nunca leu.
Me enganei. Agora tô falando com o Diabo a quatro. Minha posição favorita.
Mete, filho. As coisas tem nome, sabe? Aquilo é um uísque. Aquilo é uma flor esturricada. Isso é um cinzeiro transbordante. Isto é um chinelo carcomido. E você, Diabo gostoso, você é um filho da puta.
- Isso, pseudemônio da encruzilhada, me dá a leve chupada matinal de Deos. Não sou eros, nem de ethos.
- É de Pathos.
Ó...só patada do diabo. Mas decidi ficar. Ah, não quero ir pra casa agora.
- Diabo, vem cá, você me acha louca?
- Como qualquer uma, Dora. Você só não sabe segurar.
- Meu nome não é Dora, hoje.
- Já mudou?
- Ontem era Arsíone...
- Tá. E amanhã?
- Sei lá.
Voltemos.
- Qual o seu nome?
- Dora.
- Mas era hoje, laúanda.
Tanto faz o meu nome. Meteu forte, o capeta. Mas não vou contar essa história. O mundo jamais entenderia. Ele me mandou narrar pros outros. Sair por aí na noite bebendo e contando. Mas não falo do falo. Essa trepada não merece existir nem na literatura. Já pensou publicar uma mentira?
Ele se defende:
- Você não saberia escrever o que acabamos de meter.
- Isso, Diabo, isso é o que nós vamos ver.
Combate. Doido contra doida. É um jogo de carta. Passo. Pago. A banca leva tudo.
Depois de violar todos meus os lacres, o Diabo desenhou o mapa mundi nas minhas pernas. Estou perdida. Se um dia me pagasse por este sexo. Se mandasse um cheque. Se o cheque chegasse... Nossa, seria o primeiro cheque com fundo. Vou até o fundo do mundo e ele que gire mais uma vez. Compraria livro, brinco, taxi, pau, punheta, boceta, avião, pó, rato, pinhão, helicóptero. E um coração depreda pomes sem destino. A Besta vendou meus olhos, passou gelo no meu peito e acendeu um laiser na minha barriga. Eu até mordi o dedinho. Ele me paga! Nem que seja na próxima encarnação. A gente fecha essa conta. Vai ser rápido. Eu sempre gozei rápido. É só esfregar o clitóris com movimentos circulares. Ficar fazendo movimentos circulares ad eternum. Gozar é morrer, eu ouço dizer. Quem vai perguntar?
Pensei que com Deos me comportei mais mal que a santa-da-vila-da-vida-dos-pés-descalços. Porra, se o Deabo conhecesse essa santa, orgiástica que é... Ela também adoraria: além do clichê, o Diabo dá câimbras, olheiras, cansaços, insônias, loucuras. Será que a beócia goza rápido? Seria bom para uma santa mudar rápido de encarnação. Ia se Doraliciar. Ah, também passei perfume de mulher em Deos. Tomara que dure a dureza. Ganhei uma kriptonita cheia de raios coloridos, pra eu morder, ele disse que é pra quando eu sentir saudades.
Bom dia, Diabo, fica aí quebrado. Vou embora rindo. Mas desejo bom trabalho.
Combate fácil.
E agora, quem vem?
Com humano eu já fodi e não tem graça, nem raça, nem porra que os valha.
- Vai aprender a escrever - gritou o Diabo.
Coloquei a calcinha rasgada. Mal consegui responder. Ele me deu um soluço permanente.
Ah, boa notícia. Agora já sou Doralice. No chão, sem tapete nem quinhão. Bêbada, como o diabo gosta. E nua, como quis nosso Deosão. Ai, foda de adão com erva daninha dá nó. Enquanto Deos, o Deabo e as más línguas falam de mim, as boas lambem meu corpo. Quem será? Tem outro homem aqui já tentando alcançar o meu clitóris?
Ei, parece que minha calcinha está levitando de novo.
- Seres supremos, me deixem aqui com um maxo, por-fa-por favor, sem burkini voador. Sente minha catiça de bode. Comigo ninguém fode.
Ouvi uma voz de humano. Ele mandou:
- Você perdeu o humor em 1997 e continua fazendo piadas.
Desgraçado. Tinha de humilhar.
Se Vírgilio visse esse maxo aí, me mandaria parar. Ainda não sei com qual círculo ele tem compromisso. Deve ser escritor, está mesmo sempre pensando em outras coisas. Pensando na próxima, na próxima página.
Abro as pernas para ele mais que você abre a janela de manhã, pernas escancaradas mais que o mar vermelho abriu.
E não começa agora.
Nem aqui.
A vida começa agora
Aqui.

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