GUILHERME GENESTRETI
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
No rol de artistas já exibidos pelo museu Walker Art Center estão Andy Warhol (1928-1987), Mark Rothko (1903-1970) e Jasper Johns. Agora, há uma gata brava, um felino existencialista e outro louco por um aspirador de pó.
Esse centro de arte contemporânea na cidade de Minneapolis (EUA) é sede do Internet Cat Video Festival.
O evento anual reúne até 10 mil pessoas para assistir a uma sequência de 75 minutos de vídeos de gatos da web: há de flagrantes engraçados a produções requintadas, com diálogos e paródias de filmes.
Gene Pittman/Divulgação | ||
Estádio em Minneapolis cerca de 10 mil pessoas reunidas no último Cat Video Festival, evento criado por museu de arte |
Mas vídeo de gato é arte?
"Se expomos o que é relevante à cultura popular contemporânea, por que ignorar esses vídeos?", diz o curador da mostra, Scott Stulen, 38.
"Há uma tendência em se buscar uma 'internet real' e o festival cumpre a função: reúne pessoas para compartilhar experiências que antes tinham sozinhas. O fator artístico está na plataforma criada para a experiência social compartilhada, que une o mundo da arte à cultura popular."
PERFORMANCE
Com uma equipe de dez pessoas, Stulen faz a curadoria dos vídeos e escolhe os 80 melhores. Na edição deste ano foram enviadas 10 mil "obras".
Para Bia Granja, criadora do youPIX, festival brasileiro de cultura digital, gato também pode ser arte. "O Andy Warhol fazia colagens. Por que não uma colagem de vídeos da internet?"
"A curadoria torna esses produtos uma performance artística", diz André Sturm, diretor do MIS (Museu da Imagem e do Som), que não gosta de gatos. "Tem exibição, plateia relevante e reação do público? Então é arte."
Ricardo Resende, diretor do Centro Cultural São Paulo, concorda. "A arte está na ação, e não no objeto."
Solange Farkas, fundadora do festival Sesc_Videobrasil, questiona: "Não dá para fingir que o universo virtual não existe, e ele muda de fato a forma de fruir arte, mas não acho que isso seja arte, a não ser que seja feito por artistas".
FÊMEA EMBURRADA
Visto mais de 13 milhões de vezes no YouTube desde setembro de 2012, o vídeo "The Original Grumpy Cat" (a gata rabugenta original) ganhou o "gatinho de ouro" no festival por votos do público.
A fêmea emburrada estava no evento, acompanhada de seus humanos, ao lado de outras celebridades: Lil Bub, que virou documentário (leia abaixo), e Pudge, o gato bicolor.
Gatos como esses são a ponta de uma indústria que movimenta anúncios, merchandising e agentes especializados: a Grumpy Cat, por exemplo, tem o mesmo empresário que o Keyboard Cat, o bicho que toca teclado em um vídeo visto 33 milhões de vezes.
No Brasil, o atual sucesso é o site "Cansei de Ser Gato", que em quatro meses ganhou 128 mil fãs no Facebook. Diariamente, as criadoras do projeto fotografam o gato Chico com uma fantasia diferente.
As donas de Chico, Stefany Guimarães, 24, e Amanda Nori, 25, largaram o emprego na publicidade para tocar o site.
Por que gatos são tão populares? "É o jeito blasé e caricato", diz Stefany. Para Stulen, é porque eles não querem ser filmados, o "que torna tudo mais engraçado."
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CELEBRIDADES DE QUATRO PATAS
Quem são os gatos mais famosos da internet e os destaques do Internet Cat Video Festival
Quem são os gatos mais famosos da internet e os destaques do Internet Cat Video Festival
'Grumpy Cat' Vencedor da última edição do evento, o vídeo da gata que faz cara de mal-humorada enquanto é acariciada foi visto 13 milhões de vezes
'The Two Talking Cats' Duas gatas ronronam uma para a outra por um minuto e se lambem em vídeo acessado 54 milhões de vezes
'Cat Licking Vacuum Cleaner' Em um dos destaques do festival, um bichano faz cara de muito sério enquanto lambe um aspirador
'Jedi Kittens' Nessa montagem com som e efeitos especiais, dois felinos travam um duelo de sabres de luz no estilo da saga "Star Wars"
'Nyan Cat' Três minutos de musiquinha repetitiva e visual de videogame antigo resumem o vídeo de gato mais assistido da web: 103 milhões de vezes
OPINIÃO
Vídeos são fofos e criativos, mas apelar aos bichos é rebaixar o nível
FABIO CYPRIANOCRÍTICO DA FOLHASão todos muito fofos, são todos uma graça, mas os clipes com os gatinhos exibidos no Internet Cat Video Festival --o nome até que é bom-- são mais um exemplo de eventos popularescos, que mais confundem a já confusa compreensão do que pode ser visto como arte contemporânea.Como estratégia para buscar novos públicos ao museu, o formato até poderia ser valido: retirar da internet conteúdo que chama a atenção, levando uma atividade que costuma ser individual a tornar-se um evento coletivo.
Os vídeos são criativos e engraçados, já alcançaram milhões de observadores, mas não estão nada longe de outro besteirol recente, a dancinha do "Harlem Shake".
E aí reside a questão essencial: será que é preciso rebaixar tanto o nível?
Há um desespero, comum a muitos museus em todo mundo, em alcançar maiores bilheterias, legitimando-se pela quantidade de visitantes e não pela qualidade do que é exposto. É nesse contexto que se pode olhar para eventos como o Internet Cat Video Festival.
Estratégias assim simplistas são pura jogada de marketing. Com tantas obras em vídeo polêmicas, divertidas e até sensacionalistas, que poderiam ajudar a atrair público, apelar para os gatinhos é uma opção fácil demais.
Documentário analisa fenômeno da gataria
ALINE PELLEGRINIDE SÃO PAULOO documentário "A Gatinha Lil Bub e Seus Amiguinhos", que passa hoje em São Paulo, dá aos gatos da web o status dos Beatles e analisa o fenômeno."Gatos são admirados porque servem de veículo para tudo, tanto como piada quanto como fonte de conforto", diz a documentarista americana Juliette Eisner, que dirige o longa com Andy Capper.
"Vídeos de gatos são considerados arte", diz Eisner, a artista. Seu filme é protagonizado por Lil Bub, gata famosa pela eterna aparência de filhote, decorrente de mutação genética.
Para Chris Swanson, distribuidor dos produtos de Bub e dono de gravadora, os vídeos são sucesso porque gatos "são mais acessíveis do que indie rock".
No filme, Ben Lashes, empresário da gata Grumpy, que também participa do elenco, se empolga ao descrever um passeio com ela em Nova York e o assédio de fãs: "É como se John Lennon tivesse voltado à vida".
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